Saúde

SNS não conseguiu responder às necessidades da população nos hospitais e nos cuidados primários

Utentes sem médico de família aumentaram e são também mais os doentes à espera de primeira consulta nas especialidades hospitalares.

Skaman306

Está cada vez mais limitado o acesso dos portugueses à rede pública de saúde. O ‘raio-X’ a 2023 feito pelo Conselho das Finanças Públicas mostra uma “saturação” na capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Os ‘sintomas’ evidentes são o aumento dos utentes sem médico de família, a redução das consultas nos cuidados primários, mais doentes em espera para primeira consulta com um especialista hospitalar ou para cirurgia e maior demora no atendimento nas urgências e na espera por uma vaga nos cuidados continuados.

O exame realizado levou os autores do relatório a fazerem um diagnóstico sem margem de erro: “Conclui-se que o nível de atividade do SNS foi insuficiente para fazer face às necessidades (crescentes) da população.” Dito de outra forma, o SNS está sem ‘fôlego’ e a consequência é direta para quem necessita de cuidados de saúde: um “aumento das necessidades de saúde por satisfazer” que, em 2019, já eram reportadas por 40% dos portugueses, ou seja, “o valor mais elevado da União Europeia”.  

16% sem médico de família 

A análise dos dados permite perceber que mesmo fazendo mais, e fez-se em algumas áreas, o SNS não consegue dar resposta a todos os que dela precisam. “O número de utentes aumentou para 10,6 milhões de inscritos, dos quais 1,7 milhões (16%) não tinham médico de família atribuído. Face a 2022, trata-se de mais 230 mil utentes nesta situação.” Como se não bastasse, “pelo segundo ano consecutivo, o volume total de consultas médicas realizadas nos cuidados primários diminuiu, apesar do aumento do número de utentes”. 

A redução das consultas de medicina geral e familiar é atribuída a uma quebra nas observações médicas não presenciais (menos 6,3%) e num aumento apenas “ligeiro” das consultas na presença do clínico (mais 0,8%). Feito o balanço, “o índice de utilização das consultas médicas apresentou valores inferiores a 2022, indicando uma redução da adequação do volume de consultas às necessidades dos utentes”. Em resumo: “Continuou a observar-se um desvio significativo entre a atividade realizada e a que seria necessária para satisfazer as necessidades da população.” 

“Aumento excessivo” das listas de espera  

Nos hospitais o esforço feito também ficou aquém do necessário. “O maior número de consultas médicas hospitalares face a 2022 (3,9%) e de cirurgias (7,7%) não foi suficiente para evitar o aumento expressivo do número de utentes em lista de espera para a primeira consulta em 2023”. No ano passado, foram mais 46% os portugueses a aguardar pela primeira consulta com um especialista hospitalar. E o cenário repetiu-se nas cirurgias, com mais 13% à espera de operação.  

Tempo de internamento com recorde da década  

O recurso à Urgência mudou menos, ou seja, manteve-se igualmente mau, e até com um agravamento ténue. “Nos episódios de urgência, o cumprimento dos tempos de triagem apenas aconteceu em 60% dos casos (61% em 2022).” E quem entrou no atendimento SOS e teve de ficar internado, também não viu melhoras: “Observou-se uma taxa média de ocupação de 91%, superior à taxa de 86% registada em 2022 e a maior dos últimos dez anos, englobando situações bastante discrepantes nas várias regiões do país.” 

Repetido como um dos graves constrangimentos da resposta hospitalar, o internamento social continua sem tratamento eficaz e com os doentes com alta clínica a ocuparem as camas nos hospitais. “Apesar de terem sido assistidos mais 1585 utentes face ao ano anterior, o número de utentes em lista de espera no final de 2023 era superior, situando-se em 1804.” Além disso, “o aumento de 317 lugares na Rede Nacional de Cuidados Continuados em 2023 resulta do aumento das respostas domiciliárias”, pois “as respostas que visam a institucionalização dos utentes diminuíram, existindo menos 17 camas de internamento face a 2022”.