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Artes Plásticas

Exposições: Querubim Lapa, um pintor do corpo

As constantes mudança e inquietação de um artista que nunca deixou de investigar: os materiais, as formas e as poéticas. Exposição no Museu do Neo-Realismo, em Vila Franca de Xira, até 29 de outubro

“Descanso” (1951), onde o grito está contido numa ferida na árvore, e o protesto nos ramos que se erguem como dedos

Um tempo, os anos que vão de 1945 a 1963, e uma forma, o corpo humano, dominam a exposição da “poética neorrealista” em Querubim Lapa (1925-2015), 270 números de catálogo que vão de meados de 40 a um diminuto grupo de obras de 60, num conjunto dominado pela figuração do corpo humano, pois apenas três obras não se lhe referem: um interior, de 1947, uma vista de Lisboa, de 1956, e uma alegoria de título bem intencional, “Os Peixes Grandes Comem os Pequenos”, de 1960. Não há qualquer monotonia neste percurso da juventude, a partir dos 20 anos e das primeiras experiências realistas, até ao afirmar de um sistema figurativo numa primeira maturidade. Uma enorme variedade de técnicas, sobretudo na utilização do suporte papel, com as mais variadas combinações entre elas, institui, além de uma grande variedade formal e expressiva, a noção de uma constante experimentação.

O início é marcado por um realismo social que prolonga uma tradição europeia que vem do século XIX, com registos de uma miséria urbana e resignada, onde os corpos parecem sentir o peso, o peso físico dessa miséria nos mendigos, nas mulheres e nas crianças. Em contraponto seguem-se imagens do circo, popular, pobre, despojado, onde vemos o público olhando para cima, curioso e inquieto com as habilidades perigosas dos acrobatas fora de campo, num conjunto de imagens evocando um sagrado sem transcendência.