Sociedade

O túnel de 100 km que vai revelar mais segredos da matéria e do Universo

O Futuro Colisor Circular é o novo megaprojeto de acelerador de partículas do CERN

Jaime Figueiredo

Já envolveu 1300 investigadores de 150 universidades, vai custar €24 mil milhões e entra em pleno funcionamento em 2050. Chama-se Futuro Colisor Circular (FCC), terá um gigantesco túnel circular de 100 km localizado em Genebra, na Suíça, e é o novo megaprojeto de acelerador de partículas da Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (CERN).

A grande ambição do CERN é descobrir novas partículas subatómicas, uma nova física, que conduzam à mítica Teoria de Tudo, que possa juntar todas as forças da Natureza e unificar os dois grandes pilares da física: a Teoria da Relatividade Geral de Einstein e a Mecânica Quântica. O FCC será o sucessor do LHC, o acelerador de partículas do CERN conhecido por Grande Colisor de Hadrões, que detetou pela primeira vez o Bosão de Higgs em 2012, graças ao seu túnel circular de 27 km de comprimento enterrado a 175 metros de profundidade em Genebra. Com esta deteção, pareceu ficar completo o chamado Modelo-Padrão da teoria da física subatómica. O comportamento da matéria e das forças que a governam estavam finalmente explicados através da interação de uma família de 17 partículas subatómicas, e a cereja no topo do bolo foi precisamente o Bosão de Higgs, previsto no próprio Modelo-Padrão.

Este modelo descreve as interações nucleares forte, fraca e eletromagnética que medeiam a dinâmica das partículas subatómicas conhecidas. Mas não consegue explicar tudo o que se passa no mundo da física. Como na altura foi dito pelo CERN, depois da descoberta do Bosão de Higgs, falta ainda conhecer 96% do Universo, como as misteriosas matéria e energia escuras, que não são detetadas diretamente por nenhuma máquina humana terrestre ou espacial mas têm uma influência decisiva no comportamento do Cosmos. Por outro lado, a expansão do Universo está a acelerar em vez de abrandar. E as galáxias estão a rodar mais depressa do que o previsto.

Quando se passa da escala subatómica para a escala astronómica, o Modelo-Padrão não consegue, simplesmente, explicar uma das forças do Universo: a gravidade. Não há uma Teoria de Tudo, uma teoria quântica da gravidade. E a matéria e a energia escuras são os elementos que faltam, à macroescala, para explicar a origem do Universo, tal como o Bosão de Higgs era a peça que faltava ao Modelo-Padrão da física de partículas, à microescala, para explicar a origem da matéria.

Dez vezes mais poderoso

O acelerador de partículas LHC já não chega para a ciência avançar. É preciso uma nova máquina quatro vezes mais comprida e dez vezes mais poderosa em termos de energia, o FCC. Um comunicado do LIP — Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas, que assegura a participação portuguesa nos projetos do CERN, sublinha que o FCC será “uma poderosa fábrica de bosões de Higgs” e tornará possível “detetar processos novos e raros, e medir as propriedades de partículas já conhecidas com uma precisão nunca antes alcançada”. Com tal precisão, “quaisquer desvios em relação às previsões do Modelo-Padrão seriam um sinal de nova física”.

O LIP acrescenta que “as oportunidades de descoberta são enormes, do conhecimento detalhado do Bosão de Higgs à compreensão da história do Universo e à procura de novas partículas e interações”. Frédérik Bordry, diretor de Aceleradores do CERN, admite que o FCC “beneficiaria a comunidade de física de partículas durante todo o século XXI”. E Fabiola Gianotti, diretora-geral do CERN, assinala “o enorme potencial do FCC para melhorar o nosso conhecimento da física fundamental e desenvolver muitas tecnologias com amplo impacto na sociedade”.