"O ambiente político mudou mais nos últimos seis meses do que nos últimos 25 anos", diz Dan O´Brien, editor da revista britânica The Economist e da unidade de análise económica Economist Inteligence Unit (EIU). Em declarações ao Expresso, horas antes da quarta conferência anual da The Economist em Portugal, O´Brien explica que a crise financeira veio dar uma abertura aos Governos para actuarem de uma forma que, até então, seria impensável, em termos de política orçamental, concorrência ou ajudas a sectores e empresas.
E as medidas não se devem ficar por aqui porque "podemos esperar o inesperado". Ou seja, se a situação se agravar mais ainda - e o especialista britânico não afasta essa hipótese e avisa até para os riscos de uma deflação global - é possível que, quer os Governos, quer os bancos centrais sejam ainda mais agressivos nas suas medidas. O´Brien reconhece que "o Banco Central Europeu tem alguma relutância em chegar a taxas de juro de 0%", por ser mais cauteloso que a Reserva Federal, mas admite que "se a situação se agravar rapidamente, os 0% são possíveis".Apesar de já ser negra, a situação pode ainda agravar-se. Como alerta Dan O´Brien:"Isto não é uma tempestade como muitas pessoas falam, não é um fenómeno meteorológico mas geológico. A paisagem económica está a mudar e as movimentações tectónicas estão a ser maiores do que prevíamos." O economista não arrisca, no entanto, um valor na escala de Richter. Garante que a "recessão global pode ser mais profunda e longa do que antecipámos".
Para Portugal as previsões da EIU não são nada animadoras. Depois de, na sexta-feira, o Governo ter revisto as estimativas e colocado um cenário de recessão no Orçamento suplementar que apresentou, a EIU veio traçar uma imagem ainda mais negra: quebras de 2% no PIB em 2009 e 0,1% em 2010, agravamento do desemprego mais rápido que o esperado pelo Executivo, défice orçamental acima dos 4% durante pelo menos dois anos e uma inflação negativa de 0,3% este ano.Se os números de Teixeira dos Santos eram maus, estes são péssimos e saíram mais ou menos em linha com a revisão extraordinária das projecções da Comissão Europeia divulgadas hoje.
As razões para este cenário depressivo, explica Kevin Dunning, analista da EIU responsável por Portugal, são as ondas de choque que chegam do exterior: "Temos uma desaceleração sincronizada na Europa e uma destruição da procura a nível global devido à crise financeira." Uma situação que afecta a confiança das famílias e das empresas que acabam por cortar nas suas decisões de consumo - principalmente bens duradouros - e investimento.Sobre a queda nos preços em 2009, Dunning não é demasiado pessimista e apela mesmo a alguma cautela na análise, já que, por um lado, é uma descida muito próxima de zero, e, por outro, deverá ser apenas transitória e durante este ano. "Não deve haver um período sustentado de queda dos preços", sublinha.
Crise força entendimentos
A EIU prevê que o Partido Socialista vença as eleições legislativas mas sem maioria absoluta. Um resultado que, a confirmar-se, implicaria que José Sócrates governasse sem maioria na Assembleia da República ou então que avançasse para uma coligação.
Dunning não avança cenários sobre uma eventual coligação ou sobre o partido que poderá fazer parte dela juntamente com os socialistas. Refere apenas que "a situação económica vai pressionar entendimentos".
"Há uma ligação entre estabilidade política e estabilidade económica", acrescenta Dan O´Brien. Esta ligação é normalmente mais forte quando há subidas na taxa de desemprego, refere o economista, que refere ainda que, ao contrário do que está a acontecer em Portugal, os partidos de esquerda não estão a subir nas sondagens.