Com 10 hotéis em Portugal, dos quais seis na Madeira, o grupo PortoBay também apostou no mercado brasileiro, que hoje representa 14% da faturação total (€82 milhões em 2018), graças às unidades no Rio de Janeiro, Búzios e São Paulo. Com uma política de expansão tranquila, o grupo hoteleiro, que nasceu em 1998, no Funchal, prepara novas aberturas (Madeira e Porto), ainda este verão, num ano que António Trindade reconhece ser de quebra. Nesta que é a terceira entrevista integrada no Prémio Nacional Turismo, uma parceria Expresso /BPI, o presidente e CEO do grupo PortoBay não tem dúvidas que o futuro turístico nacional passa por uma união de esforços com Espanha.
Todos os dias se anunciam novos hotéis em Portugal, estamos a viver um ambiente de furor exagerado em relação ao Turismo?
Historicamente, em termos turísticos, a oferta tem sido sempre superior à procura e, na bacia do Mediterrâneo, onde Portugal se insere, existe um princípio de vasos comunicantes: quando uns destinos baixam, os outros crescem. Foi neste contexto que o nosso país viveu cinco anos de ouro, com a consequente euforia, que estruturalmente foi importante. Mas a verdade é que a memória humana é curta e o fator preço tem um peso significativo e, já este ano, Portugal está a sentir o desvio de turistas para outros destinos...
E agora, qual é o caminho do turismo nacional, partindo do princípio que, estrategicamente, não será o preço, mas sim a qualidade da oferta, a mais-valia do destino Portugal?
Portugal é um destino ibérico. Infelizmente e durante muito tempo, as nossas picardias com Espanha levaram-nos a não ter esse fator em consideração e a olhar para os nossos vizinhos apenas como o principal mercado emissor de turistas. Mas o mundo mudou e tornou-se global. O continente americano, com destaque para os Estados Unidos e o Brasil, está a crescer, e esses turistas, de mais do que um país, procuram uma experiência ibérica, tendo em conta as rotas de chegada à Europa. Ou seja, para conseguir ganhar esses novos mercados, mais longínquos, onde também se insere a Ásia, Portugal tem de pensar de uma forma mais abrangente, que não apenas a realidade nacional. Temos de criar, em parceria com Espanha, um elemento de atração chamado Ibéria, que vai permitir o crescimento sustentado das rotas áreas oriundas dos Estados Unidos, a manutenção das operações sul-americanos, no nosso caso, muito baseadas no Brasil, e acima de tudo fazer crescer, devido ao protagonismo de Espanha, o número de turistas que chegam da América Latina. É este pacote ibérico que nos vai permitir criar novas experiências e ter mais turistas. O nosso futuro turístico passa por esta convergência e união de esforços.
Esta estratégia de futuro tem tido apoio das estruturas governamentais ou é um caminho que os empresários do sector turístico têm de trilhar sozinhos?
Ao Estado cabe a função de ser mais regulador e orientador, e menos regulamentador, ao empresário turístico a obrigação de ser um visionário. Desde que se decide construir uma unidade hoteleira até ao momento em que esta recebe o primeiro turista passam, no mínimo, cinco anos. Logo, é preciso antecipar e equacionar todas as variáveis no momento em que se decide investir. Não apenas os hoteleiros, mas também os nossos parceiros fundamentais do sector das acessibilidades, porque esse é o elemento determinante para o crescimento ou sustentação de um destino, seja um país ou uma região turística. Este é o tema prioritário, que deve ser escalpelizado, discutido e, acima de tudo, garantido.
Essa necessidade remete, obrigatoriamente, para a pressão existente sobre o novo aeroporto de Lisboa e para a dependência, nomeadamente da Madeira e do Algarve, relativamente a novas rotas áreas...
