Política

PSD, IL e Chega aplaudem veto de Marcelo. Montenegro desafia Governo “a começar do zero”, PCP e BE criticam pacote

PSD, IL e Chega saúdam o veto de Marcelo e reiteram críticas ao programa “Mais Habitação”. Luís Montenegro pede mesmo ao Executivo para “rasgar” o pacote e “começar do zero”, já o Bloco acusa o PS de “arrogância” ao anunciar que vai reconfirmar o diploma, enquanto o PCP insiste que não resolverá o “problema de fundo”

ANTÓNIO COTRIM/Lusa

O presidente do PSD congratulou-se com o veto presidencial relativo ao Programa “Mais Habitação”, concordando que as medidas não são suficientemente credíveis, nem respondem à crise habitacional. Luís Montenegro desafiou o Governo a rasgar o acordo e “começar do zero”.

O Governo deve rasgar literalmente o que fez até agora e recomeçar do zero um programa de Habitação, para valorizar o acesso à habitação dos jovens, dos casais que têm menos recursos e até da classe média. E para isso pode contar com o PSD ”, afirmou Montenegro esta segunda-feira em declarações aos jornalistas em Vimioso, no âmbito da iniciativa Sentir Portugal em Bragança.

Pedindo “humildade democrática” e “esforço”, o líder social-democrata defendeu a necessidade de o Governo criar um programa de habitação para Portugal para as próximas duas décadas, com a contribuição da oposição. “Se o PS e o PM insistirem na sua teimosia, vão cometer um crime político e os portugueses pagarão isso nos próximos anos”, acrescentou.

Para Montenegro, os objetivos do Governo não se concretizam com o atual plano, que só criou “desconfiança” e “afujenta” os investidores que a par do Estado podem criar oferta de habitação. Pegando na crítica do PR quanto à falta de consenso, reafirmou que o pacote proposto pelo PSD era “coerente” e “consistente” e garantiu que o partido tem uma “equipa preparada para ajudar o Governo” na tarefa de criar um programa de habitação para os próximos 20 anos. “É a hora da verdade para o PM e o Governo. Para isso podem contar com o PSD”, assegurou.

Confrontado pelos jornalistas, em Bragança, já depois de o PS ter anunciado que vai reconfirmar o diploma, Montenegro disse que “António Costa está inebriado como primeiro-ministro” e já "só lhe resta arrogância a enfrentar tudo e todos".

IL diz que decisão de Marcelo foi “natural” e reitera críticas ao programa

Também o líder da Iniciativa Liberal (IL), Rui Rocha, defendeu que a decisão do Presidente é “natural” em linha com as considerações já feitas por Marcelo sobre o programa e lamentou as suas consequências. “Quando foi apresentado o Programa “Mais Habitação”, na altura o PR falou da necessidade de abrir o melão. O melão já está aberto e o que Presidente transmite aos portugueses é que encontrou não um melão, mas uma abóbora ou um pepino. encontrou nao um melão, mas uma abóbora ou pepino", ironizou Rui Rocha, em declarações aos jornalistas, a partir da sede do partido, no Porto.

Afirmando que o programa traz "consequências nefastas", o líder liberal reiterou que não irá resolver o problema habitação no país e já resultou em “menos oferta” e “menos confiança” dos investidores.

Desde que foi apresentado o programa, o investimento [imobiliário] diminuiu e os preços aumentaram. O pacote minou a confiança dos investidores, dos agentes económicos e a consequência normal é haver menos oferta e Portugal já tem precisamente um problema de oferta. É preciso restaurar a confiança dos investidores”, sustentou.

Caso se confirme a intenção de a maioria absoluta confirmar o diploma no Parlamento , Rocha entende que já não se estará “perante um desafio” do PS e do Governo ao PR e aos partidos da oposição, “mas ao próprio pais”. “Este é um mau pacote que vai prejudicar os portugueses”, insistiu.

Alinhada com o resto da direita, a IL teceu fortes críticas ao pacote do Governo para a Habitação, tendo coincidido desde logo no diagnóstico inicial do Presidente da República, que se tratava de uma “lei-cartaz” sem os efeitos pretendidos. E desafiou o PSD a pedir a fiscalização sucessiva do diploma ao Tribunal Constitucional (TC).

Chega diz que decisão do PR vai no “sentido correto” e deixa mensagem “clara” ao Governo

Para André Ventura, as considerações do veto do Presidente da República vão “no sentido correto”, ainda que o líder do Chega entenda que havia razões para enviar o decreto para o Tribunal Constitucional (TC) pelo “ataque à propriedade privada” ou “desproporcionalidade” das medidas.

O PR percebeu o que esta maioria tem tido dificuldade em compreender: não é a atacar o alojamento local, o rendimento das famílias ou o investimento privado que se vai resolver o problema da Habitação em Portugal”, disse o presidente do Chega, na sede do partido, em Lisboa.

Elogiando a “análise certeira” de Marcelo, Ventura concordou que o diploma não só era irrealista, como não continha" nenhuma solução útil". Segundo o presidente do Chega, o Executivo tem agora duas opções: “humildemente” refazer o programa e procurar o “maior consenso possível” ou manter a “arrogância” em mais um confronto institucional com os partidos e sobretudo com o Chefe de Estado.

“O PR deixou uma clareza enorme que deve fazer o Parlamento refletir. Ou seja, o Presidente deixa claro que este programa não ia resolver nada, como ia introduzir uma enorme carga burocrática e sufocar ainda mais as famílias”, realçou.

Bloco critica “arrogância” do PS em confirmar diploma

Pelo Bloco de Esquerda (BE), Fabian Figueiredo, criticou a "arrogância" e “prepotência” do PS em confirmar o diploma sobre a Habitação, após o veto do chefe de Estado.

“Portugal é um país onde os jovens não conseguem sair da casa dos seus país, até aos 40 são obrigados a dividir casa ou arrendar quarto nas áreas metropolitanas, famílias desesperam com escalada da pretsação da casa e a partir de setembro se somam dificuldades para estudantes encontrarem um quarto para se hospedarem enquanto frequentam o Ensino Superior”, começou por afirmar o dirigente bloquista, sublinhando que é neste contexto que PS insiste "num pacote vazio de propostas no que toca de ir ao centro do problema."

“Ao insistir no erro não vai fazer nada para travar um dos maiores problemas em Portugal. O que é dramático", vincou.

Segundo Fabian Figueiredo, o PS pode atacar a esquerda parlamentar, mas o Bloco não deixará de sair em defesa de propostas “dignas” em matéria de Habitação. “O PS faz mal em insistir num pacote que todo o país sabe que não serve. É um pacote que não combate especulação, não baixa rendas, não dá nenhuma solução para quem desespera com a escalada dos juros e prestação ao banco. O PS faz mal em se mostrar arrogante e prepotente e insistir na sua indiferença perante o drama de milhares de pessoas. A arrogância do PS é um insulto para quem trabalhe e vive em Portugal”, atirou.

PCP considera que Mais Habitação alimenta “especulação imobiliária” e não resolve “problema de fundo”

A partir da sede do PCP, em Lisboa, o partido reagiu ao veto de Marcelo Rebelo de Sousa com várias críticas ao pacote Mais Habitação. “O PS vai num mau caminho, de proteger os interesses da banca e dos fundos imobiliários, sem resolver o problema de fundo com que o povo está confrontado que é o direito à habitação”, declarou Vasco Cardoso, membro da Comissão Política do Comité Central do PCP.

Tal como já tinham defendido na altura de votação das medidas do Governo, os comunistas acusaram o Mais Habitação de reforçar a “especulação imobiliária” e não dar “respostas” a problemas dos portugueses como os custos de arrendamento ou as altas prestações do crédito à habitação.

Perante o veto do presidente da República, o PCP considerou que restam ao Governo duas opções: “ou insiste em políticas que cedem aos interesses da banca, dos fundos imobiliários daqueles que ganham milhões à custa das dificuldades da maioria – e que terá o apoio do PSD, Chega e IL – ou se junta ao PCP nas propostas que combatem a especulação, os interesses da banca, criando condições para reduzir prestações [de crédito à habitação], reduzir o valor das rendas e promover a construção de habitação pública”.

Sobre um eventual acordo com o PS para uma votação favorável a este pacote – quando voltar a ser votado no parlamento –, Vasco Cardoso apenas respondeu que o “acordo tem de ser em torno do problema dos portugueses”. Para isso, os comunistas esperam ver algumas das suas propostas integradas como o “spread da Caixa Geral de Depósitos no máximo de 0,25%”, os “lucros dos bancos a suportar o agravamento das taxas de juros do BCE”, o “regulamento do valor das rendas” e a promoção de “habitação pública”.

