Na voz das principais figuras do momento do partido, as mensagens foram todas para o PS. A de que só à esquerda se responde a uma pandemia e a de que o tempo que passou desde o voto contra do último Orçamento do Estado (OE) veio dar razão ao Bloco. Para a direita, para a extrema-direita, quase nada. O alvo era mesmo o Governo de António Costa.
Foi preciso esperar pelos históricos para que a extrema-direita subisse metaforicamente ao palco. Primeiro, no sábado, Fernando Rosas, depois, este domingo, José Manuel Pureza. A plateia respondeu em peso quando Pureza avisou o líder da direita radical em Portugal, sem citar o nome, que o Bloco não tem medo. “Saibam que não tememos os vossos ataques.”
Primeiro de forma subtil, depois abertamente, a crítica de Pureza ia também para o PSD de Rui Rio. Quando referiu que a extrema-direita desenvolve “a indústria da mentira”, com que “excita os seus fiéis”, para conseguir aquilo que “já não esconde” — “exterminar a esquerda” —, estava a referir-se às palavras da candidata social-democrata à Câmara Municipal da Amadora, Suzana Garcia. “Se a extrema-direita quer exterminar o Bloco, é porque esta é a força que mais lhe faz frente e que a vai derrotar.”
Apontando incongruências a esse campo político, por reivindicar o combate à corrupção mas não falar do Novo Banco, por afirmar que há uma “invasão islâmica” em curso na Europa e fazer silêncio sobre “a escravatura nas estufas de Odemira”, Pureza concluiu diretamente para os dois principais partidos. O PS “está enganado” se acha que o crescimento da direita radical lhe garante mais votos pelo centro, e o PSD tem de parar de “namorar irresponsavelmente” essa direita.
Já Fernando Rosas foi o último dos fundadores do Bloco a falar na XII Convenção, e um dos primeiros a puxar pelo debate ideológico. Depois de Luís Fazenda e de Francisco Louçã, Rosas subiu ao púlpito para deixar avisos sobre a organização interna do partido que ajudou a fundar, mas também para um sério alerta: o perigo dos extremismos de direita.
“É meu entendimento que o Bloco de Esquerda tem de dar uma outra atenção à luta no plano ideológico”, disse Fernando Rosas, para quem “minimizar o combate das ideias ou afogá-lo na permanente urgência do imediato é correr o risco de nos desarmarmos, de insensivelmente nos transfigurarmos e de só dar por isso quando for tarde de mais”.
A plateia entusiasmou-se com um dos poucos que ignorou o PS nos discursos. “A direita tradicional tende a aliar-se com a nova extrema-direita porque esta lhe abre caminho para um novo tipo de regime, e a extrema-direita encosta-se às velhas direitas porque essa é forma de chegar ao poder”, detalhou o historiador.
Rosas identifica em Portugal um “discurso passadista”, uma “nostalgia serôdia”, que tende a “banalizar ou enaltecer o regime fascista” e a “glorificar o domínio colonial”. E vê como única forma de o combater um resgate do socialismo, que nunca será poder se não conquistar “a adesão larga e combativa de grande parte das classes trabalhadoras e do povo”. O combate dos próximos anos é ideológico. “Não venceremos a ameaça antidemocrática das direitas se elas lograrem manter a hegemonia ideológica.”