Mais de dois mil quilómetros separam Bruxelas de Portugal, uma distância que, frequentemente, não é apenas física. Os dados do último Eurobarómetro revelam o carinho português pela Europa, com quase 80% dos portugueses a considerar positivo que o país integre a União Europeia e a confiar mais no Parlamento Europeu (64%) do que no Parlamento nacional (42%). Contudo, quase metade dos cidadãos nacionais admite não ter qualquer interesse nas eleições europeias. Para aproximar o centro político europeu do nacional e vice-versa, o projeto de cidadania ‘Os 230’ criou um núcleo na capital belga.
“É um desafio muito maior”, confessa Francisco Cordeiro de Araújo, sobre a criação da nova ramificação do projeto. A ideia de ‘Os 230’ materializou-se em 2020, por isso, este ano é a primeira vez que vão experienciar o ato eleitoral europeu. “Nas últimas eleições, os números chegaram quase aos 70% da abstenção, por isso, é um desafio maior combater essa abstenção. Mas também há um desafio muito maior de promover o voto informado, porque envolve aspetos com os quais as pessoas não estão tão familiarizadas, seja o funcionamento das instituições ou aquilo que são as famílias políticas europeias”, explica o fundador do projeto.
O objetivo em Bruxelas parte de um pressuposto igual ao trabalho desenvolvido nacionalmente: aumentar a qualidade da participação. “Vamos aproveitar que temos pessoas que trabalham nas instituições europeias, que vivem em Bruxelas e que estão mais próximas deste centro de decisão para também promover o que é a política europeia por todos os portugueses”, diz Francisco Araújo. Um dos exemplos desta situação é Juliana de Sá, coordenadora do núcleo, que embora seguisse ‘Os 230’ há muito tempo, só se juntou ao projeto em janeiro de 2024, quando o ambiente político de Bruxelas a motivou a tomar o passo.
Os dois pilares deste núcleo são, por um lado, “aproximar a diáspora da política nacional", porque acreditam que “é muito fácil, quando estamos envolvidos aqui na famosa bolha europeia, ficarmos um bocadinho alheados daquilo que é a realidade nacional” e, por outro, “transmitir informação sobre política europeia àqueles que continuam em Portugal continental e ilhas".
O lançamento oficial desta iniciativa foi em Bruxelas, no Dia do Trabalhador, com um evento que “superou as expectativas em termos de adesão” e que já motivou 40 adesões ao núcleo. O grupo juntou-se num café tipicamente português, onde discutiram várias ideias e os desafios que enfrentam em Bruxelas. “Foi muito giro perceber que há interesse em fazer parte deste género de iniciativas, quer de pessoas que já estão aqui há muito tempo e que nunca se envolveram ativamente na comunidade portuguesa e também de pessoas que acabaram de chegar e querem beber um bocadinho da experiência daqueles que já cá estão há mais tempo”, diz Juliana de Sá.
Também Francisco Cordeiro de Araújo destaca a união sentida e a vontade em envolver mais gerações no projeto, uma vez que aqueles que se reuniram no café eram, maioritariamente, jovens. “Temos essa necessidade de chegar a outras gerações, pessoas que já vivem há dezenas de anos em Bruxelas e que já tiveram filhos em Bruxelas e às vezes netos, e ligá-las, ou seja, termos aqui uma sinergia intergeracional”, explica.
“Nós acabamos por chegar às pessoas mais qualificadas, ou seja, pessoas que foram para o ensino superior e que vieram para Bruxelas exercer trabalhos que requerem ensino superior, mas acho que falta chegar à fatia daqueles que estão cá e que também precisam de estar envolvidos e que também querem estar envolvidos”, acrescenta Juliana de Sá.
Para combater o desconhecimento da política e instituições europeias, um problema comum apontado por aqueles que participaram no lançamento do núcleo em Bruxelas, o grupo quer criar “uma espécie de speed dating, em que trazemos os vários eurodeputados para se darem a conhecer e todos os participantes teriam a oportunidade de falar com todos em pequenas conversas”, explica o fundador de ‘Os 230’. Também foram debatidas outras ideias como ir até às escolas com lusodescendentes e aproximá-los da política nacional, à semelhança do projeto “Democracia nas Escolas”, que já promovem a nível nacional, bem como organizar um evento para discutir os problemas da comunidade portuguesa nos atos eleitorais e encontrar soluções.
“Já existem algumas iniciativas pontuais de portugueses aqui em Bruxelas e acho que podemos ter aqui um papel importante de agregação”, diz a coordenadora do núcleo na Bélgica, que adianta que “o objetivo é que dure muitos anos”.