Sociedade

Motoristas obrigam Governo a chamar Antram a jogo

"O melhor caminho será recorrer à mediação do Governo", disse o presidente do Sindicato dos Motoristas, Francisco São Bento, no final da reunião no ministério do Trabalho. A resposta demorou poucos minutos, pela voz do secretário de Estado Miguel Cabrita: "O Governo fá-lo-á de imediato, para que amanhã a Antram possa ser contactada".

A tentativa dos motoristas em greve de fazerem a associação patronal, a Antram, sentar-se à mesa na tarde desta quinta-feira saiu gorada, mas no rescaldo da reunião a batata quente para tentar ultrapassar o conflito passou para o Governo.

Fazendo uso de um direito previsto da legislação laboral, como explicaria o secretário de Estado do Trabalho, Miguel Cabrita, o Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) solicitou na reunião desta quinta-feira a nomeação de um "mediador" para o braço-de-ferro com a Antram.

"Compete ao Governo trazer a Antram para a mesa da negociações", afirmou o presidente do SNMMP, Francisco São Bento, no final da reunião mantida nos serviços do ministério do Trabalho (Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho).

Poucos minutos volvidos, Miguel Cabrita deu a resposta: "O Governo fá-lo-á de imediato, para que amanhã a Antram possa ser contactada". O secretário de Estado lembrou que o mecanismo fora posto à disposição dos interesses em confronto há uma semana e garantiu que o Governo irá agora agir "com toda a celeridade". Mas não se comprometeu com qualquer prazo para uma eventual fim do problema: "O tempo que a greve poderá durar só as partes o podem dizer, e [especialmente] quem convocou a greve", advertiu.

A colocação da batuta para a resolução deste processo nas mãos de um "mediador" (será alguém habilitado a desempenhar tal função, procedente da 'bolsa' de especialistas daquela Direção-Geral) é um "passo gigantesco" neste processo, segundo fonte que acompanha as negociações. Mas está longe de constituir qualquer garantia de que o conflito irá terminar rapidamente.

Com efeito, tendo sido claros no pedido da mediação, os motoristas não o foram menos na garantia de que manterão a forma de luta em curso. "A greve vai continuar a decorrer", disse Pedro Pardal Henriques, o advogado que é assessor jurídico do SNMMP.

Ora, foi precisamente o facto de a greve continuar que a Antram invocou para não ter comparecido na reunião desta quinta-feira, marcada na véspera pelo sindicato, que desafiara os patrões a sentarem-se à mesa.

A Antram fizera entretanto saber que não estaria presente, e manteve a palavra mesmo depois da iniciativa do SNMMP, que se fez acompanhar por um elemento externo aos seus órgãos sociais (o sindicalista Bruno Fialho, dirigente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil).

Fialho assumiu-se como um mediator externo que os motoristas nomearam para tentar "desbloquear" o impasse nas negociações com a Antram. "Um amigo e consultor que nos acompanhou e veio dar o seu contributo", disse Francisco São Bento.

A presença de Fialho (e a ponte que ela poderia representar) foi, contudo, insuficiente para levar a Antram a abrir mão da questão de princípio, que desde há muito tem proclamado: não negoceia enquanto tiver "uma espada sobre a cabeça". Isto é, na vigência de uma greve.

Agora, a questão muda de feição. Até por implicações legais. O mediador oficial irá contactar a Antram, pois isso decorre das suas competências formais.

Questionado pelos jornalistas se o SNMMP (a mais expressiva das duas estruturas sindicais em greve) não está a arrepiar caminho ao defender agora o que antes recusara (a mediação), São Bento disse que esta será feita "em outros moldes". Mais adiante, desvendou quais serão: "A presença do Governo fará com que a Antram não negoceie connosco".

Ou seja, o mediador reunir-se-á à vez com cada uma das partes. Eis a grande dúvida: recusando quando o interlocutor direto é o sindicato que tem como principal rosto o advogado Pardal Henriques, aceitará a Antram reuniões bilaterais com um mediador nomeado pelo Governo enquanto se mantém a greve?