David Neeleman não aceitou as condições impostas pelo governo para sair da TAP, o que levou à rutura das negociações que se iniciaram esta terça-feira à tarde. Por esse motivo o cenário de uma nacionalização sem acordo voltou a estar em cima da mesa e deverá ser já aprovado no conselho de ministros da próxima quinta-feira.
Esta quarta-feira de manhã o governo e David Neeleman voltaram a negociar o acordo de saída do empresário norte-americano do capital da TAP. E havia um ultimato em cima da mesa: ou até à meia noite havia acordo para a venda dos 22,5% da TAP detidos por Neeleman ou avançava a nacionalização forçada daquela participação. Mas a falta de acordo com Neeleman levou ao fim das negociações, segundo apurou o Expresso. O governo deixa, no entanto, a porta aberta a um recuo de última hora – até ao momento de aprovação do despacho de nacionalização que já está pronto.
O Expresso sabe que o ponto de discórdia mais difícil de ultrapassar – e considerado o último obstáculo a um acordo - dizia agora respeito ao empréstimo obrigacionista que a companhia aérea brasileira Azul, da qual Neeleman é acionista, fez à TAP em 2016. São 90 milhões de euros e o Estado queria que este crédito fosse convertido em capital, abatendo assim a dívida da TAP. Este empréstimo dura até 2026 e tem associada uma taxa de juro de 7,5%. A Azul só admitia transformar este empréstimo em capital se tivesse uma garantia pública. Exigência que o Executivo de António Costa rejeitou liminarmente. A Azul, em caso de insolvência da TAP ou nacionalização, perderia esses 90 milhões de euros.
Neeleman é acionista da Azul e também presidente do seu conselho de administração. É conhecida a sua influência na empresa e por isso um acordo aconteceria se ele desse a sua concordância - é esta a leitura do governo. Mas o empresário terá optado por não votar sobre temas que envolvam a TAP. De acordo com o Jornal de Negócios foi marcada uma reunião da Azul para esta quarta-feira com o objetivo de tomar uma decisão sobre esta matéria.
Iniciou-se ontem à tarde uma reunião para se conseguir chegar a acordo para a saída de Neeleman, mas havia uma distância grande entre o valor por ele pedido e o valor que o Estado admitia dar: 65 milhões de euros versus 40 milhões de euros. Os valores foram-se aproximando e, segundo apurou o Expresso, no momento da rutura das negociações o valor de saída de Neeleman já estaria negociado e acordado - 55 milhões de euros - e já não seria um problema.
O governo queria ter fechado o dossiê esta terça-feira até à meia noite e fez pressão nesse sentido, mas David Neeleman mostrou-se inflexível, o que empurrou as negociações para esta quarta-feira. Não tendo sido alcançado um acordo, avança o despacho da nacionalização. Esta manhã o primeiro-ministro António Costa disse que esperava ainda hoje “uma solução negociada e com acordo e não com ato de imposição do Estado”. Mas se tiver de ser uma nacionalização, “cá estaremos para isso”.
Após o chumbo pelo conselho de administração da TAP do acordo entre acionistas para dar luz verde ao empréstimo de 1,2 mil milhões de euros à companhia aérea, na segunda-feira, o governo entendeu que não havia outra solução senão avançar para a nacionalização da empresa e deu ordens nesse sentido. Mas David Neeleman regressou à negociação e a questão que ficou em aberto foi como se processaria a nacionalização – se com acordo entre acionistas ou se sem acordo.
A existência de um acordo de saída evitaria um potencial conflito jurídico, embora o governo entenda que numa fase de emergência mundial por causa da pandemia de covid-19 tem argumentos para avançar para uma nacionalização ‘hostil’, atendendo ao interesse público de salvar uma empresa estratégica para o país e que aguarda um entendimento dos acionistas para receber os 1,2 mil milhões de euros que o Estado está autorizado pela Comissão Europeia a emprestar-lhe.
Mas além disso esse acordo com Neeleman permitiria a manutenção de Humberto Pedrosa como acionista da TAP. Juntos, Neeleman e Pedrosa detêm 45% da TAP através Atlantic Gateway e nacionalizar metade desta empresa (cada um tem 50% da Atlantic Gateway) será uma operação juridicamente complexa. Estava em cima da mesa das negociações a compra conjunta da posição de Neeleman por parte do Estado e de Humberto Pedrosa. Avançando a nacionalização nos moldes em que está previsto, Pedrosa poderá também ter de sair da TAP.