A audiência de João Rendeiro no tribunal de Verulam, em Durban, na África do Sul, começou com seis horas de atraso.
O juiz adiou a discussão do processo de extradição do ex-banqueiro e decidiu que este só começará a ser debatido entre 13 e 30 de junho, altura em que serão ouvidas testemunhas da defesa e do Ministério Público.
Na curta sessão desta quinta-feira, o procurador do MP revelou que a documentação sobre o processo de extradição de João Rendeiro enviada por Portugal por via diplomática chegou à embaixada portuguesa na África do Sul em bom estado com o selo intacto e que não foi retirada qualquer documentação das referidas provas. O MP solicitou a Portugal uma prova da autenticidade dos documentos, defendendo que a documentação deve ser devolvida às autoridades portuguesas que deverão selar a versão em português e em inglês. E pediu a manutenção da prisão de João Rendeiro.
O juiz decidiu que as provas que tinham sido enviadas por Portugal serão devolvidas às autoridades portuguesas para que estas confirmem a veracidade desses documentos e se há algo em falta. E que pelo facto do selo da versão em português estar danificado não foi possível aceitar uma parte dessas provas por este tribunal sul-africano. Tendo por isso ficado adiada a sessão desta quinta-feira já que a danificação do selo poderia colocar em causa o processo.
O juiz marcou outra sessão para 20 de maio, de modo ao tribunal voltar a analisar os documentos entretanto enviados por Portugal e preparar o julgamento sobre o processo de extradição em junho. Até essa data, Rendeiro deverá ficar detido.
No final da sessão, a porta voz do Ministério Público explicou que os documentos sobre o processo de extradição serão enviados para Portugal já selados e que o problema com o selo danificado da versão em português esteve relacionado com o seu transporte para a África do Sul.
O ex-banqueiro encontra-se a cumprir prisão preventiva na cadeia de Westville há mais de um mês. Segundo June Marks, a advogada de Rendeiro, haverá uma reavaliação das medidas de coação em fevereiro. Nessa altura, a defesa irá pedir a libertação de Rendeiro sob fiança, tal como o fez no início do processo logo após a detenção do ex-banqueiro em dezembro.
Há uma semana, na sessão anterior, o juiz analisou os documentos do processo de extradição, que se encontravam numa caixa de cartão, enviados pela Justiça portuguesa para Durban há duas semanas. A Procuradoria-Geral da República enviou o processo por via diplomática para a África do Sul, ainda antes de se extinguir o prazo de 40 dias que prevê a Convenção Europeia neste tipo de casos. “Há dois conjuntos de documentação. O selo da versão portuguesa está danificado, algo contrário da versão inglesa cujo selo está intacto. Esta questão pode ser considerada um problema”, disse o juiz.
Rendeiro não quer regressar a Portugal
A porta-voz do Ministério Público sul africano garantiu que as autoridades judiciais sul-africanas iriam analisar as condições da selagem dos documentos em português e tentar perceber as razões dessa danificação. Os documentos judiciais terão de ser comparados com a versão inglesa para garantir que não houve adulterações. Também em Portugal será verificado se toda a documentação em português foi enviada para Durban.
June Marks sublinhou que “não é necessário” solicitar um inquérito sobre uma eventual violação da documentação selada.
Rendeiro já fez saber que não pretende vir para Portugal para cumprir a pena de cinco anos e oito meses de prisão a que foi condenado, numa decisão que já não é passível de recurso, e que vai ter lugar com todos os meios disponíveis para se opor a essa extradição, podendo os recursos chegar ao Tribunal Constitucional sul-africano.
Durante o decorrer do julgamento, a Procuradoria-Geral da República vai enviar dois procuradores portugueses para ajudarem os seus colegas sul-africanos. A delegação de procuradores será composta por José Góis, que representou o MP no único julgamento em que Rendeiro foi absolvido, e Joana Gomes Ferreira, especialista em cooperação internacional e que preparou o dossiê para enviar para o tribunal de Verulam. “A ideia é que o apoio seja prestado se o arguido se opuser à extradição”, explica uma fonte judicial.
Defesa quer libertação sob fiança
Paralelamente à extradição, a equipa de June Marks recorreu para o Supremo Tribunal da África do Sul para contestar a recusa do juiz da primeira instância em libertar o português sob uma fiança de 40 mil rands (cerca de €2190), colocando-o em prisão preventiva. A defesa garantiu ao Supremo que Rendeiro não iria voltar a fugir à Justiça e aproveitou para atacar o magistrado do tribunal de Verulam por ter colocado Rendeiro na prisão por pressão da opinião pública e da comunicação social portuguesa. Mas ainda não houve resposta daquele tribunal superior.
Rendeiro fugiu à Justiça portuguesa em setembro do ano passado, logo depois de ser conhecida a decisão transitada em julgado que o condenou a cinco anos e oito meses de prisão pelos crimes de falsidade informática e falsificação de documentos. Há ainda outras duas condenações judiciais contra o ex-banqueiro, também elas relacionadas com o colapso do BPP, tendo o tribunal dado como provado que retirou do banco €13,61 milhões, prejudicando seis mil clientes, que reclamam €1,6 mil milhões ao banco falido.
Depois de quase três meses em fuga, o ex-dono do BPP foi apanhado num hotel de luxo em Durban a 11 de dezembro do ano passado, depois de uma operação de grandes dimensões da Polícia Judiciária portuguesa que contou com o apoio da polícia sul-africana. Atualmente, o ex-banqueiro é alvo de quatro mandados de detenção internacionais.
A defesa de Rendeiro enviou entretanto uma queixa para as Nações Unidas sobre a falta de condições de higiene e segurança da cadeia de Westville, onde está detido preventivamente há 40 dias.