Política

Entrevista de Lucília Gago à RTP "é um comportamento muito estranho", "um desprezo pelo Parlamento"

Lucília Gago “vai dar uma entrevista depois de ter dito que ia ao Parlamento só depois de terminar o relatório de atividades [do Ministério Público]?”. Comentador da SIC diz que Procuradora Geral da República revela “desprezo pelo Parlamento”

A entrevista que a Procuradora-Geral da República (PGR), Lucília Gago, vai conceder na noite desta segunda-feira à RTP revela um “comportamento muito estranho”, considerou Luís Marques Mendes no seu habitual espaço de comentário semanal na SIC e na SIC Notícias.

Sem por em causa o direito da PGR dar uma entrevista, questionou, no entanto, o sentido de oportunidade. “Vai dar uma entrevista depois de ter dito que ia ao Parlamento só depois de terminar o relatório de atividades [do Ministério Público]?”. Uma atitude que, na sua perspetiva, revela “desprezo pelo Parlamento”.

Recorde-se que Lucília Gago foi convocada pelo Bloco de Esquerda (BE) e pelo PAN a prestar esclarecimentos no Parlamento sobre o relatório anual de atividades do Ministério Público (MP), mas pediu um adiamento de “escassas semanas” para o finalizar. Um dia depois da audição de Lucília Gago ter sido aprovada no Parlamento, o procurador da Operação Marquês, Rosário Teixeira, declarava no Jornal da Noite e na SIC Notícias que o MP não tem interesse em derrubar Governos e que António Costa não é suspeito, porque uma pessoa suspeita “não pode deixar de ser constituída arguida”.

O Bloco de Esquerda (BE), um dos proponentes do requerimento, lamentou esta sexta-feira ao Expresso o pedido de adiamento da audição por parte da PGR, “a pretexto de estar a terminar o relatório que deveria ter sido entregue em maio”.

Orçamento será “aprovado”. “O que temos agora é uma encenação”

Questionado sobre se o Orçamento de Estado para 2025 será viabilizado, Marques Mendes deixou uma certeza quase absoluta: “O Orçamento vai ser aprovado”.

“Tenho praticamente a certeza. É do interesse de todos: Governo, autarcas, Partido Socialista (PS), portugueses. E quando é do interesse de todos, os líderes políticos não vão ser irracionais, não vão fazer suicídio político. O que temos agora é ruído político, passa culpas: o Governo dirá que, se houver crise, a culpa é do PS; o PS responderá que a responsabilidade é do Governo. Mas é uma encenação, em grande medida, e anima a bolha político-mediática. As pessoas devem dar um grande desconto. Ninguém quer uma crise e não vai haver crise.”

De acordo com o comentador da SIC, o Governo e o PS vão acabar “a negociar o Orçamento ou partes do Orçamento”. “O Governo não tem alternativa, porque é minoritário. E Montenegro neste momento tem uma vantagem: está em alta, pela ação do Governo e pelo apoio a António Costa. O PS também não tem alternativa. De outra forma, gera divisões internas e fica responsável pela crise. E ao PS dá-lhe mais jeito ter primeiro as eleições autárquicas…”

Já sobre o pacote de 60 medidas apresentado pelo Governo e aprovado esta quinta-feira em Conselho de Ministros, Marques Mendes, antigo líder do PSD, tem uma avaliação positiva. “É um pacote com ambição, muito bem estruturado, com visão estratégica e sentido de exigência”, realça. “A questão é outra: é preciso que seja bem executado”, acrescenta, sublinhando que o mais importante deste pacote é “a preocupação em criar novas oportunidades na economia portuguesa e tentar estancar a perda de pessoas, nomeadamente jovens talentos, para o estrangeiro (emigração)”.

Marques Mendes destaca os incentivos às pequenas e médias empresas (PME) para fusões, de modo a tornarem-se “mais competitivas, terem escala e dimensão para competir lá fora”, e a redução gradual do IRC para 15% até 2027. “Se isso acontecer, já não vamos perder em competitividade com os países de Leste, que atraem mais investimento… O IRC não é o imposto dos patrões, pode ajudar a atrair mais investimento e a aumentar salários.”

“Desorientações” em Ventura e no Chega

Sobre a ida dos polícias ao Parlamento, Marques Mendes considera que “este episódio correu mal para o Chega”. Apesar de considerar André Ventura “um líder inteligente e com muito talento político” (“goste-se dele ou não”), acredita que ele “cometeu um erro e um flop, ao tentar instrumentalizar os polícias”. “Um erro, porque um partido de direita é, por norma, um partido adepto da ordem e da autoridade; não convida os polícias à desordem”, explica. “Um flop, porque os sindicatos demarcaram-se de Ventura e deixaram-no sozinho. Tudo lhe correu mal.”

Para o comentador da SIC, desde 10 de março que o Chega entrou em “desorientação política”. “As desorientações em Ventura e no Chega começaram logo na formação do Governo, que não conseguiu influenciar; seguiram com a eleição do presidente da AR; e teve uma pesada derrota nas europeias, da qual ainda não recuperou.”

Ainda assim, considera que o primeiro erro nesta matéria foi do Governo de António Costa. “Sempre chamei a isto um berbicacho, Costa criou um problema de outro mundo”, afirma. “Ele não tinha direito de fazer um suplemento para a PJ, que era justo, sem acautelar a PSP e a GNR. Não ia haver dinheiro para tudo. Por isso digo que todos têm razão: os polícias têm razão em quererem mais, o Governo em dizer que não tem mais folga. A oposição também criou muitas expetativas, é verdade. Mas, em primeiro lugar, quem teve culpa foi António Costa.”