A passagem de Cavaco Silva pela Sociedade Lusa de Negócios (SLN), como acionista, foi lucrativa. O Presidente da República (PR) vendeu em Novembro de 2003 as 105.378 ações que tinha da SLN - empresa que até Novembro controlou o Banco Português de Negócios (BPN) -, por 2,4 euros cada. Tendo em conta que as tinha comprado em 2001 por um euro, Cavaco obteve, com este negócio, ganhos de 147,5 mil euros.
Também a sua filha Patrícia era uma pequena acionista da SLN e vendeu 149.640 ações na mesma altura que o pai, pelos mesmos 2,4. Resultado: mais-valias de 209,4 mil.
Documentos a que o Expresso teve acesso mostram que, a 17 de Novembro de 2003, Cavaco Silva e a filha deram ordem de venda das suas ações, em cartas separadas endereçadas ao então presidente da administração da SLN, José Oliveira Costa. Este determinou que as 255.018 ações detidas por ambos fossem vendidas à SLN Valor, a maior acionista da SLN, na qual participam os maiores accionistas individuais desta empresa, entre os quais o próprio Oliveira Costa.
O Expresso voltou esta semana a contactar o PR. Perguntou-lhe outra vez quando se tornou acionista e porquê, qual o valor a que comprou as ações em 2001 e qual o valor a que as vendeu. Fonte oficial da Presidência da República respondeu: "O professor Cavaco Silva - que só tomou posse como Presidente da República em 9 de Março de 2006 - e a sua mulher não têm nada a acrescentar sobre a gestão das suas poupanças, relativamente ao que consta do comunicado emitido pela Presidência da República em 23 de Novembro de 2008".
Nesse comunicado podia ler-se que Cavaco Silva, no exercício da sua vida profissional, "nunca exerceu qualquer tipo de função no BPN ou em qualquer das suas empresas; nunca recebeu qualquer remuneração do BPN ou de qualquer das suas empresas; nunca comprou ou vendeu nada ao BPN ou a qualquer das suas empresas". Além disso, referiu que nem ele nem a sua mulher contraíram qualquer empréstimo junto do BPN nem devem um único euro a qualquer banco, nacional ou estrangeiro, nem a qualquer outra entidade. Mas sobre ter sido acionista da SLN - que controlava o BPN - nada disse.
O Expresso foi também consultar as declarações de rendimentos de Cavaco Silva. Nelas foi possível verificar que na mesma conta do BPN onde tinha depositadas as ações da SLN, Cavaco tinha, em 2005, 210.634 euros. Com a venda das ações a 2,4 euros em Novembro de 2003, o PR obteve um encaixe de 252.907,2.
Os 2,4 não andavam, ao que o Expresso apurou, muito longe dos valores praticados noutras transações de ações da SLN naquela altura. O BPN não estava cotado na Bolsa, pelo que a determinação do preço das ações não era feita pelas regras de mercado. Não havia, por isso, um preço de referência para as ações definido oficialmente.
A participação de Cavaco na SLN não terá sido muito diferente da de muitas pessoas que foram atraídas para o projeto de Oliveira Costa pelas perspetivas de valorização do grupo. O banqueiro utilizava os seus conhecimentos para trazer para o grupo acionistas de relevo, quer da área política quer da empresarial. Por isso não é de estranhar que também Cavaco tenha acedido a participar no projeto SLN/BPN, tendo em conta que Oliveira Costa foi secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de um dos seus governos.
Mas, apesar de tal ser natural - e de ter sido mais um entre os 400 acionistas da SLN em 2003 -, Cavaco nunca quis confirmar a relação que teve com a SLN. Esta semana manteve a mesma postura. O Expresso já tinha revelado, em Fevereiro de 2008, que Cavaco Silva fora acionista da SLN, informação que na altura foi confirmada pela própria SLN. Em Novembro questionou o PR, pedindo-lhe que explicasse essa relação.
Cavaco não quis fazer comentários. Em vez disso, fez sair, a 23 de Novembro (um dia após sair a notícia), o comunicado a que alude.
Texto publicado na edição do Expresso, de 30 de Maio de 2009