Economia

País deve mais de um PIB há 46 trimestres consecutivos

Posição de investimento internacional agravou-se no segundo trimestre de 2020 para -103,8% do PIB

Rui Duarte Silva

As estatísticas externas que o Banco de Portugal atualizou esta semana revelam que o endividamento da economia portuguesa face ao exterior — quando medido pela chamada posição de investimento internacional (PII), que compara os ativos portugueses no exterior com a posição dos estrangeiros em Portugal — ultrapassa a fasquia dos 100% do PIB há já 46 trimestres consecutivos.

No balanço entre o que o país deve e tem a haver do resto do mundo, a posição é devedora em mais de 100% do PIB desde o primeiro trimestre de 2009. Desde então, a PII agravou-se até ao primeiro trimestre de 2014 (quando chegou a -127,6% do PIB) e depois desagravou-se até ao primeiro trimestre de 2020 (quando finalmente regressou ao limiar dos -100,0%).

Mas a pandemia acaba de interromper esta tendência de desendividamento externo da economia portuguesa, com a PII a piorar de -100,0% para -103,8% do PIB no segundo trimestre de 2020.
Por culpa da crise económica, o país perdeu, assim, a hipótese de tirar finalmente um dígito a este rácio que tanto preocupa a Comissão Europeia ou o Fundo Monetário Internacional quanto à vulnerabilidade do país face a eventuais choques externos.

Apesar da trajetória de desendividamento dos últimos anos, o facto é que a economia portuguesa permanece como das mais endividadas perante o exterior. Basta notar que a área do euro arrancou o ano de 2020 com uma PII na ordem dos -1% do PIB, contra -100% do PIB em Portugal.

O Banco de Portugal acrescenta que a dívida externa líquida do país — que resulta da PII excluindo, fundamentalmente, os instrumentos de capital, ouro em barra e derivados financeiros — também piorou de -85,2% do PIB no 
primeiro trimestre para -88,8% 
do PIB no segundo trimestre.
Na balança de pagamentos, o défice da balança corrente também se degradou de -2,2% do PIB no primeiro semestre de 2019 para -3,2% do PIB no primeiro semestre de 2020.

O crónico défice da balança de bens até diminuiu €1623 milhões, passando de um défice de 7,9% do PIB no primeiro semestre de 2019 para um défice de 6,9% do PIB no primeiro semestre de 2020. No saldo entre exportações e importações, as estatísticas do comércio internacional revelam défices bem menores ao nível do material de transporte, dos combustíveis e de outras máquinas e equipamentos.
O problema é que o excedente da balança de serviços também diminuiu de 6,9% para 3,8% do PIB no primeiro semestre de 2020. A culpa foi da rubrica das viagens e turismo, que deixou de ‘salvar’ as contas externas como em anos recentes: o seu excedente encolheu 59%, significando menos €3027 milhões de receitas para o país