Economia

PT. De estratégica a vendável em dois meses

Acionistas da PT exigem que a Oi explique a brusca mudança de estratégia e ameaçam chumbar  a venda da PT Portugal se não souberem para onde vai o dinheiro.

José Caria

Anabela Campos, João Ramos e João Vieira Pereira

O futuro da PT Portugal, operador histórico e dono da rede de telecomunicações fixa do país, continua uma incógnita. E tem mudado muito desde que se tornou uma subsidiária da brasileira Oi, a 5 de maio - ora é uma empresa estratégica, ora uma empresa vendável. Há dois meses, a 8 de setembro, a Oi considerava a PT Portugal estratégica. Foi isso mesmo que ficou fixado no memorando de entendimento estratégico da fusão entre a PT e a Oi, confirmado na última assembleia geral da PT SGPS, em Lisboa. Fórum onde a união que daria origem ao grupo luso-brasileiro foi confirmada por quase 100% dos acionistas presentes.

A situação mudou num fósforo. A PT Portugal, onde está toda a atividade operacional da empresa portuguesa, passou a ser vendável. E com urgência. A Oi, pressionada por uma dívida superior a 46 mil milhões de reais (€15 mil milhões) e a precisar urgentemente de capital para avançar para a TIM Brasil, está ávida de dinheiro. Na semana passada, a imprensa brasileira dizia que a PT Portugal seria vendida esta semana. Não foi.

Agora, a PT SGPS - empresa liderada por Mello Franco e onde se sentam os principais acionistas, incluindo o Novo Banco, a Ongoing, a Visabeira e a Controlinveste - quer explicações sobre a alteração da orientação dos parceiros brasileiros. E assegura que não tomará qualquer decisão sobre a venda da PT Portugal enquanto não obtiver respostas da Oi, cuja voz de comando são as famílias Andrade Gutierrez e Jereissati.

"Enquanto a PT SGPS não tiver toda a informação por parte da Oi sobre porque é que se deve vender um ativo que em setembro era considerado estratégico (a PT Portugal), e o que se irá fazer com o produto da venda, não vai equacionar abrir qualquer processo de alienação". Foi esta a tomada de posição aprovada esta semana no conselho de administração da PT SGPS, empresa que hoje é apenas proprietária de 25,6% da Oi e da dívida de €897 milhões da Rioforte, segundo apurou o Expresso.

A PT SGPS tem direito de veto sobre as decisões estratégicas que forem tomadas pela Oi até a fusão estar concluída, como é o caso da venda da PT Portugal. Aliás, não foi ratificada a alienação da operadora portuguesa em conselho estratégico da Oi, onde a PT tem um dos seis votos existentes e poderá puxar do 'cartão vermelho'.

Todos falam com todos

Fundos, advogados, consultores e bancos de investimento internacionais andam numa grande azáfama para convencer empresários portugueses a juntarem-se para comprar a PT Portugal, a financiar projetos de capital de risco ou então apoiar propostas. É normal a agitação, está em causa uma das maiores empresas portuguesas, dona de relevantes infraestruturas. E um negócio de várias centenas de milhões de euros que dará certamente chorudas comissões a quem assessorar os vencedores.

A especulação é gigantesca. Para já, apenas a francesa Altice, proprietária da Cabovisão e da Oni, se chegou à frente com uma proposta concreta: €7,025 mil milhões. Os fundos Apax, CVC e Bain Capital, que a Bloomberg noticiou esta semana estarem a preparar uma proposta conjunta, ainda nada disseram oficialmente. Mas, sabe o Expresso, tem havido muitos contactos entre os vários potenciais interessados. Os referidos fundos de private equity já tentaram estabelecer pontes com empresários como Américo Amorim (Corticeira Amorim/Galp) e Pedro Queiroz Pereira (Semapa/Portucel) e empresas como os CTT. Contactaram inclusive antigos administradores da PT empenhados em encontrar uma solução que também tem simpatizantes entre os administradores da PT Portugal. Mas não há fumo branco.

Parceria luso-angolana-britânica-francesa?

A surpresa da semana veio do maior concorrente da PT, e trouxe à memória a oferta pública de aquisição (OPA) que a Sonae lançou sobre a Portugal Telecom em 2006 e os problemas de concorrência que se levantaram então e se levantam agora. A Sonae quis sinalizar a sua presença na corrida à PT Portugal - um velho sonho de Belmiro de Azevedo - e mostrar que o que está em causa é demasiado relevante para que o processo avance atabalhoadamente. E está a falar da rede de cobre e de segurança, dos cabos submarinos e entre outras coisas da televisão digital terrestre e da PT Inovação.

Desta vez  a Sonae não vem sozinha, traz consigo Isabel dos Santos, sua parceira na NOS. E não haverá uma OPA - a PT Portugal não é cotada -, nem ofertas globais em dinheiro. Acenam com uma "solução nacional" e, sabe o Expresso, admitem envolver na solução a britânica Vodafone e, até mesmo, a Altice. Se isso acontecesse implicaria uma divisão da PT Portugal pelos três. Não foi possível apurar se esta solução tem pernas para andar. A Vodafone tem optado pelo silêncio sobre uma eventual compra da PT Portugal, mas no mercado financeiro tem-se dito que é uma possibilidade tentadora para a Vodafone.

A Sonae não abre o jogo sobre o seu contra-ataque à PT, e o comunicado é lacónico. A ZOPT, empresa detida pela Sonaecom e Isabel dos Santos, "manifesta a sua disponibilidade para integrar uma solução que, em aberta colaboração com as partes envolvidas, assegure o necessário compromisso de interesses, promovendo a defesa do interesse nacional". E mais não dizem. Paulo Azevedo e a empresária angolana não terão ainda falado com a Vodafone e a Altice sobre a eventualidade de avançarem com uma solução tripartida para a PT Portugal. Mas estão disponíveis para dialogar.

A ousadia da Sonae foi criticada nos bastidores, afinal há o risco de se criar um duopólio. Os problemas de concorrência que se levantam são complexos, mas o cenário não é muito diferente do que era na altura da OPA. Ou seja, na prática estamos a falar das mesmas empresas: a PT, a Optimus e a Zon (ex-PT Multimédia). E a Autoridade da Concorrência já analisou em 2006/2007 a fusão entre a PT e a Sonaecom e, embora com os chamados remédios, não a chumbou. Permitiu inclusive que a TMN e a Optimus se juntassem. 

Dividir a PT por três - Sonae, Vodafone, Altice - não significa que um ficava com a área móvel, outro com o fixo e outro com a televisão paga. Seria algo a discutir com as autoridades. É uma forma de contornar os problemas de concorrência que uma eventual compra da PT pela NOS levantaria. E não seriam poucos. É que a PT (Meo) é o maior operador móvel (46,3%) e fixo (55,5%). Como se não bastasse, a NOS domina o segmento da televisão paga, com 45,3% do mercado. Seria uma união de grandes. Uma solução destas precisaria da luz verde do Governo, até porque implica concessões ao nível da concorrência. O primeiro-ministro e o ministro da Economia garantiram esta semana que não se envolveriam.

Os trabalhadores da PT estão a analisar o que representa o avanço da Sonae e de Isabel dos Santos, mas temem que esta solução leve a um corte elevado no número de trabalhadores. E ironizam: "Se Isabel dos Santos está preocupada com a economia portuguesa, porque é que não paga os €245 milhões que a Unitel deve em dividendos à PT?" Entretanto,  os trabalhadores e sindicatos vieram agora pedir a suspensão da fusão com a Oi e a recompra da PT Portugal.