Economia

Banca vai entrar em fusões e aquisições e Caixa avisa que a tendência não lhe é indiferente

Banqueiros acreditam que a tendência de consolidação chegará a Portugal e há quem diga que será já nos próximos dois anos. Mas há quem tema que o enquadramento favorece transferências para fora de Portugal, como o BCP, no dia em que surge num estudo do Goldman Sachs como alvo do Santander e do CaixaBank

João Pedro Oliveira e Costa (BPI), António Ramalho (Novo Banco), Paulo Macedo (CGD) e Miguel Maya (BCP)
TIAGO MIRANDA

A banca nacional deverá entrar na onda de fusões e aquisições que se está a desenhar um pouco por toda a Europa e que é favorecida pelas autoridades europeias como o Banco Central Europeu. O maior banco do sector português, a Caixa Geral de Depósitos, não tem esse objetivo, mas, havendo movimentações no mercado, admite que não ficará parado.

“À Caixa, de certeza que não é indiferente a consolidação. E ela vai acontecer”, declarou o presidente da comissão executiva da CGD, Paulo Macedo, na conferência Banca do Futuro, organizada pelo Jornal de Negócios, que se realizou esta terça-feira, 27 de outubro, com a presença dos responsáveis dos principais bancos nacionais (CGD, BCP, Santander, BPI e Novo Banco).

Segundo Macedo, essa tendência não é indiferente porque, acontecendo, o banco público, atual líder de mercado, será ultrapassado por concorrentes. “Em termos de intervenção, é algo que não está no nosso horizonte, mas também não nos é indiferente”, frisou.

A CGD está, neste momento, sob um plano estratégico acordado com a Comissão Europeia que impede aquisições, mas que termina no final deste ano. E, segundo Paulo Macedo, a consolidação vai decorrer “nos próximos dois anos”, até porque essa necessidade vai revelar-se à medida que vão sendo fechadas as contas deste ano. “Há-de haver instituições que têm de ver que perspetivas é que têm face aos resultados”.

Em 2015, a Caixa foi vista pelo Governo de António Costa como a bóia de salvação que poderia integrar o Banif, mas foi a oposição da Comissão Europeia que o impediu. Na altura, também não podia fazer aquisições. O que já não será um impedimento a partir de 2021.

Consolidação vinda de fora

Miguel Maya, à frente do BCP, não tem “dúvidas nenhumas” de que a consolidação vai acontecer. Só que, diz o líder do banco privado, os incentivos apontam para que os bancos portugueses sejam, aí, ultrapassados pela concorrência estrangeira. “Em Portugal, o enquadramento é para forçar consolidação europeia. Os incentivos estão criados para levar a deslocação de valor para fora de Portugal”, defendeu, num dia em que o Jornal de Negócios noticiou uma nota do Goldman Sachs sobre a consolidação europeia, que diz que o BCP é um possível alvo de compras por parte do Santander e do CaixaBank (dono do BPI).

“O enquadramento específico de Portugal é favorável a consolidação europeia”, frisou o presidente executivo do banco que tem a chinesa Fosun e a angolana Sonangol como principais acionistas. Esse enquadramento tem três vetores: há o fundo de resolução nacional (com um “fardo de 47 milhões para o BCP”), há custos com comissões bancárias determinados por um enquadramento regulatório não normalizado a nível europeu e há a “situação completamente anómala” de grandes depositantes a colocar dinheiro em bancos nacionais porque, aí, não pagam juros, como acontece em concorrentes europeus.

O governador, Mário Centeno, que fez a intervenção de abertura, não falou especificamente sobre o tema da consolidação. Mas considera que “é necessário garantir a resiliência do sistema bancário em face de um provável aumento nas perdas de crédito”. E, na resposta a uma crise, há harmonizações a nível europeu por cumprir (planos de insolvência, regras de gestão de crises, por exemplo).

Aumentos de capital afastados

Sobre essas necessidades, Miguel Maya não tem dúvidas: com base nas suas perspetivas atuais, não haverá necessidades de capital por parte do BCP. “Afasto liminarmente”, disse o banqueiro na conferência, quando questionado sobre um futuro aumento de capital.

Não está sozinho. “Do que nós vislumbramos, não estamos a ver, para já, necessidades de aumento de capital nem alteração do que temos vindo a seguir como estratégia”, declarou João Pedro Oliveira e Costa, presidente executivo indigitado do BPI (à espera ainda da luz verde do Banco Central Europeu).

O líder do BPI, cuja estrutura acionista mudou em 2017 passando para as mãos do CaixaBank, considera que haverá uma competição pela dimensão, tendo em conta o que se vê no mercado: “margens muitíssimo esmagadas, custos de regulação quase independentes da dimensão, entrantes com muita pressão”. Os players vão ter de ter grande capacidade de intervenção, até em nome de uma oferta de última geração aos clientes. “É preciso haver muito investimento e, para esse investimento, é preciso haver muito capital”.

A Autoridade da Concorrência também já avisou que, acontecendo fusões e aquisições no sector português, terá de avaliar os intervenientes com especiais cuidados, tendo em conta a sua dimensão - porque, defendeu Margarida Matos Rosa, o mercado já é concentrado.

Mercado já concentrado

António Ramalho é o banqueiro que menos considera existir menor necessidade de consolidação. O mercado está estabilizado em cinco entidades bancárias há décadas. “Estas cinco instituições foram objeto de uma grande revolução em 2020, mantendo-se o princípio das cinco instituições, que prevalece”, declarou o presidente do conselho de administração executivo do Novo Banco. Mas não nega que há um “desejo apregoado” pelas autoridades europeias de consolidação transfronteiriça.

O que tem existido, lembra Ramalho, é “consolidação ibérica”. “Essa consolidação não tem sido muito perniciosa, porque os colegas espanhóis percebem as características próprias da banca portuguesa”, continuou.

Na mesma conferência, o líder do Santander em Portugal alinhou na mesma ideia, dizendo que foram os bancos de capital estrangeiro que conseguiram apoiar o país na saída da crise da dívida (o que não é propriamente a mesma perspetiva dos bancos de capital português). O ponto que não está a ser discutido, defende Pedro Castro Almeida, é outro: “Que tipo de capital estamos a atrair para este país”. “Porque não atraímos fundos de pensões da Noruega, EUA, Canadá?”, questiona. Resposta: custos específicos e uma “perseguição ideológica”.