Foi o primeiro dia dos encontros que levaram os partidos a Belém, para serem ouvidos por Marcelo Rebelo de Sousa. Na agenda estavam vários temas - o Orçamento Suplementar, o Plano de Estabilização do Governo e a situação sanitária - mas, dada a evolução da pandemia sobretudo na área de Lisboa, foi este último ponto que mereceu mais atenção à saída das reuniões. E foi lá que vários líderes aproveitaram para deixar avisos, tanto ao Governo como ao próprio Marcelo, sobre a gestão desta crise e da mensagem política, que deve "dar o exemplo".
João Cotrim de Figueiredo, líder da Iniciativa Liberal, foi o primeiro a ser ouvido e aproveitou a sua hora com o presidente para deixar recados sobre a "clareza" que falta aos dados sobre a pandemia e ao discurso político. "As comunicações da DGS, do Governo, do primeiro-ministro e do presidente da República têm de ser coerentes", notou, à saída do encontro. Isto porque tanto ouve responsáveis políticos a dar "explicações perfeitamente esotéricas" sobre o número de casos, particularmente em Lisboa, como outros a dizer que "não se passa nada". E isso, argumentou o líder dos liberais, causa confusão na sociedade e torna mais difícil controlar a gestão da pandemia.
As exigências de Cotrim foram diretas: os dados sobre a evolução da covid-19 e sobre os métodos de testagem, em Portugal e especialmente em Lisboa, não estão a ser explicados com suficiente "clareza". Também não está a ser transparente a explicação sobre o que faz daquela região a zona mais afetada neste momento - e não se sabe se é "convincente" a ideia de que em Lisboa se testa mais, uma vez que não há dados que o comprovem, sublinhou.
Essas preocupações não foram um exclusivo da IL. Horas mais tarde, André Silva, do PAN, lembrava que o partido considerou o levantamento do estado de emergência, no princípio de maio, precoce. E perante a evolução da pandemia em Portugal reafirma a mesma posição: "Foi cedo. Não foi acompanhado de uma alteração narrativa, o que poderá ter dado uma falsa sensação de segurança".
Também no CDS ecos de críticas semelhantes: para Francisco Rodrigues dos Santos, o Governo deve "dar o exemplo, ao nível dos comportamentos". Até porque, na opinião do líder centrista, essa mensagem não tem passado para a sociedade civil: "Este equívoco tem sido uma constante. Os portugueses não conseguem compreender" duplos critérios para comportamentos que se podem ou não ter, frisou.
Pelos Verdes, José Luís Ferreira defendeu que todas as decisões sobre o controlo da pandemia, também especialmente em Lisboa, devem ser tomadas com o "respaldo" das autoridades da Saúde e dos autarcas, que foram ouvidos esta segunda-feira por António Costa. Nessas condições, os Verdes não deverão opor-se a medidas mais extremas, como a imposição de uma cerca sanitária na zona da Grande Lisboa. Mas, para já, recordam que punições e "matéria penal" devem ser encaradas "como um recurso de fim de linha".
Falta de "visão" no Orçamento
No dia em que António Costa anunciou mais restrições para a zona de Lisboa, agora mais afetada pela pandemia, o tema dominou as declarações dos partidos em Belém. Mas não foi o único. Logo de seguida, também José Luís Ferreira, dos Verdes, recordou as suas propostas e reparos ao Orçamento Suplementar. O partido ecologista insiste que o lay-off não deve trazer "penalizações" salariais e que deve ser criado um fundo de tesouraria para pagar as despesas fixas que as empresas afetadas pela pandemia tiveram de pagar.
Cotrim de Figueiredo aproveitou para criticar a falta de "visão" e "estratégia" que vislumbra no documento, assim como a excessiva burocracia nas ajudas para empresas. Também André Ventura, do Chega, vislumbrou pouca "estratégia" neste Suplementar, mas boa parte das suas declarações foram passadas a justificar a manifestação que convocou para este sábado sob o lema "Portugal não é racista", defendendo que o evento é "tudo menos de supremacia branca".
Na terça-feira será a vez de PSD, Bloco de Esquerda, PCP e PS serem ouvidos por Marcelo Rebelo de Sousa.