Economia

Regras apertam para carros, edifícios, combustíveis, navios: Bruxelas avança enorme pacote legislativo para cumprir metas climáticas

É o mais ambicioso pacote legislativo e traça o caminho para reduzir em 55% as emissões de CO2 até 2030. Mas a ambição tem um preço, aplicado ao dióxido de carbono e que vai afetar o custo com combustíveis e com o aquecimento dos edifícios, tributando as fontes mais poluentes. As novas regras - que têm ainda de ser aprovadas - deverão também descontinuar a venda de carros a gasóleo e gasolina, e apertar as regras para a aviação e transporte marítimo

Carl Court/Getty

Bruxelas põe uma data para o fim da venda de novos carros e carrinhas movidos a combustíveis fósseis poluentes emissores de CO2: 2035. Depois disso, só podem ser comprados carros elétricos no mercado europeu (ou de uma outra tecnologia que garanta emissões zero). Os próximos anos deverão ser de preparação.

A Comissão estima que no final desta década os carros híbridos e plug-in ainda desempenhem um papel importante na transição, mas cinco anos depois deixam de poder ser comercializados novos no espaço comercial europeu.

O objetivo é reduzir a zero as emissões dos automóveis durante os próximos 14 anos. Ao mesmo tempo, os governos nacionais deverão reforçar as infraestruturas de carregamento dos veículos.

Depois de 2035, quem ainda tiver carros poluentes poderá continuar a utilizá-los (de forma descontinuada), mas deverá contar com o aumento dos constrangimentos e proibição de circulação que já começam a existir em muitas cidades europeias. O objetivo é que em 2050 - altura em que se deverá atingir a neutralidade climática - praticamente todos os carros e carrinhas nas estradas não emitam gases com efeito de estufa.

"A nossa economia baseada em combustíveis fósseis atingiu o limite. Sabemos que temos de avançar para um novo modelo", afirmou esta terça-feira a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Ao longo dos próximos três dias, a Comissão Europeia vai avançar os detalhes das várias propostas legislativas destinadas a garantir que a UE chega a 2030 com um corte de 55% nas emissões de dióxido de carbono, tal como já está inscrito na lei.

"A emissão de CO2 tem de ter um preço. Um preço que incentive os consumidores, produtores e inovadores a escolher as tecnologias limpas e os produtos sustentáveis", acrescenta Von der Leyen.

E não é só o setor automóvel que será afetado. Os consumidores deverão contar também com mexidas no setor da habitação, que poderão levar a um aumento dos preços com o aquecimento. Um dos elementos centrais do novo pacote é a reforma do Sistema de Comércio de Licenças de Emissão (ETS) que deverá ser alargado não só aos edifícios mas também ao transporte rodoviário, com impacto no preço dos combustíveis mais poluentes.

Fundo para apoiar famílias de menores rendimentos

Atualmente, os edifícios representam 40% do consumo de energia e as emissões ligadas ao transporte rodoviário continuam a aumentar. Bruxelas quer inverter a tendência, mas reconhece que o alargamento do mercado do carbono aos combustíveis, como forma de incentivar a redução de emissões, afetará proporcionalmente mais as famílias mais pobres do que as mais ricas.

Para tentar contrabalançar o impacto, "de uma forma social mais justa", a Comissão põe também em cima da mesa um novo Fundo Social para a Ação Climática de 72,2 mil milhões de euros (para 2025-2032) destinado a compensar as famílias com menores rendimentos e ajudá-las na transição para combustíveis mais limpos, podendo também ajudar as pequenas empresas. O novo sistema de ETS deverá arrancar em 2026.

"Sabemos que tributar o carbono funciona. O nosso sistema de comércio de emissões tem ajudado muito a reduzir as emissões na indústria e na produção de energia, por isso vamos reforçá-lo nestes setores, será aplicado na aviação e alargado também ao transporte marítimo", argumenta a presidente, lembrando que "um cruzeiro produz tanto CO2 por dia como 80 mil carros".

Noutra frente, a das importações, avança a proposta de um novo mecanismo de ajustamento de carbono nas fronteiras (CBAM), uma nova forma de fixar o preço do carbono nas importações para a EU. Para já tem como alvo grandes sectores: aço e ferro, alumínio, cimento, fertilizantes, pelo peso que têm na emissão de CO2. Quanto mais poluentes forem, mais pagam ao entrar no mercado europeu.

As empresas europeias terão de pagar "um ajustamento de carbono" pelas importações de determinados bens, alinhado com preço pago se os bens tivessem sido produzidos ao abrigo das regras europeias de fixação de preços de carbono (ETS).

Com esta medida, Bruxelas espera, por um lado, incentivar os países terceiros a reduzir também as emissões e, por outro, evitar que com as novas regras europeias, as empresas se deslocalizem para mercados externos onde a leis sejam mais permissivas à produção de carbono.

A aplicação não será de um dia para o outro. 2023 a 2025 será considerada uma fase de transição. Mas a partir de 2026, as empresas importadoras passam a ter de declarar a quantidade de emissões incorporadas no total dos bens que importaram.

Para já são propostas, segue-se a negociação entre os 27 Estados-Membros e o Parlamento Europeu que determinarão as que passam ou não à prática e ambição final das medidas. Do lado dos eurodeputados são já vários os avisos de que não podem ser os consumidores e as famílias - sobretudos as de menores rendimentos - a suportar sozinhas o preço da transição climática.