O despovoamento das áreas interiores, em particular nas áreas rurais, representa um problema ainda atual no contexto europeu, que afeta significativamente o desenvolvimento sustentável. Em Portugal, o ritmo de despovoamento destas zonas continua em ascensão, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE). Com efeito, os Censos de 2021 indicam, de forma clara, que esta assimetria demográfica tem vindo a acentuar-se, estando 20% da população portuguesa concentrada em 7 concelhos, que representam apenas 1,1% do território nacional, e 50% da mesma em 31 municípios.
83% da população vive no litoral. Mas quais as principais causas deste despovoamento? Essencialmente 3 fatores, embora outros possam contribuir para esta realidade:
– Os níveis de envelhecimento da população portuguesa - ainda segundo o INE, numa projeção apresentada sobre a população residente em Portugal, entre 2018 e 2080, o número de jovens diminuirá de 1,4 milhões para 1 milhão e o número de idosos, com 65 anos ou mais, passará de 2,2 para 3 milhões;
- A fraca dinâmica económica destas regiões, com uma, muitas vezes estrutural, falta de criação de oportunidades para fixação e desenvolvimento;
- Finalmente, as dificuldades existentes ao nível da gestão de terras e florestas, com impactos negativos sérios ao nível da biodiversidade e das alterações climáticas – segundo dados do relatório intercalar da Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas, de Julho deste ano, mais de 50% do território continental apresenta um forte potencial de desertificação, com particular evidência nas áreas do Alentejo e Algarve. Este risco de desertificação é acentuado, segundo refere o mesmo relatório, pelas alterações climáticas esperadas, nomeadamente o aumento das temperaturas, a diminuição dos níveis de precipitação, em combinação com práticas agrícolas inadequadas e a escassez de água em alturas de seca.
A pandemia, com as situações de confinamento forçado e a consequente vontade de alguns segmentos da população, em particular de população mais jovem e com maior mobilidade, de estarem mais perto da natureza, em territórios de baixa densidade populacional, veio trazer alguma esperança, com alguns projetos muito interessantes a surgirem. É o caso da Feira de Empregabilidade Jovem do Interior, que teve lugar em Maio de 2022, em Viseu, e que é uma iniciativa inovadora, resultado de um projeto de Empreendedorismo Social denominado INterioriza-te. Esta centelha de esperança não foi, no entanto, e infelizmente, nem de perto, nem de longe, o suficiente para inverter a tendência do despovoamento.
Mas existem estes pontos de inspiração ao fundo do túnel e isso, por si só, pode constituir, se bem comunicado e apoiado, quer a nível público, quer através da iniciativa privada, um bom começo de conversa. Estruturas como o Portugal Inovação Social e também o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), com as suas respostas aos desafios desta transição dual, a nível climático e digital, podem ser boas alavancas para a promoção de novas iniciativas.
E acredito que o empreendedorismo, com os seus instrumentos e com um ecossistema que continua a florescer em Portugal, e, em particular, o empreendedorismo social, com o seu foco na criação de valor transversal e de valorização dos patrimónios locais, pode ser uma das principais vias para que este grande problema possa ser mitigado de forma mais significativa.
Onde existem grandes focos de crise e de desafios, existem também muitas oportunidades. A mentalidade empreendedora, com a inerente capacidade de iniciativa e de risco, associada a uma capacidade de mobilizar recursos financeiros e não financeiros, pode fazer uma diferença fundamental em muitas áreas económicas, das quais destacaria, em especial, os mercados e comércio locais, a transição energética e o turismo sustentável.
Já temos bons exemplos dessa possibilidade no país, como o município de Idanha-a-Nova, na promoção da agricultura biológica e do turismo sustentável, ou as cooperativas locais de energia em Trás-os-Montes e o impulso, de base comunitária, à transição energética e consequente geração de oportunidades de emprego.
É preciso não parar. Ser resiliente. E começar a olhar para a enorme diversidade, natural e cultural que um país tão pequeno, e tão bem interligado, com infraestruturas de apoio de qualidade, apresenta, e as oportunidades de diferenciação local que cada uma das zonas do País nos oferece. Neste caso, diria que não basta só SER. É preciso FAZER ACONTECER.
Oiça aqui os episódios do podcast Ser ou não ser: