O Tribunal de Contas (TdC) considerou esta terça-feira que o programa Portugal 2020 (PT 2020) teve uma aceleração em 2022 – o seu penúltimo ano de execução –, mas ressalvou que alguns programas têm níveis de absorção “preocupantes”.
“Verificou-se uma aceleração na execução do PT 2020, mas existem programas operacionais com níveis de absorção ainda preocupantes”, segundo o relatório “Fluxos Financeiros entre Portugal e a União Europeia e execução de fundos europeus em 2022”.
No ano em análise, foram transferidos 3262 milhões de euros para o Portugal 2020. Do montante total, 1204,3 milhões de euros dizem respeito ao FEDER – Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, 1058,7 milhões de euros ao FSE – Fundo Social Europeu, 479,5 milhões de euros ao FEADER – Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural, 469,6 milhões de euros ao Fundo de Coesão e 50 milhões de euros ao FEAMP – Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas.
O TdC notou que o arranque do PT 2020 foi demorado, “com apenas um programa a registar execução em 2014”.
No final de 2022, a execução era de 83,8%, mais 13,2 pontos percentuais do que no ano anterior.
Em nove anos foram assim executados 22.534,1 milhões de euros e 4356,4 milhões de euros, ou seja, 16,2% do valor programado, permanece por executar até ao final de 2023.
De acordo com os dados reportados no Portal Mais Transparência, em 30 de setembro de 2023, o PT 2020 apresentava 93% de execução.
“Apesar de Portugal não ser dos países com piores graus de execução, no PT 2020 os FEEI [Fundos Europeus Estruturais e de Investimento] registam, regra geral, taxas de execução inferiores às ocorridas no período de programação anterior”, sublinhou.
A Agência para o Desenvolvimento e Coesão (AD&C), que assegura a coordenação técnica do PT 2020, em sede de contraditório, alertou que a comparação da execução em quadros pode não ter em conta “diferenças existentes no horizonte temporal de execução dos mesmos”.
Por exemplo, o PT 2020 teve mais um ano para a execução do que o QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional), uma vez que foi sujeito à regra N+3, ou seja, apesar de terminar em 2020, a execução poderia ocorrer até ao final de 2023.
Já o QREN teve mais dois anos (N+2).
O PT 2020 consiste num acordo de parceria entre Portugal e a Comissão Europeia, “no qual se estabelecem os princípios e as prioridades de programação para a política de desenvolvimento económico, social e territorial de Portugal, entre 2014 e 2020”.
Os primeiros concursos foram abertos em 2015.
TdC aponta incorreta utilização de verbas na Conta Geral do Estado
O Tribunal de Contas apontou ainda esta terça-feira uma “incorreta e inconsistente” contabilização dos valores do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) na Conta Geral do Estado (CGE) em 2022.
“Dos 1534,7 milhões de euros ordenados pela EMRP [Estrutura de Missão Recuperar Portugal] e pagos em 2022, 1031,4 milhões de euros tiveram a natureza de subvenção e 512,3 milhões de euros a natureza de empréstimo. Do total das subvenções pagas, 936,6 milhões de euros tiveram como destinatários beneficiários da administração central e da Segurança Social”, lê-se num relatório do TdC.
Porém, a verba em causa não está “integralmente evidenciada” no Sistema de Informação de Gestão Orçamental (SIGO) / CGE como receita do PRR.
Segundo o documento, foram identificadas “insuficiências” de contabilização do “recebimento e da utilização dos fundos” do plano.
Para analisar os registos sobre os fluxos financeiros do PRR foram tidos em conta dados de 56 entidades beneficiárias diretas ou intermediárias, com execução de investimentos, pertencentes à CGE.
A execução do PRR está sujeita a um regime excecional que determina que, no que se refere a subvenções a fundo perdido, os valores de receita orçamental do ano, financiados, em exclusivo pelo PRR, “que não se tenham traduzido em despesa até ao final do mesmo ano” devem ser convertidos para operações extraorçamentais, nos primeiros 10 dias úteis de janeiro do ano seguinte.
Tal como já tinha acontecido na CGE de 2021, nem todas as entidades nivelaram o valor da receita orçamental do ano, pelo que “em quatro das 56 entidades, a execução do PRR gerou um saldo orçamental”.
O relatório “Fluxos Financeiros entre Portugal e a União Europeia e execução de fundos europeus em 2022”, revelou que os registos contabilísticos “continuam a não refletir a realidade das verbas recebidas pelos beneficiários do PRR, afetando a fiabilidade da informação constante da CGE 2022”.
