Tudo começou no Lux, discoteca de Lisboa que, por estes dias, comemora 25 anos de aventuras. Paulo Furtado, roqueiro dos sete costados que há coisa de 20 anos conhecemos como Legendary Tigerman, foi lá ver um concerto. Já não se recorda se era uma banda ou “um produtor” que atuava, mas o que ouviu fê-lo pensar no que andava a fazer. “Estava um bocado farto”, confessa, explicando a génese do novo “Zeitgeist”. “E tive uma epifania. O concerto era uma coisa meio tecno e agressiva, e de repente percebi que as colunas tinham capacidade para um espectro que eu nunca iria ocupar, a tocar guitarra e bombo. Então meti na cabeça que iria construir este disco de outra maneira”, desvendou ao Expresso em julho, minutos antes de subir ao palco do Super Bock Super Rock, no Meco, onde apresentou pela primeira vez as canções do seu novo álbum. O trabalho que tem vindo a desenvolver em bandas sonoras para filmes e peças de teatro, “bastante diferente do que as pessoas conhecem como Tigerman”, foi outro dos ingredientes que quis usar no seu menu. Tudo para, aos 53 anos, mudar a perceção que o mundo tem de si. “Acho que as pessoas tinham a ideia de que eu era uma one man band, ou então aquele gajo do rock e do punk”, diz. “Debaixo da terra, eu sou mais algumas coisas do que isso.”
Se a epifania inicial surgiu à beira-Tejo, “Zeitgeist”, o disco que hoje chega às lojas, começou a nascer em Paris. Depois de lá celebrar os dez anos de “Femina”, o marcante álbum de 2009, o português permaneceu na Cidade Luz durante meio ano e por lá encontrou inspiração. “[Bebi] da noite de Paris e do seu lado mais agressivo e cru”, esclarece. “Como em todas as cidades, em Paris há cada vez mais pobres, e as pessoas têm de lutar para terem uma vida que já não é completamente digna. A classe média está empurrada para a pobreza, e em Paris, como em Londres, isso nota-se mais”, observa. “Eu estava no norte de Paris, num bairro que não é turístico, e até é um bocadinho duro, e isso agradou-me. Muitas das letras [refletem] coisas que aconteceram ali. Eu sempre adorei Paris, mas nunca tinha vivido lá um período tão longo, e gostei muito de sentir a cidade com todos os seus defeitos e coisas feias.” Uma das canções de “Zeitgeist”, ‘Losers’, foi escrita depois de Paulo Furtado assistir a uma manifestação “bastante agressiva”. Cantada com Anna Prior, baterista dos ingleses Metronomy, espelha “o facto de a sociedade nos empurrar numa luta por uma vitória financeira ou de status, que é um [mero] sonho. Cada vez mais a vida das pessoas é o contrário: um pesadelo. Vivem na carga da falha, de não conseguirem alcançar as coisas que a sociedade nos diz que devíamos alcançar, quando, na realidade, as regras do jogo estão sabotadas.”