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Rui Tavares: "A questão é saber se Pedro Nuno Santos, Mariana Mortágua e todos os outros estão disponíveis para servir o país"

Em entrevista ao Expresso, Rui Tavares, fundador do Livre e cabeça de lista do partido por Lisboa, olha para as próximas eleições como uma oportunidade para o PS, o PCP e o Bloco voltarem a entender-se para constituírem uma maioria de esquerda no Parlamento. Desta vez com mais garantias de estabilidade, através de um acordo escrito e multilateral que inclua também o PAN e o Livre, que tem o seu congresso este fim-de-semana

O Livre comemorou 10 anos no final do ano. Que balanço faz desta década - o partido cumpriu os seus principais objetivos?

O balanço que faço é que é muito bom que exista o Livre. Faz falta à politica portuguesa, não havia até agora nenhuma opção de um partido da esquerda verde europeia, que é membro de pleno direito do Partido Verde Europeu e que se apresenta autonomamente no boletim de voto. Estas condições em simultâneo só o Livre é que preenche. E quando vemos que muitos dos riscos para a nossa democracia - já falávamos há 10 anos - infelizmente só têm vindo a aumentar, percebemos que o que nos levou a fundar o partido, defender um Estado social mais inovador, que ao contrato democrático fundador do nosso regime e ao contrato social que nós como comunidade dependemos acrescenta um contrato ambiental.

Quais são as linhas gerais do programa eleitoral que será fechado no congresso do partido, este fim de semana no Porto?

Queremos que Portugal seja uma economia de alto valor acrescentado, do conhecimento e da descarbonização, que tenha como objetivo erradicar a pobreza estrutural no nosso país. Ou seja, conseguir desde logo erradicar a pobreza infantil e combater a pobreza como fenómeno estrutural que historicamente sempre existiu no nosso país. Mas hoje, Portugal faz parte da OCDE, é uma economia avançada para todos os efeitos, tem que não deixar para trás o objetivo de dar dignidade a toda a gente. Como é que isto se faz? Isso faz-se com instrumentos que correspondam a fases diferentes da vida: reforçando o abono de família e o Complemento Solidário para Idosos. Mas também no momento da entrada na vida ativa, com o desencadear de um mecanismo que propomos, a que chamamos de herança social.

A ministra espanhola do Trabalho defendeu uma herança universal para jovens de 18 anos...

É um debate que é importante que se faça. Queremos que durante esta legislatura se realize um estudo, com a participação da Segurança Social, que avalie várias modalidades deste mecanismo. Pode constituir-se, por exemplo, através da abertura de uma conta com Certificados de Aforro para todos os cidadãos que nascem em Portugal, conta essa que, entre os 18 e os 35 anos, possa ser movimentada. Isso pode servir para fazer um mestrado ou um doutoramento, ter dinheiro para a entrada de uma casa, montar um pequeno negócio ou investir num projeto com outros jovens nas mesmas condições. Para que ninguém seja tão pequeno que não possa sonhar em grande.

O Livre fixa algum valor para esta herança social?

Tal como fizemos na proposta da semana de quatro dias, queremos abrir o debate e queremos que se estudem modelos de concessão da herança social, perceber se pode ser mais incondicional ou menos incondicional. Aqui podemos estudar várias modalidades, uma delas é que seja na razão inversa na categoria de rendimentos que nós conhecemos, de cada familiar à nascença, daquele novo cidadão ou cidadã. E que possa, tal como no abono de família, as categorias que têm menos rendimentos e são mais vulneráveis ter uma aberta uma conta de herança social maior ou menor. E podemos, através dos estudos que podemos encomendar, avaliar as vantagens e desvantagens de cada um dos modelos e perceber também qual é a fonte de financiamento para esta herança social. Deve ser feita apenas através de certificados de aforro, que no fundo são dívida pública? Ou deve ser uma parte do imposto sobre grandes heranças, que é uma forma de fazer redistribuição e de dar a toda a gente?

Pode ser como a vossa proposta do Rendimento Básico Incondicional (RBI)…

Sim, mas com o RBI mais do que estudar modelos, queremos fazer um projeto-piloto numa comunidade ou duas comunidades. O custo desses projetos-piloto no resto do mundo tem andado entre 20 e 30 milhões de euros, o que significa um custo no que diz respeito a este tipo de medidas sociais muito reduzido e permite-nos perceber certas coisas, que aliás já fizémos uso até durante esta legislatura. O PS e o Governo infelizmente recusaram sempre desenvolver esse projeto-piloto, mas depois quando tivémos o problema de como reagir perante a inflação adotaram medidas que eram medidas de RBI digamos ad-hoc, de um determinado momento, apenas com uma transferência e vira-se a braços com muitas dificuldades administrativas, porque nunca tinha sido feito. Houve gente que não recebeu o dinheiro, houve quem recebesse e não devia ter recebido, houve atrasos, porque nem toda a gente tem conta no banco, alguns deveriam ter recebido por vale postal e por aí a fora. Aquilo que eu disse ao ministro das Finanças, Fernando Medina, numa dessas ocasiões é que se tivesse sido aprovado o projeto piloto de RBI e se tivéssemos estado em Carrazeda de Ansiães, na ilha do Corvo ou em ambos os lugares, saberíamos que problemas são esses e como o Estado se deve preparar para lidar com eles.

Estas medidas como o RBI, por muito que às vezes no debate político quotidiano sejam criticadas toda a gente sabe que elas vão ter que ser discutidas numa fase em que a IA pode destruir muitos empregos, mas que também gera muita riqueza temos que encontrar uma forma de essa destruição de empregos e essa riqueza gerada não fiquem apena sconcentradas em algumas mãos que depois vão usar para efeitos também políticos e económicos, que muitas vezes são antissociais e antidemocráticos por natureza.