Política

Marcelo avisa Costa: “A exigência é uma sentinela que não pode dormir”

Presidente da República fez questão de lembrar ao primeiro-ministro que este início de legislatura não pode ser sinónimo de deslumbramento. António Costa descansou Marcelo: "Acho que vamos continuar a ter uma saudável convivência"

RODRIGO ANTUNES/LUSA

Dez minutos pontuados de muitos avisos. Marcelo Rebelo de Sousa recebeu, esta segunda-feira, António Costa em Belém, para os habituais cumprimentos de Natal, e não deixou o primeiro-ministro ir embora sem oferecer um “exigente”, nas palavras do próprio, caderno de encargos. E um recado que pautou todo o curto discurso: no próximo ano, não existirá margem para baixar a guarda.

Parafraseado a professora catedrática Maria de Sousa, uma “amiga”, Marcelo Rebelo de Sousa sublinhou que “a exigência é uma sentinela que não pode dormir.” O Presidente da República lembrou, a propósito, que no próximo ano o Governo terá de aprovar dois dos quatro Orçamentos do Estado desta legislatura, começará a preparar a Presidência da União Europeia, dar respostas concretas aos desafios das alterações climáticas e ainda cuidar da cimeira da CPLP.

Já depois de António Costa ter reconhecido no seu discurso que o próximo ano “será muito exigente”, Marcelo disse esperar reencontrar o primeiro-ministro em 2020 num cenário de estabilidade. “Espero, quando nos encontrarmos, inevitavelmente em circunstâncias diferentes das atuais, podermos dizer que foi um ano politicamente, economicamente, financeiramente e institucional estável. E ainda melhor se pudermos dizer que superou o ano anterior em termos de metas”.

Nessa altura, em dezembro de 2020, Marcelo já estará numa fase de pré-campanha para as presidenciais de janeiro de 2021, pelo que a referência “às circunstâncias inevitavelmente diferentes” não foi uma coincidência: historicamente, a relação institucional entre Governo e Presidente da República têm sido muito diferentes durante os segundos mandatos presidenciais.

O cachecol e aquele abraço especial

Foi precisamente essa provocação que António Costa deixou já na fase dos cumprimentos propriamente ditos. Para lançar o próximo ano desportivo - Portugal ganhou o Eur2016 no primeiro ano de mandato de Marcelo - o primeiro-ministro ofereceu um cachecol oficial da Federação Portuguesa de Futebol. E fez questão que o Presidente da República o pusesse aos ombros para a foto de família da praxe. Marcelo ainda soltou um “isto não é muito protocolar, para o ano…”. Ao que António Costa respondeu, de forma bem audível, “por ser pré-campanha já não pode ser”.

O primeiro-ministro, de resto, aproveitou os seus votos de boas festas para repetir as quatro grandes prioridades assumidas pelo Governo - o combate às alterações climáticas, dinâmica demográfica, a transição para a sociedade digital e o combate às desigualdades sociais - fez questão de descansar Marcelo: “Sabe com o que pode contar. O próximo ano será igual a todos os outros”, disse, antes de acrescentar que a “saudável convivência entre ambos” foi um ativo importante para o país. “E acho que vamos continuar”, antecipou um sorridente António Costa.

Terminada a cerimónia, houve mais um gesto cheio de significado político: António Costa fez questão de dar um longo e barulhento abraço a Mário Centeno, com o objetivo claro de apagar as sombras das dessintonia entre ambos. Aliás, o ministro das Finanças não deixaria o Palácio de Belém sem uma bicada de Marcelo Rebelo de Sousa, que disse ser o único chefe de Estado com o privilégio de poder cumprimentar o presidente do Eurogrupo e o ministro das Finanças. Isto depois da discussão pública entre António Costa e Centeno, com o primeiro-ministro a criticar a proposta de orçamento europeu negociada pelo seu próprio ministro. E, desta vez, o presidente do Eurogrupo ganhou.