Economia

Assim não é possível analisar as previsões, denuncia a UTAO: Portugal é o único país do euro sem cenário macro no Programa de Estabilidade

O órgão independente que presta assistência técnica ao parlamento critica a diminuição da transparência da informação que o Ministério das Finanças presta à Assembleia da República. Risco da TAP para as finanças públicas é um dos exemplos

Mário Centeno Foto Reuters

“Portugal é o único país que não divulga qualquer projeção macroeconómica do seu Ministério das Finanças”, critica a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) na apreciação ao Programa de Estabilidade que o governo submeteu dia 7 de maio à Assembleia da República.

Este órgão independente liderado por Rui Nuno Baleiras esclarece que, à data de 9 de maio, estavam disponíveis na página da Comissão Europeia 17 Programas de Estabilidade, faltando os de Portugal e da Eslováquia para completar o universo de Estados Membros que compõem a área do euro. Ora todos os 17 Programas de Estabilidade tinham cenário macroeconómico, tendo a generalidade dos países optado por apresentar projeções económicas para 2020–2021 e, em alguns casos, até 2022/2023.

“Excluindo a Eslováquia, cujo Programa de Estabilidade ainda não foi divulgado, apenas Portugal não divulgou qualquer projeção macroeconómica. Nestas condições, não é possível à UTAO analisar as projeções do Ministério das Finanças para a evolução de variáveis-chave da economia portuguesa, como é o caso da evolução do PIB e das suas componentes, do mercado de trabalho, da evolução dos preços e da posição económica de Portugal no que respeita à sua relação com o resto do mundo, através da Balança de Pagamentos e das suas subdivisões”, lê-se no relatório.

A UTAO lembra que devido ao contexto de incerteza muito elevada originada pelo covid-19, o Ministério das Finanças entendeu que o contexto atual não permitiria apresentar projeções fidedignas. “Com efeito, no PE/2020 não se encontram as projeções para o conjunto de variáveis que tipicamente integram os Programas de Estabilidade”.

Mas esta não é a única falta de informação criticada pela UTAO que, aliás, se sentiu na obrigação de dar mais informação aos cidadãos sobre o contexto económico e financeiro da pandemia em Portugal. Basta notar que o Programa de Estabilidade apresentado pelo Ministério das Finanças tem menos páginas que o próprio parecer que a UTAO realizou em apenas quatro dias e meio.

Um dos exemplos da opacidade do Ministério das Finanças é o de não indicar quais são os elementos que estão na base do cálculo das estimativas de impacto mensal no Orçamento do Estado das medidas adotadas contra a Covid-19 e que corresponderão a um encargo estimado de €1223 milhões por mês.

Para algumas medidas relacionadas com lay-off simplificado é possível compreender a base de cálculo. "No entanto, a dimensão do impacto das medidas de isolamento profilático, subsídio por doença e despesa com equipamentos de proteção individual não é facilmente apreensível. Sem informação adicional, não é possível à UTAO pronunciar-se sobre a qualidade do impacto orçamental estimado das medidas apresentado no Programa de Estabilidade”, diz este órgão independente que presta assistência técnica ao parlamento.

Outro exemplo está no facto de o Programa de Estabilidade apenas fornecer informação sobre os €6,2 mil milhões dos apoios de Estado concedidos no âmbito do quadro temporário permitido pela Comissão Europeia, destinados à concessão de garantias à Linha de Apoio à Economia COVID-19. “Não se encontra especificada informação sobre os apoios diretos de €1,6 mil milhões, nem sobre a autorização restante de €6,8 mil milhões para concessão de garantias”, acrescenta a UTAO.

“A necessidade de intervenção do Estado português na TAP Air Portugal constitui um risco descendente importante para as finanças públicas, com elevada probabilidade de materialização, não se encontrando no Programa de Estabilidade 2020 informação sobre esta matéria”, alerta a UTAO no relatório já disponível no site da Assembleia da República.