ARQUIVO Um país com quilómetros de histórias

Vítor, pescador no inverno e guia no verão, sentiu o bichinho da finança e está revoltado com Salgado

"O mar é liberdade, é paz, lava todos os problemas que deixo em terra." Observações de Vítor, filho de um antigo supervisor do Banco de Portugal que encontrámos na Ria Formosa. Dois repórteres do Expresso partiram numa viagem que os levará de norte a sul de Portugal. Estão a narrar diariamente o mais inesperado que se encontra pelo país fora.

Bernardo Mendonça e Tiago Miranda

Dia #9 na estrada. Olhão.

Ouvimos um comentário sobre o caso Ricardo Salgado e o BES em plena Reserva Natural da Ria Formosa, pela voz de Vítor Moreira, um pescador de mar alto e guia turístico da zona. Encontrámo-nos com ele junto ao cais da cidade e pedimos-lhe para nos mostrar na sua embarcação típica, o "Maré Alta", as maravilhas locais. A maré estava de facto alta e o sol forte a apetecer programas na água. Os comentários sobre o tema que tem aberto os jornais do país vieram pouco depois.

Logo ali, a uma pequena distância de barco encontrámos os tesouros de Olhão: a Reserva da Ria Formosa e as longas praias imaculadas das ilhas da Culatra e de Armona. Fomos puxando pelo Vítor, o homem do leme, com 40 anos, um tipo comunicativo que revelou ter um percurso e origem invulgar para figura do mar e da pesca.

Natural de Olhão, é filho de um antigo supervisor do Banco de Portugal que esteve no ativo nos anos 70, 80 e 90. "A banca é para mim um assunto próximo, familiar. Cheguei a sentir o bichinho para continuar os estudos e ligar-me à finança. Mas o meu gosto, a minha paixão e vocação era e será sempre o mar. É liberdade, é paz, lava todos os problemas que deixo em terra". Vítor tomou-lhe o gosto aos 12 anos ao iniciar-se na vela. Depois, aos 17 começa a trabalhar como nadador-salvador na Quinta do Lago, Vale do Garrão e Vale do Lobo. Deixa o areal e passa a skyper de barco na Marina de Vilamoura, antes de seguir para Olhão.

Hoje é pescador no inverno e navega com turistas nos meses quentes. "Adoro desta vida e por enquanto vai dando para viver." A par do que se passa nas notícias, partilhou o seu desagrado da trama sobre o BES e o seu ex-presidente. Fê-lo sem hesitações ou gaguejos, a caminho da Culatra. "Sinto-me bastante revoltado. Não só pelo que aconteceu a Oliveira e Costa e Jardim Gonçalves, mas com o que está a acontecer a Ricardo Salgado. Malta desta, sem apelo, nem perdão, devia ir presa. Não se está a fazer justiça. [Ele] chuta cá para fora uma caução de 3 milhões de euros com a maior das facilidades e agora tem todo o tempo do mundo para se preparar como arguido". E ainda diz: "Os colarinhos brancos passam impunes no nosso país". No final da viagem, para descontrairmos, metemo-nos com ele.

-  Ser marinheiro e guia turístico tem as suas vantagens para conhecer belas turistas estrangeiras, não? Vítor acena com a cabeça e sorri. - Sim, trava-se muito conhecimento...

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