Na primeira audiência formal com o Presidente da República na qualidade de novo secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos quis vincar que não vai alinhar no discurso que muitos socialistas - incluindo António Costa - têm feito de culpabilização de Marcelo Rebelo de Sousa pela crise política, e que não tem qualquer intenção de cavalgar tensões com o Presidente, como António Costa chegou a fazer na reta final da coabitação.
“Temos de separar o que é a opinião de militantes e até dirigentes do PS, com a posição institucional do PS. Durante o congresso, tive o cuidado de preservar a minha relação enquanto secretário-geral do PS com o Presidente da República, e fazemos ponto de honra nisso”, disse no final da audiência, quando questionado pelos jornalistas sobre o tom crítico face ao PR de muitas intervenções no congresso socialista. A seu lado tinha Carlos César, reeleito presidente do PS, e um dos socialistas mais críticos de Marcelo.
“Tivemos a oportunidade de reafirmar a vontade do PS e da atual liderança do PS em promover uma boa relação institucional com o Presidente da República, uma muito boa relação com a Presidência da República, porque entendemos que é fundamental para o bom funcionamento da democracia um bom relacionamento entre a liderança do maior partido português e o senhor PR. Este é um ponto importante para nós”, vincou o novo líder socialista.
Para Pedro Nuno Santos, que nunca alinhou nas críticas a Marcelo na sequência da crise política recente, a decisão do Presidente de convocar eleições foi tomada, “ponto final”. “Não estamos sempre a revisitar as decisões que o PR foi tomando. O governo fez uma proposta, o PR teve um entendimento diferente, assunto encerrado”, disse, afirmando que é aconselhável que se “desdramatize” e “tire peso” às diferenças de opinião que vão sempre existir entre PR e Governo, sejam quais forem os Presidentes e os governos.
“É normal que, ao longo de tanto tempo, e depois de uma convivência prolongada, haja pontos de vista diferentes em várias matérias, isso faz parte da vida democrática. E não é sequer uma característica desta Presidência da República e deste Governo em particular. Ao longo da nossa história tivemos presidentes e governos que tiveram posições diferentes, temos de lhe retirar o peso e a carga que alguns têm sistematicamente colocado sobre as relações entre o Presidente e o Governo”, pediu.
Não revelar o conteúdo da conversa foi outro ‘ponto de honra’ que disse ter de fazer - e pediu “disciplina” nesse sentido. “Temos de nos manter disciplinados por respeito com o PR e para garantir que futuras conversas possam ser tidas com toda a liberdade”, disse. No passado recente, ficou célebre a picardia entre António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa por causa de eventuais fugas de informação decorrentes das reuniões privadas do Conselho de Estado, tendo o primeiro-ministro chegado a optar por ficar em silêncio numa reunião naquilo que foi entendido como uma espécie de protesto.
“Falamos sobre o país e sobre a nossa visão, sobre a situação política, mas não queria dar detalhes sobre conversa que tivemos. É importante mantermos disciplina sobre estas conversas”, insistiu, recusando “dar conselhos” ao Presidente sobre a forma como deve encarar a configuração parlamentar e as futuras soluções governativas que saiam do pós-10 de março.
TGV era um “tabu”. Pedro Nuno puxa louros para si
Questionado sobre o lançamento do concurso para a linha de alta velocidade, e sobre o facto de não o ter feito quando ainda era ministro com aquela tutela, Pedro Nuno Santos chamou a si os louros disso mesmo. “O projeto foi apresentado comigo no Governo, foi todo preparado comigo como ministro, mas os processos levam tempo”, disse em respostas aos jornalistas, rejeitando a tese de que, como o governo governou oito anos tinha a obrigação de ter resolvido todos os problemas. “A vida não funciona assim, há sempre novos problemas”, disse.
“Em matéria de ferrovia, a alta velocidade era um tabu, ninguém falava de alta velocidade, era impensável, não era esse o projeto para a ligação Lisboa-Porto. Mas foi comigo como ministro que recuperámos este projeto”, disse.
À semelhança do que tem feito António Costa, e apesar de já ter falhado uma candidatura europeia no passado, Pedro Nuno defendeu que agora é que há condições para lançar o concurso. “Há um programa europeu que permite financiar a obra, e esperamos que o governo avance com o concurso porque isso dará mais possibilidades à candidatura portuguesa para conseguir os fundos”, disse. Concurso esse que, quando era ministro, não lançou e, por isso, o projeto português não foi considerado “maduro” o suficiente para ter acesso àqueles fundos.