orquê escrever a “vida secreta” de John le Carré? Será correto tornar públicos aspetos da sua vida que se esforçou tanto para esconder? Ao escrever “A Vida Secreta de John le Carré”, sabia que alguns poderiam considerar o assunto lascivo. E, até certo ponto, aceito a crítica. Se fosse apenas uma exposição do adultério, então, ler a biografia não seria muito diferente do voyeurismo. Mas no caso de John le Carré, cujo verdadeiro nome era David Cornwell, a sua busca incessante por mulheres era uma chave para desvendar a sua ficção. Não só ajuda a explicar a sua obra, mas também a explicar como, porquê e quando a escreveu. O próprio David foi explícito neste ponto. “As minhas infidelidades”, escreveu-me numa altura em que, para melhor ou para pior, a questão tinha vindo a dominar as nossas conversas, “davam à minha vida uma dualidade e uma tensão que se tornou quase uma droga necessária para a minha escrita, uma espécie de precipício perigoso... Logo, não são uma ‘parte sombria’ da minha vida, separada da ‘grande vocação literária’, por assim dizer, mas, infelizmente, uma parte integrante e inseparável”.
No entanto, limitou o que eu podia escrever sobre os seus casos extraconjugais enquanto fosse vivo. O que escrevi na biografia de John le Carré, publicada em 2015, foi a verdade, segundo apurei, mas não toda a verdade. Enquanto o David fosse vivo, estava obrigado a esconder algumas coisas que sabia.