Não há qualquer razão para as coimas aplicadas pela Autoridade da Concorrência, não é provável que venha a haver condenações judiciais (e, havendo-as, já se fala em ir para segunda instância), não há pedidos de indemnização e não há necessidade de constituir provisões para assegurar o pagamento das sanções. Estas são algumas das posições dos bancos, inscritas nos relatórios e contas relativos ao primeiro semestre, relativamente ao processo que ficou conhecido como cartel da banca.
Um conjunto de 14 bancos a operar em Portugal foi condenado pela Concorrência a coimas conjuntas de 225 milhões de euros por trocarem informação sensível que influenciou, durante mais de uma década, a oferta de crédito à habitação, ao consumo e a empresas.
No relatório do primeiro semestre, o BPI, alvo de uma coima de 30 milhões de euros, é o único banco que assume claramente que não vê qualquer razão para reconhecer o impacto nas contas do primeiro semestre desta decisão, já conhecida apenas no decorrer da segunda metade do ano.
“É convicção da comissão executiva do conselho de administração do banco de que as probabilidades de o processo vir a terminar sem o banco ter de pagar uma coima são mais elevadas do que as de suceder o inverso, não existindo, por isso, qualquer provisão para este processo reconhecida nas demonstrações financeiras do Banco em 30 de junho de 2019”, indica o documento publicado no site da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
O banco sob o comando de Pablo Forero acredita que não cometeu a infracção imputada: “a alegada troca de informação não produziu quaisquer efeitos negativos para o mercado, nem para os consumidores, tendo, pelo contrário, pelo menos em parte, tido efeitos pró-concorrenciais”.
A generalidade das instituições de crédito visadas vai impugnar a decisão da Concorrência para o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém (o Banif é a exceção), e, como o Expresso escreveu, uma das argumentações é precisamente o facto de os bancos defenderem que não houve lesados por esta prática.
Os recursos anunciados são muitos, e, no caso do BPI, há já uma indicação: perdendo em Santarém, poderá recorrer para segunda instância, o Tribunal da Relação de Lisboa.
Sem pedidos de indemnização
Nesse sentido, o Banco Montepio, alvo de uma coima de 13 milhões, escreve, no seu relatório e contas semestral, que “as hipóteses de sucesso de eventuais ações judiciais intentadas contra o Banco Montepio com fundamento na decisão [da Concorrência são] reduzidas”.
De qualquer modo, a instituição presidida por Dulce Mota (que teve direito a uma redução da sua coima para metade por ter aderido ao programa de clemência) não tem conhecimento, “que, até à data, tenha sido intentada qualquer ação judicial de indemnização”.
Nos seus relatórios semestrais, que tiveram de publicar até ao final do mês de Setembro, também a CGD (coima de 82 milhões), BCP (coima de 60 milhões) e Santander (coima de 36 milhões) referem o caso, sendo que mencionam a impugnação.
Miguel Maya, o líder do BCP, assumiu na semana passada, em declarações ao Eco, que a questão de uma eventual provisão, era um tema a estudar: “Naturalmente que temos de discutir isto com os auditores e dessas conversas tomaremos a decisão que considerarmos adequada para que as contas do banco reflitam os riscos do banco”. Para já, não houve impacto nas contas semestrais.
O pagamento das coimas neste processo - iniciado com uma denúncia do Barclays em 2012 - só é obrigatório quando a decisão relativa à instituição deixar de ser recorrível, isto é, quando transitar em julgado. Tendo em conta os recursos, o eventual pagamento está distante.