Na qualidade de empresário de origem madeirense, a minha expectativa é poder aproveitar melhor o hub Lisboa, mas temos de ter em consideração que, em termos turísticos, mais de 60% do tráfego para a Madeira se faz sem passar pela Portela. Ao contrário do Algarve, o maior destino turístico português, que depende quase a 100% de Lisboa. No caso da Madeira, mais do que discutir a necessidade de ter mais uma companhia área a voar para o arquipélago, é fundamental aumentar o número de linhas e de acessibilidades. É muito importante que os destinos nacionais com maior oferta de camas, como Madeira e Algarve, diversifiquem as ligações diretas e a utilização de outros hubs europeus, nomeadamente a partir de Espanha, na lógica da tal afirmação ibérica. Madrid ou Barcelona podem ter um papel tão ou mais importante do que o Porto, como alternativa. Mais ainda quando o aeroporto de Lisboa está completamente congestionado e impedido, por isso, de contribuir ainda mais para a distribuição de turistas por todos os destinos nacionais.
E quem deve liderar esse processo. O Estado?
Não, este é um processo que deve envolver os agentes aeroportuários, no nosso caso, a ANA Aeroportos, as entidades de promoção turística e os empresários do sector. São estas entidades que devem sugerir às companhias áreas ou agentes do transporte, as novas oportunidades existentes no nosso país.
A meio do ano, e tendo em conta as quebras registadas tanto na Madeira, como no Algarve, onde está concentrada a maioria da oferta do grupo PortoBay, quais são as expectativas para 2019?
Nós temos a noção de que não vamos atingir, por hotel, os números do ano passado, ainda que, por termos aberto uma nova unidade [PortoBay Hotel Teatro, no Porto], estejamos acima, em termos de faturação, do alcançado em 2018. Em janeiro, as previsões eram de 8% a 10% de quebra, mas olhando para o acumulado até junho, registou-se uma recuperação e a minha expectativa é terminar o ano com um crescimento entre 0 e 5%. Tendo em conta os últimos cinco anos, que foram excecionais, e a contenção de custos que temos vindo a fazer, fico bastante descansado com os resultados de 2019.
Depois do melhor ano de sempre, em 2018, com uma faturação de €82 milhões, este recuo no crescimento altera o plano de expansão e de novas aberturas do grupo?
Pelo contrário. Estamos muito esperançados com o impacto da abertura do PortoBay Flores, no Porto, que contamos abrir muito em breve, e do projeto Les Suites, no Funchal, que deve acontecer ainda durante o mês de agosto.
A entrada em Espanha, várias vezes anunciada, está para breve?
Espanha é uma afirmação e uma aposta estratégica para o grupo. Neste momento estamos a fazer um compasso de espera relativamente à entrada em Espanha devido à bolha imobiliária que ali se vive. Temos sido relativamente conservadores em relação ao nosso crescimento e sempre preferimos fazer hotéis de raiz, mas não deixamos de olhar para oportunidades de negócio pela via do arrendamento ou da gestão.
Madeira a cair
As primeiras estimativas da Direção Regional de Estatística da Madeira relativas à atividade turística no arquipélago no mês de maio apontam para um decréscimo de 2,9% no total de dormidas (728 mil, em comparação com o mês homólogo. Esta descida na Madeira contraria a tendência nacional que se mantém numa curva ascendente, com mais 3,9% de dormidas em maio. No acumulado de janeiro a maio deste ano, as dormidas na Região Autónoma da Madeira registaram um decréscimo de 1,6% comparativamente com idêntico período de 2018. Os dados apresentados revelam ainda uma quebra, em maio, nos três principais mercados emissores de turistas (alemão, francês e britânico). Em sentido contrário, o turismo nacional cresceu 17,7%. Relativamente aos proveitos totais, o mês de maio registou um aumento de 2,3%, em relação a 2018, ao atingir 39,3 milhões de euros. Ainda assim, o acumulado de 2019, até maio, revela um decréscimo de 4,4%.
Textos originalmente publicados no Expresso de 27 de julho de 2019