Economia

Tribunal de Contas destrói teoria de Passos e Costa sobre ausência de custos para os contribuintes com o Novo Banco

Auditoria defende que faltou transparência na comunicação feita pelos governos sobre as decisões relativas ao Novo Banco

José Caria

Enquanto na comissão de inquérito ao Novo Banco se discutem argumentos sobre quem é o maior culpado pelas perdas com o Novo Banco, o Tribunal de Contas deixou uma certeza, na sua auditoria ao financiamento público recebido pela instituição financeira: tanto Pedro Passos Coelho como António Costa não disseram toda a verdade sobre os custos que os portugueses iriam enfrentar com aquele banco. O Banco de Portugal também não.

“O Banco de Portugal e os Governos em 2014 e em 2017 anunciaram aos cidadãos que a resolução do BES e a venda do Novo Banco, respetivamente, nada iriam custar ao erário público”, aponta o relatório da auditoria, divulgado esta segunda-feira, 3 de maio.

Essa auditoria diz o contrário, de acordo com o Tribunal de Contas: “Até 31 de dezembro de 2019, o recurso ao mecanismo de capital contingente já representou 2.976 milhões de despesa pública, que acresce à dos 4.900 milhões de euros de capitalização inicial do Novo Banco, sendo ainda possível o dispêndio de mais 914 milhões ao abrigo do capital contingente, e do montante necessário à viabilidade do Novo Banco, em termos do compromisso assumido com a Comissão Europeia (até 1,6 mil milhões de euros)”.

Desses 914 milhões de euros, estão a caminho do Novo Banco mais 430 milhões por conta dos prejuízos de 2020, não cobertos pela auditoria (ficando uma fatia de quase 500 milhões ainda por solicitar até ao fim do mecanismo, em 2026); já o compromisso assumido por Bruxelas é por todos os intervenientes apontado como de muito improvável utilização.

Mas o que é certo é que desde a sua criação, em 2014, o Novo Banco vem sendo alvo de garantias de isenção de encargos para os contribuintes. Em 2014, o Governo Passos sublinhou que o recurso ao Fundo de Resolução, financiado pela banca, “salvaguarda o erário público”, não tendo os contribuintes de “suportar os custos”. Em 2017, António Costa sublinhou que “não existirá impacto direto ou indireto nas contas públicas, nem novos encargos para os contribuintes”. O Tribunal de Contas desafia o entendimento.

O Fundo é suportado pelos bancos e mesmo que seja ele a pôr o dinheiro no Novo Banco, precisou de empréstimos do Estado (de 6 mil milhões de euros, até agora). Esses empréstimos têm de ser devolvidos até 2046.

Falta transparência

Mesmo que todo esse dinheiro venha a ser devolvido, há aspetos que o Tribunal de Contas quis ressalvar. Os recursos próprios do Fundo de Resolução, que com estes empréstimos ficou com uma situação patrimonial totalmente negativa, são compensados por contribuições futuras da banca: há a considerar que 78% desses recursos são receitas da contribuição extraordinária sobre o sector bancário, que devia ter um “caráter excecional e transitório”. A restante parcela é com as contribuições periódicas anuais.

Esse encargo leva a um aumento de comissões: “essas contribuições são repercutidas sobre os consumidores de serviços bancários, como o ilustram as crescentes comissões e outros encargos cobrados por esses serviços”.

Além disso, “este modelo de financiamento comporta um segundo risco moral, por desviar o foco da imputação das perdas verificadas no BES e no Novo Banco aos seus responsáveis (por ação ou por omissão) para onerar clientes bancários (em regra também contribuintes)”, sublinha a auditoria, alertando ainda para os problemas de concorrência, já que nem todos os bancos a operar em Portugal pagaram esta contribuição sobre o sector bancário.

“Faltou transparência na comunicação do impacto da resolução do BES e venda do Novo Banco na sustentabilidade das finanças públicas”, aponta a entidade de fiscalização comandada por José Tavares. “Importa aplicar os princípios da transparência e da prestação de contas e comunicar periodicamente esse impacto nas finanças públicas e essa imputação de responsabilidades”, continua ainda o Tribunal de Contas.