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Regenerar e replicar a natureza

Acredito que estamos a caminhar, lentamente, para uma visão mais consciente de uma economia, que traga mais convergência e colaboração. E as empresas são, como em muitos outros temas relacionados com a sustentabilidade, um fator-chave

Porque os conceitos, as terminologias e a forma como falamos da realidade são importantes para alinhar visões e ações, e este é um passo fundamental para a transformação da economia no sentido de uma maior sustentabilidade, é importante perceber uma expressão que tem vindo a ganhar algum relevo nos últimos tempos. – Economia Regenerativa.

Esta proposta de um novo modelo de economia, alternativo ao sistema de mercado tradicional, assenta numa ideia simples de utilizar os mesmos padrões e princípios da Natureza, para construir sistemas estáveis, saudáveis e sustentáveis, nas várias dimensões das realizações no mundo. E esta ideia assenta em 3 premissas ou pressupostos:

- A economia é um sistema vivo que, atualmente, não é saudável;

- Existem padrões e princípios universais que regem a vida, de modo geral;

- Se a Economia humana quer ser sustentável no longo prazo, tem de alinhar com estes mesmos princípios.

Mas que princípios são estes que regem esta visão de uma nova economia? É um tema com alguma complexidade, que não se resume de forma fácil, sem aprofundamento, mas existem alguns princípios que são fundamentais para a compreensão desta visão:

- A humanidade é uma parte integral de todos os ecossistemas na Terra e no Universo, tal como sugere a física quântica e não existe uma real separação entre os humanos, e entre estes e o resto da Vida. A implicação imediata disto é que tudo o que fazemos, ou não fazemos afeta a biosfera na qual estamos inseridos;

- A riqueza não se resume à acumulação de capital financeiro, material ou tecnológico - existem outros tipos de capital, como o social, o relacional, o cultural e outros, todos eles radicados no valor da natureza, enquanto fonte e suporte da nossa vida;

- A economia não deve ser exploratória dos recursos naturais, mas antes deve procurar criar, de forma proativa, as condições para a recuperação dos ecossistemas;

- Tudo na economia deve ser visto como circular e regenerativo, tal como na própria natureza, e não apenas o tratamento dos resíduos e desperdício;

- Finalmente, e porque existe uma interconexão e interdependência entre todos os seres humanos, e a força do sistema é tão forte – salve o pleonasmo – quanto a fortaleza do seu elemento mais fraco, o comportamento naturalmente condizente com esta aproximação é o da colaboração, e não o da competitividade.

Portanto, mais do que a mera alteração dos modelos de negócio, no sentido não apenas de conservar e manter os ecossistemas que são explorados na produção, mitigando os efeitos negativos dessas atividades, mas de multiplicar proativamente a prosperidade desses ecossistemas, trata-se numa mudança de visão de toda a lógica económica, quanto à forma como produzimos, como consumimos, o que consideramos riqueza e bem-estar na sociedade.

E algumas das ações que representam estas mudanças já têm vindo a ser, progressivamente, desenvolvidas, por muitos agentes desta economia onde a sustentabilidade começa a ser o centro e o núcleo, como, por exemplo, a utilização de materiais biodegradáveis na produção, a compostagem de resíduos orgânicos ou o desenvolvimento de produtos recicláveis. Mas é preciso, segundo os que advogam este modelo, muito mais do que isto para replicar e espelhar a resiliência da Natureza – é preciso criar círculos virtuosos de exploração-conservação-recuperação, em todas as frentes da economia.

É difícil não entender e não simpatizar com esta visão. A questão é – mas porque é que parece ser tão difícil por isto em prática? Talvez porque toda a mudança de paradigma vem sempre com consideráveis doses de inércia e custos significativos de transformação. Mesmo que os modelos atuais sejam claramente mais danosos para as pessoas e planeta, vamos mantendo o status quo. Mas acredito que estamos a caminhar, lentamente, para uma visão mais consciente de uma economia, que traga mais convergência e colaboração. E as empresas são, como em muitos outros temas relacionados com a sustentabilidade, um fator-chave. E qualquer gestor pode fazer esta mudança, a qualquer momento.

Mário Henriques

Oiça aqui os episódios do podcast Ser ou não ser: