SER

Diferença e diversidade. Duas realidades possíveis

A diferença existe. E não é má, nem boa. Apenas existe. A diversidade é boa. E nem sempre existe. E isso é mau. A igualdade deve ser mais equidade, e mais centrada no acesso igualitário, e menos uma tentativa artificial de colocar tudo no mesmo recipiente, catálogo ou etiqueta. Reduzir a categorias simplistas é, no mínimo, redutor. E sim, existem diferenças biológicas e químicas entre homens e mulheres, devido às diferenças hormonais e anatómicas entre o sexo masculino e o sexo feminino. E não sou eu quem o diz – é a ciência.

Algumas dessas diferenças biológicas, têm manifestações estudadas, por exemplo, na estrutura óssea, no sistema reprodutivo, na composição corporal ou hormonal.

E existem também diferenças químicas, por exemplo, ao nível dos neurotransmissores, das enzimas empáticas e dos genes. Para dar dois exemplos práticos, compreensíveis para todos. Primeiro, os níveis de serotonina no cérebro são geralmente mais baixos em homens do que em mulheres, enquanto os níveis de dopamina e norepinefrina são geralmente mais altos em homens do que em mulheres. Como é natural, isto tem reflexos a nível comportamental. Segundo, as mulheres tendem a ser mais empáticas e a ter habilidades sociais mais fortes do que os homens, enquanto os homens tendem a ter habilidades espaciais mais fortes e serem mais agressivos em situações competitivas. Ou seja, são observações de padrões que, não sendo aplicáveis a toda e qualquer pessoa de um determinado género, são observados enquanto dados estatísticos relevantes.

E este é o ponto em que alerto para dois grandes erros, que são típicos nas conversas que oiço à volta do tópico da igualdade de género. Achamos que todos falamos das mesmas coisas quando utilizamos grandes palavras, como igualdade ou diversidade, erro crasso e base número um de toda a falha dos processos de comunicação. Aconselho, seja quem for, que entre em argumentações nestes tópicos, para que utilize um dos princípios básicos da Escuta Ativa: perguntar à pessoa com quem interagimos, o que entende pelo conceito “A” ou “B”. Este é o ponto de partida de qualquer conversa produtiva.

Depois, confundirmos características e traços de personalidade, e de temperamento, com características de género - em dois sentidos. Existe determinado tipo de atitudes típico de grupos, mas não por serem típicos de um ou outro género (embora existam diferenças químicas e biológicas entre homens e mulheres que podem gerar diferentes comportamentos) mas porque faz parte da sua personalidade, ou porque são resultados de condicionamentos derivados de comportamentos grupais onde as pessoas se integram. Como também, muitas das reações a determinados comportamentos de outra pessoa de género distinto, não têm qualquer fundamento ou motivação discriminatória, mas sim e apenas uma intolerância ou incapacidade de lidar com características ou manifestações de personalidade de outra pessoa.

Não devemos, na minha opinião, pura e simplesmente, catalogar de forma simplista, só por ser mais fácil ganhar argumentos, porque é um tema que está mais na berra e é mais sensível. Perdendo a nossa capacidade de pensar de forma crítica, procurando ir mais longe do que o óbvio, perdemos o princípio fundamental no qual assenta a sociedade livre na qual queremos viver. Pelo menos, na qual eu gostaria de viver.

O ponto fulcral desta reflexão é que, mais do que centrar as conversas nas diferenças, que são naturais e saudáveis, deveríamos sim estar mais preocupados com a equidade e a necessidade da diversidade.

E, não querendo entrar em análises profundas sobre o que é a equidade e sobre as raízes ideológicas, culturais e éticas, pelas quais a única coisa que faz sentido é basearmos as decisões, a este nível, numa visão isenta que se centre nas pessoas, independentemente do seu género, talvez fosse importante referir aquelas que são, na minha opinião, as quase óbvias razões pelas quais a diversidade é crucial, e fator chave de competitividade, sob o ponto de vista da sustentabilidade das organizações.

E, quanto a este ponto em particular, julgo que para além da resposta aparentemente evidente , dos benefícios associados à melhoria da imagem pública perante clientes e outros stakeholders (que, alerto, não se mantém no tempo, como nenhuma cosmética se mantém e que, por isso, está condenada ao fracasso - e já tivemos vários exemplos disso) e da importância de criação de valor partilhado, através da responsabilidade social corporativa, para o envolvimento com as comunidades onde operam, parece-me que as empresas não podem deixar de olhar para isto - uma empresa mais diversa e inclusiva tem um maior potencial de geração de retorno financeiro:

- Um estudo da consultoria McKinsey & Company, intitulado "Diversity Matters" (A Diversidade Importa), analisou dados de 366 empresas em todo o mundo e descobriu que as empresas com maior diversidade de género nas suas equipes de liderança, são mais propensas a ter retornos financeiros acima da média dentro das suas indústrias;

- Outro estudo, da consultora Catalyst, intitulado "The Bottom Line: Corporate Performance and Women's Representation on Boards", descobriu que empresas com pelo menos três mulheres nos seus conselhos de administração superaram empresas com apenas homens, em termos de retorno sobre o património líquido, e de retorno sobre as vendas.

E, para além disso:

- Um estudo de consultoria da McKinsey descobriu que empresas com uma força de trabalho diversa têm maior probabilidade de superar as empresas com menor diversidade em termos de rentabilidade financeira;

- Um estudo da Harvard Business Review concluiu que equipas diversificadas tendem a ser mais inovadoras e criativas do que equipas homogéneas;

- Uma pesquisa da Deloitte afirma que empresas com uma liderança diversa e inclusiva têm maior probabilidade de atrair e reter talentos diversificados.

Em resumo: Qual é parte que os gestores ainda não perceberam? Ou já perceberam, mas são lentos e resistentes em implementar?

A diferença é o pressuposto base da diversidade. A diversidade é o ponto de partida da riqueza da complementaridade de pontos de vista, formas de ver e de atuar. Esta riqueza é fator crítico de sustentabilidade do negócio. E das pessoas. Tão simples quanto isto.

Mário Henriques

Oiça aqui os episódios do podcast Ser ou não ser: