A noite eleitoral já tinha vencedores anunciados mas ninguém podia ter anunciado isto: a vitória tão esmagadora de António Costa. Contra o PSD, contra o PCP, contra o fantasma das legislativas passadas e… contra a coesão da geringonça? Provavelmente sim.
Tudo muda depois destas eleições autárquicas. Passos Coelho prepara-se para não se recandidatar e o PSD pode cair ao colo de Rui Rio. Porque a derrota de Passos é tão grande e grave que não aniquilou apenas um líder, mas dois: Passos sai e Luís Montenegro, que se afilava como sucessor na continuidade, fica afivelado à devastação passista. A passadeira estende-se para a candidatura de Rio. O tema já não são os erros de Passos – que são tão evidentes que é quase desnecessário listá-los -, o tema é agora quem se lhe segue. E quem se lhe segue encontra um partido rachado, desorientado mas ávido.
Mas António Costa derrotou nestas eleições outro líder partidário: Jerónimo de Sousa. O PCP perde câmaras, perde bastiões e perde força nacional. Em vésperas de apresentação de proposta de Orçamento do Estado, o PCP não pode não aprová-lo. Mas depois… depois disso o PCP vai ter de endurecer não só o discurso mas também a ação contra o governo PS. Foi por isso que Marques Mendes disse domingo à noite que “agora a legislatura já não chega ao fim”. Mesmo que chegue, tudo será diferente.
Esta vitória incrível do PS é um grande triunfo de António Costa mas pode ser um triunfo bom de mais, tão bom que talvez nem o próprio o desejasse já. Porque Pedro Passos Coelho, ao ser um fraquíssimo líder da oposição e ao representar o espírito da Troika, fazia parte do que permitia que a esquerda se unisse contra a direita. Passos era o opositor ideal de Costa, como aliás se viu esta noite, seria bom para o PS tê-lo até 2018. Mas ter Jerónimo contente também. Será fácil o PCP atacar o governo: basta olhar para as partes do acordo de apoio ao governo que ainda não foram cumpridas, designadamente na legislação laboral, para perceber como a agenda sindical se irá impor em 2018.
Dois dos pilares da atual solução do governo estão abaladas. António Costa está cheio de poder e vai rapidamente preparar-se para a fase legislatura 2:0. Uma fase em que o Bloco de Esquerda poderá continuar alinhado e em que o PS quererá capitalizar uma crise política caso ela exista. Mas agora o passismo acabou. E o PCP amigável também. António Costa dorme feliz pelo presente mas acordará a pensar no futuro. É, na verdade, um bom problema, porque o equilíbrio político mudou mas António Costa nunca teve tanto poder como tem hoje. Nem provavelmente esperava tê-lo já.