Internacional

Debate sobre ambiente no Reino Unido: duas ausências geladas, a necessidade de se ter uma horta e isolamento térmico para todos

Dois círculos de gelo com o mapa mundi e o símbolo dos dois partidos ausentes por baixo: pareciam mesmo troféus mas foram pensados mais como uma "letra escarlate" para o Partido Conservador e para o Partido do Brexit. O canal de televisão britânico Channel 4 organizou um debate apenas sobre o ambiente e convidou todos os líderes partidários: Boris Johnson e Nigel Farage não compareceram. Durante uma hora ouviram-se praticamente só consensos: mais energias renováveis e um grande foco no isolamento térmico sem custos das casas com agregados familiares mais pobres

WPA Pool/Getty

Nunca antes no Reino Unido tinha havido um debate apenas sobre um tema, nem sequer sobre o Brexit. O Channel 4 quis reunir os principais líderes partidários britânicos à volta to tema do ambiente e quase todos lá estiveram: Boris Johnson, líder dos conservadores, e Nigel Farage, líder do Partido do Brexit, falharam a convocatória mas no seu lugar o Channel 4 colocou duas esculturas de gelo - dois globos terrestres com os símbolos dos respetivos partidos em falta esculpidos na base.

Os conservadores não gostaram nada da atitude e uma queixa já seguiu para o regulador da comunicação social, a Ofcom. Um porta-voz dos conservadores disse aos jornalistas que o partido estava “desiludido” com o canal pelo “conluio com Jeremy Corbyn”: “Estamos profundamente desapontados com o facto de o Channel 4 News ter conspirado com Jeremy Corbyn para impedir que os conservadores defendam as suas ideias para as alterações climáticas no debate desta noite. As emissoras televisivas têm responsabilidades importantes e devem esforçar-se para apresentar um debate equilibrado que represente todas as partes”. Isto porque um dos nomes mais pesados dos conservadores, Michael Gove, ministro das Finanças, dirigiu-se à sede do canal e pediu para ser incluído no debate, coisa que a produção negou por este ser um debate desenhado apenas para líderes.

Nas declarações iniciais a mais perspicaz foi Sian Berry, líder dos Verdes: brincou com a dimensão do próprio partido - mas não da sua causa. Pelo menos durante uma hora, disse, todos os líderes se iriam esforçar para se parecerem com ela, líder de um partido ambientalista. Jeremy Corbyn, líder trabalhista, disse que esta eleição “é a última oportunidade de enfrentar a crise climática”. Adam Price, dos nacionalistas do País de Gales do Plaid Cymru, tornou a questão mais pessoal dizendo que o recém-adquirido estatuto de pai “faz da crise climática uma questão mais próxima”. Já Nicola Sturgeon, dos nacionalistas escoceses do SNP, prometeu que a Escócia vai chegar às zero emissões de carbono antes do resto do Reino Unido. Já Jo Swinson, líder dos liberais-democratas, focou a sua mensagem no Brexit: “A crise climática é ainda mais importante que o Brexit mas o Brexit é um crime climático".

O primeiro ponto do debate foi o que fazer em relação aos transportes: os aviões são imensamente poluentes, tal como os carros e todos os veículos a motor de combustão. Jeremy Corbyn defendeu uma "alternativa sensata" ao avião e deu um exemplo de um voo que consultou recentemente na internet, Londres-Berlim, que numa companhia custava mais de 200 libras (€234) e noutra "cerca de 20" (€23,4). Jo Swinson reforçou o que já vem no manifesto: os ‘lib-dems’ querem taxar quem viaja frequentemente de avião e aliviar impostos a quem não o faz. A necessidade de melhorar as ligações com autocarros elétricos em todas as cidades britânicas foi também um ponto de discussão trazido à mesa por Corbyn: “Londres tem uma boa rede de autocarros mas outras cidades nem por isso”.

“Acho que temos de fazer todo o possível para alcançar uma meta de zero emissões líquidas para 2030 e fazemos isso investindo em empregos em energia verde, energia solar, eólica e de ondas, fazemos isso criando empregos e transformando o nosso consumo de energia, reforma de casas para torná-las ambientalmente sustentáveis.​"

A líder dos Verdes defendeu que a terra hoje utilizada para pasto de animais eventualmente teria de ser reconvertida mas Price, do Plaid Cymru, foi inteligente ao não ostracizar quem depende da agropecuária para viver: “Os agricultores são os guardiões do meio ambiente e têm de ser vistos como aliados e não como inimigos". E acrescentou que para reduzir a poluição dos transportes de mercadoria as pessoas têm de comprar mais produtos locais.

Um outro ponto que tem muita importância no Reino Unido é o isolamento térmico das casas. A habitação rural é antiga, às vezes de pedra, com brechas e muito frias. O aquecimento das casas é uma questão muito importante, custa bastante dinheiro por mês às famílias e prejudica o ambiente. Todos os partidos falam desta questão nos seus manifestos. Swinson prometeu que haverá dinheiro para isolar as casas das pessoas com mais dificuldades económicas e que “todas as novas casas construídas serão neutras em carbono”. Corbyn promete o mesmo: “As famílias com rendimentos baixos não enfrentarão qualquer custo, todas as outras terão acesso a empréstimos sem juros”. Sturgeon concorda que é preciso acelerar a passagem da produção de energia através de combustíveis fósseis para as renováveis mas chama a atenção para a produção de petróleo na Escócia, que não pode parar “de um dia para o outro” e que é preciso pensar “na justiça da transição” para que “não se cometam os mesmos erros que cometemos com a desindustrialização”.

No fim, coube aos vários líderes partilharem com o público que hábitos verdes mantinham no seu dia a dia. Nicola Sturgeon disse que a sua energia em casa vem de uma empresa que apenas vende energia recolhida por fontes renováveis, Corbyn disse que quase nunca liga o aquecimento (“sou muito miserável nisso”, disse) e que tem uma horta. Swinson disse que o seu autocarro de campanha é elétrico e que usa sempre a mesma caneca para encher com café nos locais onde toma o pequeno-almoço. Já Adam Price disse que vai usar “fraldas reutilizáveis” com o seu bebé e comprar uma carro elétrico no novo ano.