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Justiça

O testamento envenenado de João Rendeiro

Banqueiro queria deixar dinheiro a amigos e ao canil da Murtosa, mas ninguém aceitou por causa das dívidas. O testamento foi mudado pela última vez a 7 de janeiro de 2021, um ano e meio antes de Rendeiro morrer

Rendeiro junto a obras de arte que tinha na casa da Quinta Patiño, ainda no tempo em que era um banqueiro de sucesso
Gonçalo Rosa da Silva

Quando entrou no discreto cartório notarial das Avenidas Novas, em Lisboa, João Rendeiro já era um homem condenado. O Tribunal da Relação de Lisboa tinha determinado uma pena de cinco anos e oito meses de prisão efetiva no caso das contas falsificadas para disfarçar prejuízos, e o fundador do Banco Privado Português sabia que a ida para a cadeia estava iminente. Talvez por isso tenha decidido anular um primeiro testamento, em que deixava tudo à mulher, Maria de Jesus, a herdeira universal que tem agora que lidar com um processo judicial em que é suspeita de descaminho das obras de arte arrestadas pelo Estado e que foram vendidas pelo marido ilegalmente.

Naquele dia 7 de janeiro de 2021, Rendeiro subiu até ao sétimo andar do edifício da Avenida 5 de Outubro e ditou a última vontade: Maria de Jesus continuava a herdar tudo, mas passou a haver um “mas”. No caso de a mulher com quem esteve casado mais de 50 anos “não lhe sobreviver”, ou mesmo no caso de “comoriência” (morrerem os dois ao mesmo tempo), passava a haver uma lista de herdeiros que ficariam com o dinheiro que sobrasse depois de todos os bens serem vendidos e todas as dívidas serem pagas.