Economia

Em 20 anos 46% dos empregos vão deixar de existir como os conhecemos (e nada garante que se trabalhará melhor)

A automação deverá eliminar 14% dos empregos atuais nas próximas duas décadas. Outros 32% sofrerão mudanças profundas, à medida que a inteligência artificial substitui os humanos nas suas tarefas individuais, avança a OCDE no Employment Outlook 2019. E “não há garantias efetivas de que trabalharemos melhor amanhã do que hoje”, acrescenta o organismo

lucília monteiro

Nos próximos 15 a 20 anos o mercado de trabalho como hoje o conhecemos não será igual. Os avanços tecnológicos e, em particular, a automação alterarão por completo 46% dos empregos atuais. Desta percentagem, a maioria (32%) sofrerá alterações profundas, mas não deixará de existir. Só 14% enfrentam, efetivamente, a ameaça da extinção. As contas constam do relatório Employment Outlook 2019, divulgado esta quinta-feira pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) que reconhece que as previsões são “significativamente mais otimistas do que as que têm vindo a ser avançadas por outros investigadores” que chegam a apontar para a eliminação de 50% dos empregos atuais. Mas a maior leveza dos números não alivia o problema, garante a organização.

“Não há garantias efetivas de que trabalharemos melhor amanhã do que hoje”, reconhece a OCDE que defende que “o futuro do trabalho dependerá, fundamentalmente, das políticas e decisões que venham a ser adotadas pelos vários países e Governos”, nomeadamente no campo da proteção social aos trabalhadores. A partir daquilo que pretende ser uma reflexão profunda sobre o emprego do futuro, o documento reconhece que embora a tecnologia represente inúmeras oportunidades e seja “pouco provável que as transformações em curso resultem numa redução expressiva do número de empregos” - já ela permite também criar novos empregos e transformar os atuais -, ela está a operar uma reconfiguração total do mercado laboral que “não beneficia todos os profissionais por igual”.

“Alguns grupos profissionais estão já a registar dificuldades no acesso e manutenção do emprego e as disparidades no mercado de trabalho estão a acentuar-se em muitos países”, alerta o relatório. Nos últimos anos, a par com os avanços da tecnologia, assistimos a uma polarização do mercado de trabalho com o aumento do número de profissionais com baixas e elevadas qualificações e um esvaziamento do grupo de profissionais com um nível de qualificação intermédio no ativo. Aumentaram as desigualdades em matéria de oportunidades de trabalho e salários, mas também na proteção social. No topo das preocupações da OCDE estão os novos modelos laborais que a revolução tecnológica ajudou a criar e que deixam milhares de trabalhadores desprotegidos.

Sistemas de proteção social precisam de revisão

Focando-se na designada economia das plataformas, onde os profissionais desempenham a sua atividade online, a OCDE reconhece as oportunidades de emprego criadas, mas mostra grande apreensão pelo aumento do número crescente de trabalhadores que passaram a figurar numa “zona cinzenta”, entre emprego dependente e independente, que é cada vez mais difícil de clarificar.

“O acesso à proteção social pode ser muito difícil para trabalhadores com vínculos contratuais não formais. Os trabalhadores por conta própria estão, tipicamente, menos protegidos pelos regimes de proteção social”, recorda a OCDE acrescentando que “em muitos países, a probabilidade destes trabalhadores receberem algum tipo de apoio social quando ficam sem rendimentos é entre 40 a 50% inferior à dos trabalhadores com contratos formais”.

O crescimento exponencial que a economia das plataformas tem vindo a registar nos últimos anos leva a OCDE a defender a necessidade dos países reverem os seus sistemas de proteção social, “de forma a garantir uma maior proteção para os trabalhadores da nova economia ou aqueles com vínculos contratuais e carreiras mais voláteis”. Entre as medidas recomendadas pela organização nesta matéria estão, por exemplo, o alargamento da abrangência da proteção social já existente às novas formas de trabalho.

“Os sistemas de proteção social existentes têm inúmeras potencialidades e permanecem viáveis, mas precisam de se adaptar às mudanças em curso e aos riscos que estas colocam”, recomenda a OCDE. A organização defende que “criar sistemas de proteção social suficientemente ágeis para responder às mudanças e às necessidades dos trabalhadores, garantir que os seus direitos transitam de emprego para emprego e garantir uma adaptação dos apoios a novos padrões de trabalho em permanente evolução” é fundamental para assegurar um futuro do trabalho inclusivo e que não discrimine em direitos nenhum profissional.