Para o TdC, estas situações evidenciam a “necessidade de rigor na contabilização destas verbas, nomeadamente através do seu reconhecimento como receita orçamental na parte que não se traduz em despesa orçamental do ano, como legalmente estabelecido”.
Por outro lado, o tribunal alertou para o facto de o relatório trimestral sobre a execução do PRR não estar a ser elaborado trimestralmente pela Direção-Geral do Orçamento (DGO), conforme determinado pelo regime excecional de execução orçamental do PRR.
Assim, reiterou a recomendação ao ministro das Finanças, Fernando Medina, para que “zele pela expressão integral” da execução do PRR na CGE e pela elaboração e divulgação dos relatórios.
TdC diz que 42% dos desembolsos foram “efetivamente pagos” em 2022
O Tribunal de Contas indicou também que, até ao final de 2022, 42% dos desembolsos disponibilizados ao Plano de Recuperação e Resiliência foram “efetivamente pagos” aos beneficiários diretos e finais mas apontou “inconsistências” nos dados da Estrutura de Missão.
“A 31 de dezembro de 2022, dos valores de desembolso disponibilizados ao PRR [Plano de Recuperação e Resiliência], 42% (1.408,9 milhões de euros) haviam sido efetivamente pagos aos beneficiários diretos e finais”, lê-se no relatório.
Já aos beneficiários intermediários tinham chegado, aproximadamente, 1390 milhões de euros.
Até ao final de 2022, a Comissão Europeia tinha transferido para Portugal 3.321,3 milhões de euros, 20% da dotação acordada com a União Europeia. Deste valor, 1162,4 milhões de euros foram transferidos em 2022.
Segundo o relatório “Fluxos financeiros entre Portugal e a União Europeia e execução de fundos europeus em 2022”, o nível de contratualização dos investimentos entre a Estrutura de Missão Recuperar Portugal (EMRP) e os beneficiários diretos e intermediários era de 100%.
“Contudo, a disponibilização do PRR a esses beneficiários era de 1409,8 milhões de euros, o que representava 8,5% da dotação total prevista”, referiu.
O TdC sublinhou ainda que, no final de novembro de 2023, de acordo com os dados da EMRP, a contratualização da dotação atualizada do PRR está em 76% e os pagamentos aos beneficiários em 20% do aprovado.
No entanto, conforme apontou, estes dados não estão auditados, tendo sido encontradas “inconsistências”.
O relatório de monitorização reportado em 31 de dezembro de 2022, revelou que o investimento aprovado estava em 10.949 milhões de euros, mas as verificações efetuadas concluíram que este montante incluía 1226,1 milhões de euros referentes “a cinco investimentos/subvintestimentos, cujo montante aprovado era superior ao contratualizado entre o beneficiário e a EMRP”.
A EMRP disse tratar-se de “situações de aprovação acima da dotação e de incorreções no reporte respeitante a dois investimentos entretanto corrigidos”.
O TdC notou que, tendo em conta que esses montantes ultrapassam o financiamento do PRR, as situações em causa devem ser corrigidas para efeitos de monitorização, “de forma a garantir a fiabilidade dos dados no acompanhamento do grau de execução do PRR e respetiva divulgação”.
Por outro lado, foi apurada uma “divergência de 58,3 milhões de euros” entre as ordens de pagamento emitidas e pagas aos beneficiários diretos e intermediários (2741,4 milhões de euros) e a soma dos pagamentos efetuados aos beneficiários diretos e pelos beneficiários intermediários aos beneficiários finais com os valores e trânsito (2799,8 milhões de euros).
“Em sede de contraditório, a EMRP explicitou que estes casos, relativos a oito investimentos/ subinvestimentos dos 139 previstos, correspondem a situações em que os beneficiários intermediários pagaram aos finais montantes superiores aos pedidos e disponibilizados pela EMRP”, reportou.
Para o TdC, a utilização de verbas do orçamento dos beneficiários intermediários, que não têm origem no PRR, para suportar os pagamentos aos beneficiários finais, “deverá ser evidenciada de forma autónoma nos relatórios de acompanhamento do PRR, por forma a não colocar em causa o adequado acompanhamento do financiamento proveniente do MRR [Mecanismo de Recuperação e Resiliência], por parte desta Estrutura de Missão, bem como para garantir a fiabilidade e a transparência dos dados".
Em 22 de setembro, a Comissão Europeia aprovou a revisão do PRR de Portugal, que ascende agora a 22.200 milhões de euros.
Esta alteração integra a dotação financeira do programa energético europeu RepowerEU (704 milhões de euros), bem como a que não foi utilizada da reserva de ajustamento ao Brexit (81 milhões de euros).