A juíza do tribunal de Birmingham que ditou as sentenças considerou-a “a maior, mais ambiciosa e prolífica” rede de escravatura moderna alguma vez desmantelada no Reino Unido e as práticas e os métodos a que recorreram durante anos não deixam dúvidas sobre a descrição.
O grupo de crime organizado, de que faziam parte pelo menos 18 polacos, recrutava outros polacos através da Internet — em muitos casos, antigos prisioneiros, sem-abrigo e pessoas com problemas de álcool — com promessas de trabalho irrecusáveis a olho nu, que, na prática, não correspondiam senão a trabalho servil em centros de reciclagem de lixo, quintas e fábricas de produção animal.
Os membros do grupo controlavam as contas bancárias das vítimas (foram identificadas 92, o mais novo com 17 anos e o mais velho, do sexo masculino, com 60, mas a polícia acredita que eram mais de 400, não tendo sido possível encontrá-las, ou porque deixaram entretanto o país ou porque estavam demasiado assustadas para prestar depoimento) e confiscavam-lhes quase todo o dinheiro, tendo os trabalhadores apenas direito a 20 libras (cerca de 22 euros) por semana.
Além disso, obrigavam-nos a viver em condições degradantes em casas abandonadas nas cidades de West Bromwich, Smethwick e Walsall: havia ratos por todo o lado, os quartos eram demasiado pequenos para acomodar tanta gente, os colchões, lençóis e mantas apresentavam marcas de sujidade (assim se vê nas fotografias divulgadas) e não havia uma única casa de banho, tendo muitas vezes os trabalhadores de tomar banho em canais. Quando uma das vítimas morreu, por razões ou desconhecidas ou por revelar, o grupo escondeu os seus pertences e os seus documentos de identificação para que a rede não fosse descoberta.
Rede foi denunciada por duas vítimas em 2015
Isso mesmo acabaria, no entanto, por acontecer em 2015, depois de dois dos trabalhadores terem fugido e denunciado a situação à organização Hope for Justice, que tem sede em Manchester e a missão de combater o tráfico humano e a escravidão moderna. As autoridades iniciaram uma investigação, que terminou esta semana, com a condenação de 18 membros do grupo por tráfico, conspiração e lavagem de dinheiro, a penas que vão dos três aos 11 anos de prisão.
Além de recrutar polacos em situação descrita como “vulnerável”, o grupo de crime organizado chegou a contar com a colaboração de um funcionário de um dos centros de emprego de Worcester, que criaria falsas ofertas de emprego para candidatos que acabavam enleados na rede de escravatura. Citado pela BBC, o líder da investigação policial considerou os atos dos membros do grupo “repugnantes” e sublinhou a “pobreza e miséria” a que as vítimas foram submetidas ao longo de vários anos.
Também revelou que muitas delas, quando se recusavam a trabalhar, “eram violentadas ou ameaçadas de violência”, sendo-lhes dito que, se não colaborassem, as suas famílias na Polónia seriam atacadas. A alguns foi dito, aliás, que seriam levados para “a floresta” para cavar as suas próprias sepulturas. Nick Dale, que conduziu a investigação, disse ainda que o grupo negou a ida ao hospital a um trabalhador que teve um acidente, tendo o seu braço ficado com lesões permanentes.