Eduardo Stock da Cunha regressou aos seus tempos na presidência do Novo Banco, de setembro de 2014 a agosto de 2016, e lembrou que aquele foi um período de grande fragilidade. Mas iria novamente à aventura. Na altura, havia um único acionista, o Fundo de Resolução, e a capitalização era limitada, os depósitos estavam em fuga e as surpresas não paravam de surgir. Mas há uma nota que deixa agora: “O Novo Banco sobreviveu, é bom que saibamos isso”.
A instituição financeira nascera em agosto de 2014, dos despojos então considerados saudáveis do Banco Espírito Santo. Stock da Cunha tinha como missão substituir Vítor Bento, que estava de saída apenas um mês após a sua constituição por discordar da vontade do Banco de Portugal de avançar para uma venda rápida do banco.
“O único mandato que recebi foi gerir o banco até ao momento em que fosse vendido”, disse o gestor aos deputados da comissão de inquérito ao Novo Banco esta terça-feira, 4 de maio. Era para ficar 18 meses, acabou por ficar 23 meses, até que no verão de 2016 foi substituído por António Ramalho, e regressou ao Lloyds, de onde tinha vindo com uma comissão de serviço.
Stock da Cunha não voltava atrás na decisão de liderar o banco, apesar da situação que encontrou: “Ou se morria lentamente, ou se parava a hemorragia de depósitos, ou se parava o crédito”. Mas, mesmo que soubesse que ia encontrar este cenário, “teria ido à aventura”.
À data, havia um défice de capital e, no cenário adverso, nem se cumpriam os rácios poucos anos depois da constituição do banco. “É reconhecido hoje que o Novo Banco começou com situação difícil”, declarou. Uma das conclusões que já se tiraram na comissão de inquérito é que o capital inicial da entidade bancária era reduzida face à sua realidade futura.
Quando chegou, Stock da Cunha encontrou “situações muito opacas”. Demorou um ano a descobrir uma “matrioska”, que escondia dívida de um grupo devedor, dispersa por vários instrumentos - não quis dizer qual era.
Além disso, só em dezembro de 2014, três meses após o nascimento, o balanço inicial do banco foi encerrado. E um ano depois ainda lidou com a decisão do Banco de Portugal de retransmitir parte da dívida sénior para o BES mau, impondo perdas aos investidores. Não é surpresa que Stock da Cunha discordou desta decisão do supervisor - preferia que os detentores afetados tivessem perdido os títulos de dívida sénior mas tivessem recebido em troca ações do Novo Banco, como chegou a admitir quando estava ainda no banco. As perdas desencadearam processos judiciais contra o Estado português. E isto depois de, no verão de 2015, ter falhado a primeira tentativa de venda do banco.
“Na altura, o futuro do Novo Banco era muito incerto”, disse.
Tributo aos trabalhadores
Apesar do contexto, “o que aconteceu foi que o Novo Banco conseguiu”. “É um tributo que se deve fazer aos trabalhadores”. Aliás, Stock da Cunha defendeu que os trabalhadores eram a sua prioridade quando entrou no banco – até para justificar porque é que a gestão de créditos tóxicos não foi logo uma frente de ataque da sua administração.
“Quando chegámos, a primeira coisa que fizemos foi gerir animicamente os colaboradores do Novo Banco. Não estavam numa situação fácil. Os maiores lesados do que aconteceu foram os trabalhadores”, defendeu. “Esta história terá alguns vilões, mas tem alguns heróis também. Nunca foi reconhecido esse contributo dos trabalhadores do Novo Banco”, continuou, admitindo que não lhe é fácil falar sobre esse assunto - "alguns deles tiveram de sair no meu mandato".
Além dos funcionários, também a redefinição do apetite de risco do Novo Banco teve de ser feita, como pôr fim aos créditos para a construção de projetos internacionais (project finance) ou para o financiamento à compra de ações. “Mudámos a filosofia de apetite de risco do banco”.