“De todas as formas tétricas e obscuras que pode adotar um assassinato, matar um filho é um dos mais trágicos e menos compreensíveis.” A frase pode ler-se num estudo realizado no Reino Unido entre 1980 e 2012 e publicado no “Howard Journal of Criminal Justice” em 2013, citado pelo “El Mundo”. Hoje, dois dias depois ter sido conhecido o veredicto do caso Asunta, ganha de novo relevância.
Depois de um mês de declarações de investigadores, especialistas e pessoas próximas da família, o júri popular encarregado de avaliar o caso foi unânime: os pais adotivos de Asunta, Rosario Porto e Alfonso Basterra, embora divorciados, são coautores - e por isso culpados - da sua morte.
Segundo a apreciação do júri composto por nove elementos, a 21 de setembro de 2013 Asunta Basterra foi assassinada pelos seus pais (embora os dois se tenham declarado inocentes em tribunal). Educada de forma rigorosa - com dias seguidos dedicados ao estudo, à aprendizagem das línguas e à música -, a rapariga de 12 anos começaria a dar sinais de que alguma coisa não estaria bem na sua vida. Professores da escola onde andava contam que no mês anterior à sua morte a rapariga parecia uma “sonâmbula” e, inclusive, chegou a contar a uma professora que os pais a enganavam e a punham a dormir durante dias - segundo o veredito, chegaram a administrar-lhe, pelo menos nos últimos três meses de vida, um medicamento que continha Lorazepam.
No final desse verão chegaria o último dia de Asunta. Rosario, advogada, e Alfonso, jornalista, são acusados de terem misturado Orfidal na comida da filha de modo a deixá-la inconsciente e asfixiá-la sem que oferecesse resistência - levando posteriormente o corpo para um caminho florestal no município de Teo, na Galiza. A proximidade do local com uma casa que era propriedade da mãe colocaria os pais na mira das autoridades.
Algumas questões e várias pontas soltas
Para justificar o veredito da culpabilidade de Rosario e Alfonso, o júri popular teve que responder a 21 perguntas. Mas ficaram ainda algumas pontas soltas por desvendar, como evidencia o jornal espanhol “ABC”:
1. A viagem de Alfonso a Teo
Na descrição que faz dos acontecimentos, o tribunal considera que Asunta e os pais se deslocaram de carro a Teo, depois de terem jantado os três em casa do jornalista - onde Asunta foi drogada de forma a perder a consciência. Mas não foi fácil colocar o pai de Asunta em Teo no dia do seu assassinato. Não foi possível encontrar provas que colocassem Alfonso em Teo à hora do crime, nem através de câmaras de vigilância durante o caminho, nem sequer através do seu telemóvel. Assim, os jurados basearam-se no testemunho de um amiga de Asunta que afirmou ter visto o pai de Asunta numa rua de Teo.
2. A morte por asfixia
Ainda que todos os nove jurados tenham respondido afirmativamente à possibilidade de Rosario e Alfonso terem asfixiado a filha, o veredito nada diz em relação a quem terá executado a operação. Sabe-se as horas (entre as 18h30 e 20h), o local (casa de Montouto) e o método (asfixia por compressão sobre a boca e nariz), mas nada se diz sobre quem terá executado o crime, na prática. Mas na máscara e panos usados para asfixiar Asunta foram encontrados restos do ADN da mãe.
3. O transporte do corpo
Um dos advogados de defesa de Rosario insistiu na ideia de que, fisicamente, a mãe não conseguiria transportar um corpo escadas abaixo, introduzi-lo no carro e depois numa vala sem deixar rasto. Tudo justificado pela estrutura e peso da mãe da rapariga. Este facto, contudo, não foi abordado no veredito final.
4. O móbil do crime
Os motivos que levaram os pais de Asunta a assassinar a filha não foram desvendados - mas, segundo a lei espanhola, para acusar ou inocentar alguém não é obrigatório desvendar o motivo. Houve tentativas de apresentar motivos (a ideia de que a filha era um estorvo para os pais e que a sua morte poderia beneficiar o pai, que estaria numa situação económica difícil depois do divórcio), mas nenhuma foi apresentada como sendo suficientemente forte para se afirmar. Neste contexto, levantou-se ainda o véu sobre a fragilidade emocional de Rosario, com um longo historial de recurso a medicação e vários episódios depressivos, bem como sobre episódios de violência durante a relação conjugal.