Sociedade

Depois de fechar os olhos, Federação Académica do Porto impõe “tolerância zero” a desmandos na Queima das Fitas 

Após a divulgação nas redes sociais de cenas de cariz sexista, a Federação Académica do Porto obrigou os autores dos vídeos que registam comportamentos indignos a apagar as imagens e fechou temporariamente as barracas de venda de bebidas alcoólicas que ostentavam mensagens indignas ou incitadoras de violência sexual ou de género

Depois de há dois anos uma rapariga alcoolizada e incapaz de opor resistência ter sido filmada num autocarro a ser abusada sexualmente, os desmandos e comportamentos aviltantes voltaram a marcar as noites da Queima das Fitas do Porto, a decorrer, desde sábado, no Queimódromo, um espaço adjacente ao Parque da Cidade e cedido, “gratuitamente”, à Federação Académica do Porto (FAP), no âmbito de um protocolo aprovado por “unanimidade” por todas as forças políticas representadas no executivo municipal.

“Os termos de cedência são semelhantes aos praticados há mais de 12 anos pela Câmara do Porto que, na primeira década deste século, fez as infra-estruturas e o espaço para receber eventos”, refere fonte do Gabinete de Comunicação da autarquia, sublinhando que, a partir em que o recinto é cedido ou alugado, cabe ao organizador dos festejos, neste caso FAP, e às forças policiais zelarem pelos comportamentos e ordem no recinto.

Tal como sucedeu em 2017, os dirigentes da FAP voltam a reagir, em vez de prevenir, aos desmandos habituais da semana das Queimas das Fitas, encerrado temporariamente, como castigo, barracas de venda de bebidas alcoólicas, batizadas com alusões de cariz sexual, como 'Mamaki ou 'ApitaDelas', e ainda as que ”promovam mensagens menorizam as mulheres e atentam contra a igualdade de género”.

“Obviamente, a FAP condena estes excessos cívicos e todas as barracas identificadas com comportamentos impróprios serão fechadas um ou dois dias, consoante a gravidade das suas práticas”, afirmou ao Expresso Maria Maia, da direção da FAP, garantindo que “este de situações são pontuais, não um reflexo do evento, que é uma celebração dos estudantes ao final do ano letivo ou de curso”.

Após a divulgação de vídeos em que raparigas exibem os seios como bandeja para servir shots ou em troca de bebidas grátis, a federação académica que agrega 27 associações de estudantes de instituições do Ensino Superior do Grande Porto correu atrás do prejuízo, decretando, em comunicado, “tolerância zero” aos abusos. “A FAP é completamente contra qualquer tipo de violência sexual, violência de género e violência física, ou de qualquer outra ordem. De forma a tentar prevenir situações desta natureza, decidiu aliar-se ao Ponto Lilás - uma iniciativa que prevê ações de prevenção de comportamentos de risco e de ações de sensibilização para uma maior responsabilização social - sendo esta ação conjunta pioneira em Portugal”, refere em comunicado a FAP.

A organizadora do evento afiança ainda que, depois de observar a captação de imagens de comportamentos indevidos - “na sua grande maioria até mesmo indignos” -, e que atentam “em muitas das vezes contra o respeito pelos valores humanos, e a sua posterior divulgação por parte das barracas dentro do recinto, achou necessário proibir que tais situações continuassem a acontecer”.

Cinco dias após o início da Queima, a FAP deixou, por isso, o aviso que todas “barraquinhas” que “promovam o discurso do ódio ou incentivo a qualquer tipo de violência” ou utilizam imagens/escrita sexista serão “devidamente” sancionadas.

Instituições de ensino não se intrometem

As faculdades e instituições de ensino superior, público ou privado, cujas associações de estudantes integram a FAP alegam que o que se passa nas Queima das Fitas do Porto é da responsabilidade da organização que representa as associações de estudantes, uma vez que não atribuem qualquer tipo de apoio aos festejos, além de que os desmandos verificados acontecem fora dos 'campus' universitários.

Esta é a posição da Universidade do Porto, que lembra que há vários anos proibiu mesmo as praxes académicas. Já a Universidade Portucalense remete qualquer questão sobre o assunto para a organizadora do evento e para o comunicado da FAP, reiterando o “apoio a essa posição”. A Católica do Porto repudia, por sua vez, qualquer tipo de manifestação de violência em qualquer contexto, defendendo uma academia responsável e exigente: “A Queima das Fitas é uma organização de estudantes, a qual respeitamos e que esperamos que seja uma oportunidade de expressão académica de modo responsável e respeitador de todos”.

Também o ISCAP (Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto) “entende não ser este um assunto da sua competência”, enquanto o ISEP (Instituto Superior de Engenharia do Porto, onde estuda Mecânica o presidente da FAP, João Pedro Videira, optou por não responder ao Expresso.