Economia

Reforma do Governo limita independência dos supervisores, acusa CMVM

Com a nova arquitetura da supervisão financeira, uma autoridade pode ter de implementar algo com que não concorda. Esta é uma das críticas da CMVM, que também acredita que vêm aí mais custos para os supervisionados. Numa dimensão não calculada

Gabriela Figueiredo Dias, presidente da CMVM
Alberto Frias

A independência dos supervisores financeiros fica limitada caso a reforma proposta pelo Governo, que já chegou à Assembleia da República, seja implementada, segundo considera uma dessas autoridades. A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) acredita, igualmente, que há mais custos a suportar pelos supervisionados e que nem há uma estimativa clara de valores.

Para a CMVM, a independência dos supervisores financeiros sofre um impacto negativo sobretudo no órgão que vai juntar todas as autoridades, o Conselho Nacional de Supervisores Financeiros. Aí, haverá uma presença paritária entre todos, ao contrário de atualmente em que o Banco de Portugal preside, só que isso abre uma possibilidade problemática.

Segundo o parecer divulgado esta quarta-feira, 20 de março, o decreto-lei do Governo que dá forma à reforma da supervisão financeira “possibilita que uma das autoridades de supervisão seja obrigada pelas restantes a implementar uma decisão no seu âmbito específico e exclusivo de competências que não subscreve e contra a qual tenha votado, com consequências a nível da independência dos supervisores e da definição de âmbitos de competência e responsabilidade”. Há, aqui, uma "limitação à independência e autonomia" dos supervisores, o que poderá "colocar sérios problemas também em matéria de responsabilização de cada uma das autoridades".

Além disso, este conselho terá, além das autoridades, um administrador executivo que é externo. Essa participação tem “impactos negativos na independência dos reguladores e custos acrescidos para o sistema”, indica o supervisor do mercado de capitais. O mesmo acontece com a Autoridade de Resolução – e aqui a CMVM critica o facto de que o Banco de Portugal ter prevalência.

Ainda no campo da autonomia, a entidade liderada por Gabriela Figueiredo Dias considera que, embora saia das amarras da Lei de Execução Orçamental, continua a haver limitações devido à transferência de receitas próprias para a Autoridade da Concorrência.

Mais custos para um mercado saturado

Outro ponto tem que ver com o aumento dos encargos para os supervisionados com o novo desenho da supervisão, que agora terá de ser discutido no Parlamento. Isto quando o mercado de capitais já sofre com a falta de atividade de relevo.

Esse acréscimo de custos será suportado “pelo universo das entidades supervisionadas do sistema financeiro, quer por o Conselho Nacional de Supervisores Financeiros ser dotado de um quadro de pessoal próprio, de autonomia financeira e de competência para a criação de novas taxas, quer por a Autoridade de Resolução e Administração dos Sistemas de Garantia ser também dotada de autonomia financeira e ter despesas próprias cujo modo financiamento carece de clarificação”.

O agravamento dos custos que as entidades supervisionadas têm de pagar “em montante não estimado” .

Mas nem tudo é negativo. Há aspetos positivos, como o “reforço da cooperação e da coordenação entre as autoridades de supervisão” e a perda de privilégios do Banco de Portugal, que leva a um “tratamento paritário” entre todos, no sistema.

A CMVM deixa, contudo, uma crítica, que devia haver um estudo prévio, com várias hipóteses, que fizesse uma avaliação de custos-benefícios.