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A “calculadora da morte”: pode a Inteligência Artificial prever quando vamos morrer?

Chama-se “Life2vec” também conhecido como “calculadora da morte”. Estudo da Universidade Técnica da Dinamarca destaca as potencialidades deste novo algoritmo

Quando achávamos que a Inteligência Artificial não podia afetar mais as nossas vidas, ela decide prever também a nossa morte. Numa sociedade em que a IA já não é novidade e já deu provas daquilo que é capaz, surge um novo tipo de algoritmo, o Life2vec. Esta nova ferramenta traduz-se numa “calculadora da morte”, que afirma ser capaz de prever a “data” da morte de um indivíduo com base em detalhes básicos da vida pessoal como os rendimentos, a profissão, o nível de escolaridade ou a frequência com que vai ao médico.

Este algoritmo foi apresentado com mais detalhe num estudo desenvolvido por cientistas e investigadores da Universidade Técnica da Dinamarca e publicado na revista “Nature Computational Science”, em dezembro do ano passado. Assim como o ChatGPT, um sistema de inteligência artificial que responde, via mensagem escrita, às mais variadas perguntas ou pedidos, também o Life2vec recorre a uma base de dados para determinar a expectativa de vida de cada indivíduo.

Essa base de dados utiliza diversos fatores que têm influência no quotidiano dos indivíduos, formando um vocabulário que remete para uma “espécie de linguagem”. Essa linguagem é transformada em códigos, que são lidos e interpretados pelo algoritmo que depois se propõe a prever o “destino”.

Os dados abrangeram seis milhões de dinamarqueses entre 2008 e 2020. Para uma análise mais precisa e com menos probabilidade de gerar erros, foi selecionada uma amostra heterogénea em termos de idade e sexo de um grupo de pessoas entre os 35 e os 65 anos, metade dos quais morreram entre 2016 e 2020.

De acordo com os autores do estudo, o Life2vec não tinha acesso aos dados sobre quais os indivíduos que tinham morrido nesse período de tempo, conseguindo acertar com uma precisão a rondar os 78%. Em relação a outros modelos de IA já existentes, este modelo conseguiu superá-los em pelo menos 11%.

É possível “prever quase tudo” com este modelo, diz Sune Lehmann, um dos autores deste estudo ao “The New York Post”. Lehmann afirma que, por exemplo, já o testaram para prever a personalidade de um indivíduo ou a predisposição para se mudar para um outro país.

A utilização do Life2vec ainda é muito limitada. O algoritmo está programado para uma realidade específica associada ao estilo de vida vivido na Dinamarca: os resultados obtidos nos campos laboral e da saúde podem diferir de resultados obtidos em outros países da Europa ou nos Estados Unidos, por exemplo.

Algoritmos como o Life2vec devem ser “o meio e não um fim em si mesmo”

A utilização deste tipo de ferramentas associadas à previsão de uma morte pode vir a beneficiar as seguradoras, como explica Anjana Ahuja do Financial Times. Sobre esta possibilidade, Lehmann evidencia o seu distanciamento por questões éticas. À revista “New Scientist”, diz que o modelo não deve ser utilizado por uma seguradora “porque toda a ideia do seguro é que, ao partilhar o desconhecimento de quem vai ser o azarado atingido por algum incidente, ou morte, ou perda da mochila , podemos compartilhar esse fardo”.

Recentemente, a União Europa chegou a um acordo para uma Lei da Inteligência Artificial, ainda de caráter provisório, que visa garantir que os sistemas de IA implementados na União Europeia “são seguros e respeitam os direitos fundamentais e os valores europeus”, desde a segurança, privacidade e transparência à democracia.

Por outras palavras, e como explicou em dezembro Paulo Dimas, diretor-executivo do Centro para a Inteligência Artificial Responsável, ao Expresso, estamos a falar de uma “tecnologia muito poderosa” que comporta “determinados riscos”, pelo que “é importante que tenha sinais de trânsito e que existam regras para ser usada, tal como quando estamos a conduzir um carro”, compara.

Texto de Mariana Jerónimo, editado por João Pedro Barros