Sem quebrar totalmente o tabu sobre acordos pós-eleitorais com o PS, Mariana Mortágua parece ter diminuido o nevoeiro quanto a novos entendimentos à esquerda. “O Bloco vai promover a confluência de toda a força necessária para a viragem que país tem de fazer. Da minha parte, aproveitarei este tempo [até março] para abrir caminhos de diálogo, de clareza, de mobilização”, assumiu a líder bloquista na mensagem de Ano Novo do partido. Para que esta “confluência” resulte num acordo de governação à esquerda, são lançadas duas condições: uma maioria com um “programa para Portugal” e um Governo que dê “certeza de o aplicar”. Ficam por saber que medidas os bloquistas vão exigir inserir neste programa e se um executivo que dê “certeza” terá ou não de incluir nomes do partido liderado por Mortágua.
Até aqui, a coordenadora do Bloco desviou as perguntas sobre acordos pós-eleitorais e preferiu apelar a um reforço isolado do partido. O objetivo seria conseguir um bom resultado eleitoral que lhes conferisse maior peso nas mesas das negociações com o PS, no cenário de Pedro Nuno Santos ganhar as eleições sem maioria. A pouco mais de 70 dias da ida às urnas, Mariana Mortágua preferiu começar a mudar de estratégia e aumentar a pressão sobre o PS. “Nenhuma maioria é estável com um mero somatório de deputados. Uma maioria tem de ser um programa para Portugal e um Governo que dê a certeza de o aplicar”, disse num aviso dirigido a Pedro Nuno Santos. Assim, os bloquistas passam a bola ao novo líder do PS que deverá mostrar se está ou não disponível para cumprir estas exigências.
Na mensagem de Ano Novo, Mariana Mortágua enumerou também alguns dos temas que o seu partido deverá insistir para que façam parte do “programa” num futuro acordo à esquerda. “Seremos a garantia de que se fará o que nunca foi feito: subir salários, empregos para o clima, salvar o Serviço Nacional de Saúde, cuidar da escola pública, baixar preço das casas”. Para garantir que o próximo Governo avança com propostas do Bloco nestas áreas, é provável que o partido lute por um acordo escrito com o PS – algo que aconteceu em 2015, mas não em 2019 por vontade do PS e PCP. Contudo, a margem de negociação dependerá sempre do número de votos que os bloquistas consigam reunir.