Justiça

Megaoperação da PJ contra trabalho escravo no Alentejo faz 28 detidos

Operação Espelho contou com 480 operacionais da PJ e realizou-se em Cuba e Ferreira do Alentejo. Pelo menos cem vítimas foram identificadas. Grupo criminoso aliciou imigrantes nos seus países de origem, como a Roménia, Moldávia, Ucrânia, Índia, Senegal ou Paquistão. Os imigrantes viviam em barracões com casas de banho usadas por 20 pessoas

Uma das zonas do país com uma maior concentração de imigrantes é o Alentejo. Trabalham em estufas de frutos vermelhos, mas muitos vivem sem condições dignas e cuidados de saúde adequados
Luís Barra

A Unidade Nacional Contra Terrorismo (UNCT) da Polícia Judiciária avançou com uma megaoperação envolvendo 480 operacionais em várias localidades do Baixo Alentejo, como Cuba e Ferreira do Alentejo. Cumpriram 78 mandados de busca domiciliária e não domiciliária, e detiveram fora de flagrante delito 28 homens e mulheres. Pelo menos cem vítimas foram identificadas nas buscas.

Segundo a PJ, nesta Operação Espelho os suspeitos fazem parte de uma estrutura criminosa dedicada à exploração do trabalho de cidadãos imigrantes, na sua maioria, aliciados nos seus países de origem, tais como, Roménia, Moldávia, Ucrânia, Índia, Senegal, Paquistão, entre outros, para virem trabalhar em explorações agrícolas naquela região do nosso país.

De acordo com Manuela Santos, que lidera a UNCT, trata-se de dois inquéritos na mesma área geográfica, do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Évora.

O alvo foram “várias explorações agrícolas de grandes dimensões” onde trabalham e vivem dezenas de imigrantes a quem lhes são prometidos salários no país de origem que depois não correspondem à realidade. Além dos baixos ordenados, os imigrantes “acabam por pagar” despesas extras à organização que os trouxe para Portugal. É-lhes assim retirado ainda mais dinheiro, deixando as vítimas ainda mais pobres e fragilizadas.

A coordenadora da unidade de anti-terrorismo revelou em conferência de imprensa realizada na sede da PJ, em Lisboa, que os inspetores encontraram habitações “sobrelotadas”, com “condições deploráveis” e “sem o mínimo de higiene”. “Havia casas de banho usadas por 20 pessoas”, contou Manuela Santos.

A denúncia destes crimes de exploração partiu de pessoas que viviam perto daquelas propriedades e não das próprias vítimas, “uma vez que se encontram numa situação de grande fragilidade”. “As pessoas eram aliciadas por anúncios. Estamos a falar de uma zona [Alentejo] envelhecida e carenciada de recursos humanos”, justificou.

A inspetora disse ainda que os trabalhadores ganhavam entre 100 e 250 euros por mês, quando lhes prometiam “800, 900, mil ou mais”. Segundo a responsável, o que lhes explicavam é que a diferença “ficava retida” para pagamento do alojamento, alimentação e transporte.

Questionada sobre a forma de erradicar estes fenómenos criminais, Manuela Santos admitiu que tal “será muito difícil nos próximos anos, uma vez que é uma atividade que gera muitos lucros”. “Estas operações são uma pedrada no charco, mas não temos a pretensão de acabar com este fenómeno. Este fenómeno dificilmente será erradicado, principalmente nos próximos anos”, ressalvou.

Depois da operação, a PJ encaminhou 16 imigrantes para a Segurança Social, para “alojamento e apoio”. Também a Força Aérea deu apoio à Judiciária. Mas ao contrário de outras operações semelhantes, a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) não foi chamada ao terreno. “A decisão não foi só de não incluir a ACT, mas de todas as outras entidades, exceto a Segurança Social. As situações que hoje detetámos, serão oportunamente comunicadas às entidades competentes”, explicou ao Expresso Manuela Santos.

Os suspeitos, de nacionalidade portuguesa e estrangeira, encontram-se fortemente indiciados pela prática de crimes de associação criminosa, tráfico de pessoas, auxílio à imigração ilegal, angariação de mão-se-obra ilegal, extorsão, branqueamento de capitais, fraude fiscal, ofensas à integridade física, posse de arma de fogo e falsificação de documentos.

Em dezembro do ano passado, a UNCT tinha realizado uma operação igualmente de grandes dimensões contra o trabalho escravo no Baixo Alentejo. Manuela Santos referiu que esse inquérito está prestes a ser finalizado, até porque há arguidos em prisão preventiva e os prazos para a acusação estão a terminar.

[P.S. A fotografia que havia sido colocada para ilustrar a notícia nada tinha a ver com o artigo. A empresa em causa não tem qualquer tipo de envolvimento nas buscas realizadas no Baixo Alentejo]