Muitas vezes penso no que aconteceria, no caso de acontecer uma tragédia natural, como um terremoto, num mundo onde a grande maioria da população, concentrada em cidades, não sabe lançar uma semente, cuidar de um animal, nem fazer muitas das coisas básicas para a sobrevivência. É tão fundamental para a nossa sobrevivência, que não consigo entender como é que esta matéria não é prioritária em toda as escolas.
Aprendemos a liberdade da democracia. Mas do que nos serve essa liberdade, sem a autossuficiência de sabermos cultivar os nossos próprios alimentos em caso de necessidade? Não sou um arauto da desgraça, mas não me parece que seja descabido pensar nisto. Basta lembrarem-se no cenário de caos e de pânico que tivemos, na Europa, há uns anos quando houve falhas no fornecimento de combustível durante uns dias. Ou a corrida desenfreada aos supermercados, no início da pandemia.
Isto é ainda mais verdade, num momento da história da humanidade em que a sustentabilidade é pior do que a pasta medicinal Couto – anda na boca de toda a gente. Mas não basta atirar as palavras para o ar – é preciso, em primeiro lugar, saber e conhecer as matérias sobre as quais estamos a falar e, depois, agir em conformidade. Se nem sequer sabemos distinguir bem o que é uma vaca e o que é um boi, se achamos que desertificação e despovoamento são a mesma coisa, que esperança existe de que a sustentabilidade possa vir a ser uma realidade?
Quando analisamos, em inovação social, um determinado problema, começamos sempre por fazer 2 coisas – definir de forma clara e precisa o problema social, identificando claramente o seu contexto, e analisar as suas causas mais profundas. E o contexto é, efetivamente, o ponto de partida que nos pode dar as pistas sobre muitas das soluções que procuramos, quando combinado com conhecimento. Por isso, apetece-me sugerir a todas as famílias que façam o esforço de se descontextualizarem das suas vidas urbanas, e que planeiem regularmente incursões pela Natureza e vão aprendendo mais sobre a Natureza e tudo o que ela tem para nos dar. Não só de alimento e bens para a nossa sobrevivência, mas de outros ensinamentos que resultam da sua mera observação. O que não pode acontecer é haver crianças que veem uma vaca e perguntam se é um cão. Isso é que não.
E atualmente não existe mesmo desculpa nenhuma. Com o nível de acesso a informação e com as soluções, mesmo para quem vive em contexto urbano, que nos permitem trazer a Natureza para dentro das nossas casas e diariamente conhecer mais sobre ela. E perguntam? Mas porque é que eu, que não trabalho com a Natureza, não vivo no campo, vou ter de saber cultivar um alimento ou ordenhar uma vaca, se eu vou ao supermercado e compro tudo lá? E a resposta é – não tem. Não tem de o fazer. Mas se o não fizer, existe um preço a pagar. Chama-se ignorância. E essa tenho a certeza de que nunca conduz a bons resultados.
Oiça aqui os episódios do podcast Ser ou não ser: