António Costa já tinha sido eleito Figura Nacional do Ano pela redação do Expresso quando o país o viu aparecer “cheio de sono”, “cansado de horas de reuniões” em Bruxelas e a pedir desculpa pelos “apartes irritados” com que reagiu às cheias em Lisboa e com que respondeu ao presidente da autarquia que ele próprio governou durante oito anos sem ter resolvido o drama da drenagem das águas. Cansado, ensonado, mas sem se distrair um minuto da atmosfera social adversa, agendou uma entrevista natalícia a anunciar um apoio extraordinário para os mais carenciados, uma maior redução do défice e um crescimento do PIB superior ao previsto (tudo positivo, otimista sempre!) e de caminho ainda arrumou adversários de direita com o rótulo de “queques que guincham”. As nódoas de arrogância salpicaram-lhe a lapela, pelo menos junto da “bolha mediática”, como Costa já aprendeu a dizer com Marcelo. Mas nada que pudesse comprometer a eleição da Figura.
O estilo bruto, reguila, popularucho, surviver e killer não é novidade, está-lhe no ADN — na última campanha eleitoral fartou-se de gozar com “o ar deprimido do ‘Zé Albino’”, o gato de Rui Rio. E o que para o Expresso tornou óbvia a sua eleição foi outra coisa — foi ter feito história eleitoral. Não propriamente por alcançar uma maioria absoluta, coisa que Cavaco Silva e José Sócrates já tinham mostrado como se faz. Mas porque chegar à maioria absoluta depois de seis anos de poder saídos de uma derrota, ancorados numa ‘geringonça’ presa por arames e desgastados numa maioria relativa e instável que teve de gerir uma pandemia e acabou numa crise política, é atingir o improvável. O país viu um político superar-se a si próprio e que se cumprir a atual legislatura bate o recorde de longevidade de Cavaco ao leme do país. É verdade que António Costa fez tudo ao contrário, não se vislumbra um país a mudar de vida e os paradoxos da sua singular caminhada estão à vista. Mas a maratona continua.