Internacional

“A matemática que se dá na escola não tem grande significado”

Foi a vencedora europeia do For Women in Science, prémio atribuído pela UNESCO a cinco cientistas de cinco regiões do globo, para suprir a ausência de mulheres nos principais galardões científicos. Esta francesa é uma das grandes matemáticas do nosso tempo

Está familiarizada com o facto de ser difícil entender o seu trabalho. Todos identificamos formas geométricas nesta garrafa de água. O que lhe interessa nelas?

Não tenho muito a dizer do ponto de vista da geometria algébrica porque não é interessante estudar superfícies como esta, mas posso falar sobre topologia. Olhando para esta forma, direi que ela é como uma esfera. Você vê algo muito diferente de uma esfera, mas topologicamente é igual, porque se a expandir de forma a torná-la redonda, no fim, o que obtém é uma esfera. Ao tirar a tampa, eu separo o objeto em dois, sendo cada um, topologicamente, um disco. Os topologistas diriam que é possível cortar e colar (chamam-lhe “cirurgia”) se quisermos construir uma nova forma. Pode usar uma tesoura, cortar e colar algo nas extremidades [Voisin vai virando a garrafa]. Por exemplo, se a garrafa tivesse duas tampas e desaparafusássemos ambas, obteríamos algo próximo de um cilindro. Se depois colássemos as extremidades, obteríamos algo muito diferente, já não uma esfera, topologicamente, mas o que chamamos torus. Algo como um pneu de uma bicicleta. Com este método simples de cortar e colar, eu sou capaz de criar uma forma diferente.

Como explicaria a importância disso?

Importante para quê? Devo dizer que não me interessa muito a aplicabilidade da matemática. A matemática é, antes de tudo, interessante e importante para nós mesmos. Depois espalha-se progressivamente até ser aplicável. A matemática mais abstrata é aplicada através de uma longa cadeia de interações. O ponto-chave é que a abstração está relacionada com a teoria e a teoria é uma maneira de evitar cálculos ad hoc e geralmente obscuros.

Tendemos a ver a matemática de forma rígida e sem espaço para essa criatividade?

Para mim, é muito claro que a criatividade é o ingrediente mais importante da matemática. Essa criatividade tem de ser acompanhada pelo rigor. É como para um acrobata: a performance tem de ser perfeita. Na matemática queremos fazer coisas interessantes, chegar a novas ideias e ao desafio de produzir asserções completamente novas. Todos os passos do nosso trabalho têm de ser provados, mas precisamos de imaginação e criatividade. As pessoas acreditam que a matemática pode ser feita por um computador. Haverá possivelmente verificação de provas por computadores, mas eles ainda não estão preparados, e não sei se algum dia estarão, porque isso supõe fazer matemática de forma diferente da que fazemos. Nós podemos ter novas ideias, introduzir novos conceitos, mas se houver um pequeníssimo erro nalgum lado, a teoria pode cair toda.

É por essa atenção ao pormenor que lhe chamam “artista da matemática”?

É talvez por ser bastante sensível à conexão entre a matemática e a poesia. Gosto de fazer conexões entre a matemática e a arte. Mas não estou a dizer que me inspiro na arte para fazer matemática.

Sempre gostou de pintar.

Sim, eu pintava. Mas quanto mais faço matemática, menos pinto. E vice-versa [risos].

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