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Associações de vídeo e telecomunicações querem avisos e multas para quem consome pirataria e alertam para perdas anuais de 250 milhões

Fevip e Apritel pretendem que o futuro governo avance com um sistema que lança avisos e aplica multas a quem consome pirataria através da Internet. Ativistas dizem que esses sistemas, que já estão em uso na Alemanha, Espanha ou Itália, não respeitam o direito fundamental da privacidade das comunicações. Só no Telegram, foram contabilizados mais de 500 mil links de jornais e revistas desde janeiro

De fora não se nota, mas dentro da Inspeção Geral de Atividades Culturais (IGAC) há uma a caça à pirataria em curso. Em 2024, a entidade fiscalizadora recebeu 800 denúncias para remoção ou bloqueio de sites e links, com o objetivo de travar a distribuição cópias ilegais em Portugal. Das denúncias resultou o bloqueio de 660 endereços que dão acesso a filmes, jogos, transmissões em direto de futebol e outros desportos, música, jornais ou livros. Faria sentido pensar que o problema ficaria resolvido, mas 2025 ainda não chegou a meio, e as 313 denúncias já registadas confirmam que a luta contra a cópia ilegal não deverá parar tão depressa, apesar de ter garantido o bloqueio de 71% dos casos reportados. Na associação Fevip, que representa distribuidores e produtores de vídeos e videojogos, fala-se em perdas anuais de 200 milhões de euros. O número fica abaixo das perdas anuais de 250 milhões de euros estimadas pela associação de operadores de telecomunicações Apritel, mas ambas entidades não escondem que têm o objetivo comum de avançar com algo mais efetivo.

“A tecnologia só vai conseguir resolver este problema se começar a identificar quem consome pirataria e avisar que, se continuar a fazer o mesmo um determinado número de vezes, arrisca-se a pagar uma multa. Consumir conteúdos piratas é comparável ao recetador que compra coisas roubadas”, defende António Paulo Santos, diretor-geral da FEVIP. “É algo que queremos trabalhar quando houver um novo governo, pois com este não conseguimos nenhuma audiência”, acrescenta numa crítica à ministra da cultura Dalila Rodrigues.

Os futuros pedidos de audiência já estão em preparação – e é bem provável que os representantes dos produtores de vídeo e videojogos acabem por não ser os únicos a explanar o problema numa eventual ida aos gabinetes ministeriais do Palácio da Ajuda. “Temos de sensibilizar o consumidor, e temos de penalizar quem difunde pirataria, mas faltam ainda mecanismos de dissuasão que contemplam a notificação do consumidor e, se se justificar, aplicam advertências pecuniárias”, responde Pedro Mota Soares, secretário Geral da Apritel. “A advertência pecuniária só deve acontecer quando o consumidor acede a pirataria de forma sistemática e repetida”, sublinha o representante dos operadores.

Entre os anos 90 e a atualidade, a luta entre autores e piratas passou por várias fases. No início da expansão da Web dominou a livre cópia sem grandes entraves ou sequer consciência do ilícito. Na primeira década do milénio, ficaram célebres sites de partilha eMule e Napster e as sentenças em diferentes países que, nalguns casos, produziram ricochete contra a popularidade de quem pedia indemnizações a pais de família.

Na segunda década, os mecanismos de combate à pirataria subiram um degrau na sofisticação – e em Portugal teve início, em 2015, a fase dos bloqueios de endereços piratas, mediante o envio de denúncias para a IGAC por parte dos titulares dos direitos de autor. Foi esse mesmo memorando que serviu de matriz a um decreto-lei de 2021 que reforçou o valor legal dos bloqueios de sites e links piratas.

Acontece que parte substancial da pirataria digital evoluiu entretanto para redes transnacionais que recorrem a boxes de TV ou apps e, nalguns casos, cobram subscrições mensais e até exploram publicidade. A este cenário há que juntar as redes sociais e as grandes marcas da Internet que alojam serviços, apps ou apenas ligações virtuais para vários conteúdos piratas – e que, por vezes, rejeitam, nas barras de tribunal, os intentos dos representantes dos autores.