PAN ataca “teimosia” da maioria absoluta

Inês de Sousa Real considera que as observações do PR no veto político vão ao encontro de parte das preocupações apontadas pela oposição durante a discussão do programa, seja na “desproporcionalidade” de medidas como o arrendamento forçado ou a “asfixia” do alojamento local.

“É preciso ir mais longe naquilo que são os pacotes e as medidas de apoio às famílias, seja para o arrendamento, seja para o crédito à habitação. É fundamental haver parque habitacional público, mas até que se concretize é preciso que o Estado venha a robustecer os apoios públicos”, advogou a deputada do PAN, num vídeo enviado às redações.

Apesar de reconhecer medidas importantes como o alargamento período de isenção de IMI de três para cinco anos, que justificaram a abstenção do partido na votação final do decreto, Sousa Real não deixou de atacar a postura do PS: “Lamentamos que não tenha havido mais abertura em relação a outras propostas, e que por força da teimosia da maioria absoluta do PS estejamos agora perante um veto por força até das questões de inconstitucionalidade que têm sido levantadas”, notou.

Segundo a deputada única, um Estado que não disponibiliza o seu próprio património público para habitaçao “não tem qualquer legitimidade para esbulhar a propriedade privada”.

Livre pede “mais ambição”

O Livre considera que o veto do PR deve ser visto como uma oportunidade para colocar “mais ambição” no Programa “Mais Habitação” face à emergência no sector. “A razão principal desse veto político é o diploma não dar passos suficientemente ambiciosos para responder à escala da crise de habitação que temos pela frente”, afirma o gabinete parlamentar em comunicado, concordando com o diagnóstico.

Sublinhando que o partido fez “muitos esforços" para que houvesse uma solução que respondesse à “escala da crise”, o partido de Rui Tavares aplaude algumas propostas que foram aprovadas, mas lamenta que tenham ficado para trás as mais ambiciosas ”centradas na criação de uma bolsa de habitação pública de dimensão suficiente para proteger as pessoas dos choques" causados por um "mercado altamente especulativo."

Na perspetiva do Livre, o Executivo tem agora uma “grande oportunidade” para o fazê-lo, apontando para a evolução positiva das contas do Estado. “Instamos o Governo e a sua maioria absoluta na Assembleia da República a não perder esta oportunidade de ser mais ambicioso”, reforçou.

Os alertas sucessivos de Marcelo

Em março, Marcelo Rebelo de Sousa considerou que o programa “Mais Habitação” era à partida “inoperacional, quer no ponto de partida, quer no ponto de chegada”, numa iniciativa no âmbito dos 10 anos da CMTV e os 44 anos do ”Correio da Manhã".

Depois do período de consulta pública, o pacote foi discutido na especialidade no Parlamento, mas as medidas mais polémicas como a contribuição sobre o Alojamento Local foram mantidas, ainda que suavizadas. A Contribuição Especial do Alojamento Local (CEAL) desceu de 35% para 15%, enquanto o arrendamento coercivo passou a ser uma medida excecional, apontada como o último recurso dos municípios.

Foi no passado dia 19 de junho que o Programa “Mais Habitação” foi aprovado em plenário, tendo chegado a Belém no passado dia 9 de agosto. Marcelo aproveitou as férias no Algarve para examinar a pente fino o pacote, mantendo o suspense sobre a decisão até hoje.

“Logo a 9 de março, me pronunciei sobre os riscos de discurso excessivamente otimista, de expetativas elevadas para o prazo, os meios e a máquina administrativa disponíveis e, portanto, de possível irrealismo nos resultados projetados. Seis meses depois, o presente diploma, infelizmente, confirma esses riscos”, escreveu o Presidente numa carta enviada a Augusto Santos Silva.

Para Marcelo, “nem no arrendamento forçado, nem no alojamento local, nem no envolvimento do Estado, nem no seu apoio às cooperativas, nem nos meios concretos e prazos de atuação, nem na total ausência de acordo de regime ou de mínimo consenso partidário, o presente diploma é suficientemente credível quanto à sua execução a curto prazo, e, por isso, mobilizador para o desafio a enfrentar por todos os seus imprescindíveis protagonistas – públicos, privados, sociais, e, sobretudo, portugueses em geral”.

Admitindo que o diploma poderá ser confirmado em breve pela maioria absoluta no Parlamento – apesar das críticas da oposição –, o chefe de Estado fez questão de sublinhar a “sua profunda convicção” e um “sereno juízo analítico negativo” sobre o pacote legislativo.