Criado em 2017, o imposto sobre as bebidas com açúcar visava, acima de tudo, dissuadir o consumo excessivo deste ingrediente. Seis anos volvidos, a medida teve efeitos concretos: a maioria das marcas reformulou os seus produtos, reduzindo a quantidade de açúcar ou oferecendo alternativas com adoçantes naturais. A indústria adaptou-se, diversificou a oferta e investiu na rotulagem clara, como o sistema Nutri-Score, facilitando decisões mais conscientes por parte dos consumidores.
Mas a aplicação deste imposto continua a levantar questões, sobretudo quando o critério de taxação distingue entre açúcar adicionado e naturalmente presente (como no caso dos sumos 100% fruta, que ficam isentos). É aqui que muitos veem incoerências, pedindo que o debate se centre menos no ingrediente isolado e mais no padrão alimentar como um todo.
Este foi um dos pontos que alimentou a discussão de hoje, numa época em que os hábitos alimentares da população portuguesa continuam a ser motivo de preocupação, sobretudo pelo elevado consumo de açúcar. É preciso conseguir encontrar o equilíbrio que garanta a saúde pública, a liberdade de escolha e que responda aos desafios da indústria.
O encontro decorreu no auditório do Edifício Impresa e contou com a moderação de Rodrigo Pratas, jornalista da SIC, juntando vozes de diferentes áreas: Diogo Gonçalves, fundador da Nudge Portugal, Alexandra Bento, nutricionista e coordenadora do Departamento de Alimentação e Nutrição do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, Emanuel Silva, medalhado olímpico e presidente da Comissão de Atletas Olímpicos e Márcio Cruz, presidente da PROBEB.
Para Alexandra Bento, nutricionista e antiga bastonária da Ordem dos Nutricionistas, o imposto teve um papel educativo. “Criou-se uma narrativa em torno da saúde, e isso ajudou as marcas a reformularem os seus produtos”, destacou. Mas avisou: é preciso fazer mais. Portugal continua a consumir muito açúcar, e uma alimentação desequilibrada tem consequências sérias: 60% da população com excesso de peso, 50% a consumir mais sal do que o recomendado, e apenas 15% a ingerir a quantidade ideal de hortofrutícolas.
Também Diogo Gonçalves, da Nudge Portugal, reconhece o valor pedagógico da medida, mas critica a sua rigidez. “O imposto penaliza o açúcar adicionado, mas não o naturalmente presente. Um néctar com açúcar da fruta paga imposto, uma bebida gaseificada com adoçante artificial não paga nada”, apontou. A Nudge, que aposta em bebidas de chá fermentado com baixo teor de açúcar e apelo funcional, defende um modelo mais inclusivo, que valorize a inovação e a reformulação de produtos. “Se queremos premiar comportamentos saudáveis, temos de incluir todas as alternativas que contribuem para isso".
Do lado do desporto, Emanuel Silva trouxe a perspectiva do quotidiano de um atleta. “A saúde é a base da nossa performance”, disse, acrescentando que a educação alimentar começa em casa, mas também deve estar presente nas escolas, nas comunidades e nos clubes. “A rotulagem, os impostos, tudo isso são ferramentas, mas o mais importante é dar o exemplo e criar uma cultura onde o corpo e a mente estejam alinhados com o que comemos.”
Márcio Cruz, presidente da PROBEB, sublinhou os esforços da indústria na redução de açúcar - mais de 20%, nos últimos anos - e questionou a eficácia do imposto em vigor. “Reformulámos produtos, reduzimos calorias, investimos em inovação, mas o imposto continua a penalizar os produtos, mesmo os que já se ajustaram”. Apelou a uma reavaliação da medida: “Estamos disponíveis para contribuir para a saúde pública, mas é necessário um modelo mais justo e baseado em evidência”.
Conheça, abaixo, o resumo das conclusões deixadas pelos intervenientes:
- Alexandra Bento (Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge) reconhece que “o imposto teve impacto positivo, sobretudo na reformulação dos produtos”, mas alerta que é “urgente promover hábitos alimentares equilibrados” e reforçar a literacia alimentar para escolhas mais conscientes;
- Diogo Gonçalves (Nudge Portugal) defende que o atual modelo “penaliza inovação e produtos com benefícios nutricionais” e defende a revisão dos critérios do imposto, incluindo uma distinção clara entre açúcar adicionado e naturalmente presente, apelando a que “a indústria seja parte da solução, não adversária”;
- Emanuel Silva (Comissão de Atletas Olímpicos) sublinha que “a alimentação saudável é fundamental para a saúde e sucesso desportivo” e que “a educação e o exemplo são essenciais para mudar hábitos”, destacando a importância de integrar políticas públicas com programas escolares e comunitários;
- Márcio Cruz (PROBEB) afirma que a indústria “tem feito o seu caminho, com menos açúcar e mais alternativas”, mas considera que “o imposto deve ser revisto para reconhecer estes avanços”, sublinhando o compromisso de “fazer parte da solução para um Portugal mais saudável e informado”.
A sessão completa pode ser vista no vídeo abaixo.
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