Cerca de metade da população portuguesa está insatisfeita com a sua vida sexual e uma em cada três pessoas refere sofrimento psicológico associado a dificuldades sexuais, segundo um documento lançado esta segunda-feira pela Ordem dos Psicólogos com o objetivo de "sensibilizar e educar a população para a saúde sexual”.
No documento, intitulado “Vamos Falar Sobre Sexo, Sexualidade e Saúde Sexual”, são abordados os fatores que influenciam a sexualidade, a sua importância ao longo da vida, direitos sexuais e mitos comuns. É ainda incluída informação sobre infeções sexualmente transmissíveis, dificuldades e disfunções sexuais, e infertilidade, explicando causas e impactos.
De acordo com a Ordem dos Psicólogos, cerca de 30% dos homens e 40% das mulheres experienciam algum tipo de disfunção sexual, número que pode chegar aos 70% após os 65 anos. Entre os problemas mais reportados estão baixo desejo sexual (10,6%) e disfunção erétil (10,4%). Entre os homens é ainda apontada a ejaculação precoce (11,7%), enquanto as mulheres referem dificuldades em atingir o orgasmo (11,3%) e dor sexual (10,7%).
A Ordem (OPP) sublinha também que os casos de infeções sexualmente transmissíveis entre jovens portugueses “aumentaram 11 vezes entre 2013 e 2023” e recorda que “Portugal tem uma percentagem de casos de infeção HIV acima da média europeia”.
Exposição “precoce” a pornografia
No manual, a OPP mostra preocupação com a realidade dos mais novos: 40% dos rapazes e 26% das raparigas entre os 9 e os 16 anos já viram conteúdos sexuais online, muitas vezes de forma “indesejada”. E alerta para os riscos da “exposição precoce” à pornografia, que “pode levar a aprendizagens distorcidas sobre sexo, autoimagem, consentimento, prazer e relações", com “riscos futuros para a saúde e o bem-estar”.
O documento recorda ainda que “a saúde sexual é um direito” e que, para ser atingida e mantida, é necessário assegurar “o direito ao prazer e ao bem-estar sexual, à reprodução e à saúde reprodutiva, à orientação e à identidade sexual, e à educação sexual”, entre outros direitos.
Acrescenta que “a educação sexual deve ser abrangente e educar não só sobre os aspetos físicos da sexualidade, mas também sobre a autodeterminação sexual, a comunicação e o consentimento, a diversidade sexual ou a prevenção da violência sexual e de infeções sexualmente transmissíveis”.
Segundo a OPP, seis em cada dez pessoas enfrentam barreiras no acesso a cuidados de saúde sexual, sendo os custos elevados (26%) e as longas listas de espera (25%) os obstáculos mais comuns. O documento acrescenta ainda que uma em cada sete mulheres e um em cada 25 homens já foi vítima de violência sexual.
A Ordem lembra que a sexualidade “não é estática, mas evolui ao longo das diferentes fases da nossa vida, refletindo mudanças físicas e psicológicas, experiências e relações com as outras pessoas”. É também influenciada "pela família, pelas pessoas à nossa volta e pelos media, que moldam perceções sobre o que é ‘certo’ ou ‘errado’, ‘normal’ ou ‘aceitável’ em relação ao corpo, ao desejo, ao prazer e às relações”.
Por isso, sublinha, “compreender como a nossa sexualidade se desenvolve ao longo da vida é essencial para cuidarmos da saúde sexual de forma positiva e informada”.
OPP quer saúde sexual nos planos nacionais, nas escolas e nos locais de trabalho
Noutro documento, também divulgado esta segunda-feira, a OPP apresenta recomendações para políticas públicas. Defende que a saúde sexual deve ser integrada nos planos nacionais de saúde e nas políticas de saúde pública, psicológica, reprodutiva e de igualdade de género, com “definição e monitorização de indicadores específicos”. Apela ainda à promoção da literacia em saúde sexual, através de programas em todos os ciclos de ensino e campanhas públicas que “valorizem o prazer, o consentimento, a diversidade e a prevenção da violência”.
A Ordem recomenda igualmente garantir o acesso a cuidados especializados nos centros de saúde, com articulação entre várias especialidades e “ambientes seguros e afirmativos, sobretudo para populações mais vulneráveis”.
Sublinha também a importância de criar “locais de trabalho saudáveis”, com políticas de prevenção contra assédio e discriminação, e de garantir condições para o exercício de direitos como a parentalidade, a amamentação, o planeamento familiar, a interrupção voluntária da gravidez ou o acompanhamento em consultas de saúde sexual e reprodutiva.
Por fim, propõe reforçar a formação em saúde sexual nos currículos das áreas da saúde, psicologia, serviço social e educação, bem como formação contínua para profissionais que trabalham com populações vulneráveis.