Quem olhar para o Alexandre Kulcinskaia – quase uma vida inteira a lutar contra o excesso de peso – não adivinha o mau garfo que ele é: “Odeio comer, sou muito esquisito”. A ponto de não saber indicar um prato preferido quando lhe pedem para eleger uma receita que seja a exceção. “A questão é essa, não há”, responde com uma pequena gargalhada.
Sempre se lembra de ter sido assim. “Qualquer gordo lhe dirá que não come assim tanto que justifique os quilos a mais”, começa por dizer Alexandre, mas a verdade é que no seu caso o peso foi subindo sem qualquer evidência de haver relação com o que comia. “Comecei a engordar aí a partir dos seis ou sete anos, mas durante muito tempo isso nem sequer foi um problema”, recorda. Terá começado a ganhar consciência de que era obeso quando na escola foram surgindo alguns comentários de colegas, mas o olhar dos outros nunca o afetou particularmente. “Eu tinha peso a mais, mas outros usavam óculos ou tinham sinais no nariz... Gozaram certamente comigo, mas nunca me senti mal por causa disso, nunca fui a chorar para casa, porque simplesmente o que diziam não me incomodava”.
Durante muito tempo encarou o seu peso como “natural”. Alexandre diz que nunca se privou de nada por causa do físico XL – “nunca deixei de ir à praia ou de sair com os amigos” -, foi um adolescente com nota 16 a Educação Física e garante ter chegado aos 256 quilos sem nenhum dos problemas de saúde associados à obesidade, seja diabetes, hipertensão ou complicações cardíacas. Mas a perspetiva mudou quando, aos 17 anos, passou a ser seguido no Hospital Egas Moniz (encaminhado por uma médica do centro de saúde). Ouvir dizer que podia não chegar aos 40 anos foi um abanão. “Pareceu-me cedo para desaparecer”, diz. Focou-se então no objetivo de perder peso, para agora já com os tais 40 anos estabilizar nos 140 quilos, depois de uma cirurgia para colocação de uma banda gástrica. Casado e com dois filhos, espera manter uma boa relação com a balança.
Mensagens “pela positiva”
Alexandre é uma das pessoas que aceitou dar a cara pela campanha lançada internacionalmente esta quinta-feira pela European Coalition for People living with Obesity (ECPO), que tem como objetivo ajudar a combater o estigma e mudar a atitude das pessoas em relação ao excesso de peso e à obesidade. Como Marisa Marques, a outra portuguesa fotografada para o banco de imagens europeu criado pela ECPO, sabe que pedir ajuda e receber o tratamento e acompanhamento que necessita foi o caminho para garantir uma melhor qualidade de vida, e fez-lhe sentido participar ao ser desafiado pela Associação Portuguesa Contra a Obesidade Infantil (APCOI), por conhecer o trabalho desta associação e saber que estão no terreno com “mensagens pela positiva”. “Apostam na prevenção, sem o discurso da culpa, que é o mais habitual”, conclui.